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O trabalho que dignifica e reeduca

Instituto Travessia atua há 17 anos trabalhando com reeducandas do sistema prisional do Grande Recife —- nova chance por meio de um emprego durante cumprimento de pena

Por Nicolle Gomes

Instituto Travessia atua há 17 anos trabalhando com reeducandas do sistema prisional do Grande Recife

“Um acesso mínimo para um caminho de dignidade”, é assim que o trabalho do Instituto Travessia é descrito por Armando Jr., de 52 anos, fundador e presidente do projeto, que há 17 anos auxiliou o processo de ressocialização e empregabilidade de cerca de oito mil egressos do sistema prisional do Estado.

A principal vertente da organização é o Projeto Recosturando o Futuro, uma fábrica de produção de artigos têxteis, cujo corpo de funcionários é composto majoritariamente por reeducandas das Colônias Prisionais Femininas de Recife, na Zona Oeste da Capital, e de Abreu e Lima, no Grande Recife. As peças produzidas são de moda, cama, mesa, fardamentos e hospitalares descartáveis, dentre outros – em média 50 mil por dia, segundo a organização.

A organização começou em 2008, mas só em 2010 tomou a forma que tem hoje, com um curso de capacitação que ministrado dentro da Colônia Prisional Feminina Bom Pastor, conta Armando.

“Eu queria tentar algo novo, e soube do projeto de costura dentro da (Penitenciária) Bom Pastor. Fiquei com essa ideia e fui lá. Encontrei com a diretora do presídio, que me mostrou três máquinas de costura, o pessoal trabalhando. Perguntei como funcionava e ela falou que tinha que reestruturar o lugar, ensinar as meninas, tinha que ter uma estrutura. Fiquei com isso na cabeça uns meses, e convenci um amigo a começar a fazer uma produção lá dentro. Começou com curso de capacitação e depois a gente colocou uma unidade produtiva. Dois anos depois a gente tinha 100 pessoas lá dentro do Bom Pastor trabalhando”, conta.

Outra dinâmica do Instituto é o Projeto Reconstruindo o Futuro, que qualifica, profissionaliza, emprega e reinsere no mercado de trabalho egressos do sistema prisional que estejam cumprindo pena nos regimes aberto e livramento condicional, nas mais diversas áreas e ocupações, como vendedor, estoquista, pedreiro, rasteleiro, encanador, eletricista, motorista, ajudante de obras dentre outras profissões.

Oportunidade

O projeto busca dar oportunidade para pessoas que não conseguem se reinserir com facilidade da sociedade e no mercado de trabalho, o que acaba por interferir diretamente na reincidência criminal, segundo o presidente do Travessia.

“Quem chega lá, chega atrás de arrumar um emprego. O problema é que ninguém quer dar emprego para essas pessoas. Eles são estigmatizados, é como se fosse um leproso na época que não tinha cura, ninguém quer chegar perto. E aí não tem jeito, a estatística do Estado é que quem progride de pena, 64% volta para o presídio. Das pessoas que
passaram por nós, a faixa de reincidência é de 1,5%”, argumenta.

O principal objetivo do Instituto, segundo Armando, é dar esse acesso de volta à sociedade, de maneira digna. Para ele, o trabalho é “um grãozinho de areia”, mas que faz a diferença na vida dessas pessoas.

“Nós apenas damos uma possibilidade de acesso mínimo para um caminho de dignidade. O ambiente e a falta de acesso é que leva às vezes as pessoas para um caminho e outras para outro. O meu objetivo é dar um acesso diferente, abrir uma janela para que uma pessoa consiga chegar num lugar que talvez ela não chegaria com esse mínimo que eu faço, que não é nada de mais. Eu só dou uma oportunidade de trabalho a uma pessoa. A gente faz um grãozinho de areia da praia, mas faz a alguma diferença”.

A motivação de Armando para seguir com os projetos é poder alcançar mais pessoas além das que trabalham diretamente com o Instituto, mudando também perspectivas de famílias.

“Temos uma visão de futuro para essas pessoas, que podem, além de ter trabalho, também ter o mínimo de possibilidade de que os filhos não sigam o mesmo caminho por conta do emprego. Hoje é o que a gente consegue fazer. A ideia é avançar com isso”, compartilha.