MPPE articula ação com entidades para combater violência contra a mulher
Levantamento mostra que 37,5% das brasileiras com 16 anos ou mais sofreram algum tipo de agressão
O Ministério Público de Pernambuco (MPPE) lançou nesta sexta-feira (19), no Recife, a Ciranda Lilás, iniciativa do Núcleo de Apoio à Mulher (NAM) voltada a fortalecer a rede de atendimento e acolhimento de mulheres no estado. A ideia é é ampliar a prevenção à violência de gênero e ao feminicídio e garantir o desenvolvimento de “políticas públicas de apoio às mulheres em situação de violência, para que elas tenham facilmente a quem pedir ajuda”.
Hoje, a rede de proteção no estado é composta por sete promotorias especializadas do MPPE, dois núcleos de apoio, 15 delegacias da mulher, Brigada Maria da Penha, o núcleo da Defensoria Pública, centros municipais de referência em 30 cidades, além de serviços de saúde e atendimento descentralizado no Recife. “A proposta é que todas e todos entrem nesse compasso na defesa da vida e dos direitos das mulheres. Assim estaremos somando o trabalho de várias instituições” explica a promotora de Justiça Maísa Oliveira, coordenadora do NAM.
De acordo com a Secretaria de Defesa Social (SDS), 61 mulheres foram vítimas de feminicídio em Pernambuco entre janeiro e 31 de agosto deste ano. No mesmo período, houve 1.480 registros de estupro contra meninas e mulheres e 27.699 casos de violência doméstica e familiar. O evento de lançamento reuniu representantes do MPPE, secretarias municipais e estadual da Mulher, movimentos sociais e a Secretaria Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres.
A Ciranda Lilás também integra as ações do MPPE em atendimento às recomendações do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), que lançou o selo “Respeito e inclusão no combate ao feminicídio” para reconhecer unidades engajadas no enfrentamento das mortes violentas de mulheres.
“Nós temos uma dificuldade, e não só em Pernambuco, mas no Brasil inteiro, de ter a notificação compulsória funcionando. Ela termina não acontecendo na rede de saúde. Houve, por parte do Ministério da Saúde, uma simulação com os CPFs das mulheres que foram vítimas de feminicídio e observou-se que, 15 dias antes destas mulheres serem executadas, elas apresentaram um comportamento diferenciado buscando os serviços de saúde de forma mais sistemática. Ou seja, este é o primeiro serviço público que as mulheres buscam em situação de violência”, pontua a secretária Nacional de Enfrentamento à Violência contra Mulheres, Estelizabel Bezerra.
Violência contra mulher bate recorde, diz levantamento
A violência contra mulheres no Brasil alcançou em 2025 o maior patamar desde o início da série histórica da pesquisa Visível e Invisível: a Vitimização de Mulheres no Brasil, realizada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública em parceria com o Datafolha.
De acordo com o levantamento, 37,5% das brasileiras com 16 anos ou mais sofreram algum tipo de agressão nos últimos 12 meses, o que corresponde a pelo menos 21,4 milhões de vítimas em todo o país.
O estudo, que chega à sua quinta edição e revela que, em média, cada mulher vitimada relatou ter enfrentado três formas diferentes de violência ao longo do último ano. A mais comum foi a psicológica, com 31,4% das entrevistadas relatando insultos, xingamentos ou humilhações. Em seguida aparecem as agressões físicas, como tapas e empurrões, sofridas por 16,9% das mulheres, e as ameaças de violência, citadas por 16,1%. Também se destacam os relatos de stalking ou perseguição (16,1%) e de violência sexual, apontada por 10,7% das entrevistadas.
O relatório evidencia ainda que a violência tende a ser repetitiva. Em mais da metade dos casos considerados mais graves, as agressões ocorreram em mais de uma ocasião e, em 13% dos episódios, se repetiram sete vezes ou mais ao longo do último ano.
Além disso, a pesquisa mostra que a violência raramente acontece em segredo e a maioria das mulheres afirmou ter sofrido agressões na presença de testemunhas, e um quarto relatou que os ataques ocorreram diante dos próprios filhos, evidenciando um ciclo de vitimização que atravessa gerações.
No recorte da violência praticada por parceiros ou ex-parceiros íntimos, os números são ainda mais contundentes. Quatro em cada dez brasileiras (40,7%) já foram vítimas de algum tipo de violência íntima ao longo da vida, o que representa ao menos 23,4 milhões de mulheres.
Entre elas, 32,4% sofreram violência psicológica, 26,7% foram vítimas de agressões físicas e 21,1% relataram violência sexual. Situações como isolamento forçado, negação de recursos básicos e controle coercitivo também foram destacadas.
Outro ponto de alerta é o assédio em espaços públicos, que atingiu 49,6% das mulheres entrevistadas em 2025, o maior índice já registrado pela pesquisa. Quase metade das brasileiras relatou ter sido vítima de abordagens desrespeitosas, cantadas invasivas ou intimidações em locais de circulação cotidiana.
Para os pesquisadores, o crescimento da violência resulta de uma combinação de fatores. Entre eles, estão a subnotificação histórica, que ainda mantém milhares de casos invisíveis, a naturalização de práticas abusivas em relações íntimas e o desfinanciamento de políticas públicas de enfrentamento nos últimos anos.
Por outro lado, o relatório também aponta que campanhas de conscientização e mudanças recentes na legislação fizeram com que mais mulheres reconhecessem situações antes vistas como normais, como o stalking, hoje tipificado como crime.
O Fórum Brasileiro de Segurança Pública alerta que os indicadores funcionam como preditores do feminicídio, a forma mais extrema da violência de gênero. Por isso, cobra do Estado e da sociedade civil políticas consistentes de prevenção, acolhimento e responsabilização dos agressores.