Ponto e Vírgula: uma rede de acolhimento que transforma vidas em Caruaru
São 184 pessoas que dedicam tempo e afeto ao trabalho coletivo, provando que voluntariado não é só entrega, mas também transformação pessoal
O que era para ser apenas uma roda de conversa entre amigos. Um encontro simples, em 2016, em Caruaru, para falar sobre saúde mental, luto e dor. Se transformou em algo muito maior: a ONG Ponto e Vírgula Caruaru. Hoje, nove anos depois, a ONG se tornou uma referência em acolhimento emocional, prevenção ao suicídio e fortalecimento de vínculos humanos, reunindo 184 voluntários e alcançando milhares de pessoas dentro e fora do país.
“Eu passei por situações muito difíceis na adolescência e fui ajudado por um amigo psicólogo. Em 2016 pensei: por que não falar sobre isso abertamente?”, relembra o presidente da instituição, Betto Moura. No primeiro encontro, apenas nove pessoas apareceram. No segundo, mais de 60. Foi nesse momento que o grupo entendeu que havia ali uma demanda real, urgente e profunda.
O que começou como uma reunião ganhou corpo e estrutura. Hoje, a ONG conta com uma coordenação executiva de 18 integrantes e uma rede de voluntários formada por psicólogos, terapeutas, estudantes de psicologia, educadores, profissionais de saúde e cuidadores. São 184 pessoas que dedicam tempo e afeto ao trabalho coletivo, provando que voluntariado não é só entrega, mas também transformação pessoal.
É por meio dessa dedicação que a instituição realiza atendimentos, oficinas, grupos de apoio e projetos comunitários. Cada ação, por menor que pareça, faz parte de uma rede que se sustenta pela escuta, pela empatia e pelo compromisso de valorizar a vida.
Projetos que acolhem e transformam
Entre os muitos projetos realizados, alguns ganharam destaque pela abrangência e impacto social. O Atendimento Psicológico Infantil e Adulto, por exemplo, oferece acompanhamento a crianças e adultos em parceria com o Boi Tira Teima, além de funcionar como campo de estágio para futuros psicólogos.
Em 2019, a ONG aplicou em Caruaru a Escola de Perdão e Reconciliação (EsPeRe), metodologia desenvolvida pelo sociólogo colombiano Leonel Narváez, voltada à reconstrução de relações rompidas e à promoção do perdão como caminho para a cura emocional.
No mesmo ano, nasceu o Projeto Viver Avançando nas Escolas, que levou práticas de escuta e regulação emocional a quatro escolas públicas, beneficiando 75 adolescentes. Já em 2022, os Grupos de Apoio Emocional passaram a oferecer espaços permanentes de partilha. São quatro núcleos ativos, reunindo 62 pessoas em encontros mensais: de mães atípicas a mulheres em situação de vulnerabilidade, passando por grupos de enlutados.
Cuidar de quem cuida
Um dos projetos mais marcantes surgiu em 2023: o Sinônimo de Cuidar. Criado após o suicídio de uma mãe atípica, participante de um dos grupos de apoio, a iniciativa se dedica a oferecer acolhimento a mães e cuidadoras de crianças com deficiência. Em 2024, o projeto alcançou 176 mulheres em municípios do Agreste e da Zona da Mata. Desde então, não houve novos registros de suicídio entre esse público na rede atendida pela ONG. Um dado que, sozinho, revela a potência do trabalho.
Além dos projetos coletivos, a ONG também criou um método autoral: o Abraço Terapia. Desenvolvido por Betto Moura, o workshop alia teoria e prática sobre acolhimento por meio do toque afetivo e da escuta atenta. Já formou mais de 300 pessoas e se tornou o primeiro curso certificado sobre o tema no Brasil. “O abraço é um gesto simples, mas capaz de criar vínculos profundos e humanizar relações”, explica Betto.
Símbolo da história da ONG, o Movimento Pela Vida chega em 2025 à sua décima edição. A cada ano, praças, parques e avenidas de Caruaru são ocupadas por rodas de conversa, oficinas, atendimentos psicológicos, práticas físicas e momentos de espiritualidade. A ideia é simples: oferecer gratuitamente à população acesso a múltiplas formas de cuidado integral, valorizando corpo, mente e espírito.
Depois de conquistar sua sede própria no bairro Vassoural, a ONG trabalha agora para reformar o espaço e ampliar sua capacidade de atendimento. A meta é consolidar parcerias, buscar novos editais e garantir a continuidade das ações.
“Nosso objetivo é fortalecer ainda mais essa rede de cuidado, porque continuar é preciso”, resume Betto Moura. “Acreditamos que estar presente, ouvir e acolher pode salvar vidas. E é isso que nos move.”