Pernambuco: tragédias que vieram do céu
Sétima reportagem da retrospectiva dos 200 anos do Diario de Pernambuco traz as coberturas dos maiores desastres aéreos do estado
O primeiro voo comercial aconteceu entre São Petersburgo e Tampa, no estado da Flórida, nos Estados Unidos. A bordo de um hidroavião Benoist XIV, com apenas dois lugares, o piloto Tony Jannus levou apenas 23 minutos entre decolagem e pouso. A companhia aérea St. Petersburg-Tampa Airboat Line recebeu 400 dólares de Abram Phell, o primeiro passageiro a ganhar os céus.
Tudo isso aconteceu no dia 1º de janeiro de 1914, quando o Diario de Pernambuco já contava a história do planeta há bastante tempo. A reportagem semanal que marca a contagem regressiva dos 200 anos do jornal em circulação mais antigo da América Latina é sobre voos comerciais e militares. Não os festivos, como o do piloto Tony Jannus, da St. Petersburg-Tampa Airboat Line, mas sobre os que não chegaram aos seus destinos.
A sétima matéria da série especial conta como foram os maiores desastres aéreos da história acontecidos em solo e águas pernambucanos e remonta a história dos dois principais acidentes do estado a partir das coberturas jornalísticas do Diario.
Os maiores desastres aéreos de Pernambuco
1) Voo 447 da Air France (2009)
Às 19h30 do dia, o Airbus A 330 decolou do Aeroporto do Galeão, dando início ao voo 447 da Air France, com destino a Paris. Três horas depois, tudo aconteceu muito rápido: às 22h33, o último contato de voz do piloto; às 22h48, a aeronave saiu da cobertura do radar de Fernando de Noronha; às 23h, registros de turbulência e, às 23h20, mensagem automática informou sobre perda de pressurização e falha no sistema elétrico.
O A330 desapareceu. Seus destroços começaram a ser vistos a 1.200km de Fernando de Noronha. Nenhuma das 228 pessoas sobreviveu, entre passageiros (216) e tripulantes (12). 154 corpos foram resgatados e levados ao IML do Recife. Foi o maior acidente aéreo do país.
2) Voo da Amizade, Panair do Brasil (1961)
O Douglas DC-7, prefixo PP-PDO, da Panair do Brasil, deixou a pista do aeroporto em Lisboa por volta das 16h do dia 31 de outubro de 1961 para mais uma edição do Voo da Amizade, parceria criada no ano anterior entre a TAP (Transportes Aéreos Portugueses) e a Panair do Brasil, visando oferecer serviços especiais e preços mais baixos em viagens para o Brasil.
O destino era o Recife, com escala na Ilha do Sal, em Cabo Verde, na costa africana. Pouco após atravessar o oceano Atlântico, o DC-7 entrava nos últimos preparativos para a aterrissagem nos Guararapes, quando a cerca de 3km da cabeceira da pista, em Tejipió, chocou-se contra um morro da Fazenda Modelo. 88 pessoas estavam a bordo e 45 pessoas não escaparam do desastre. Foi o décimo maior acidente aéreo do país.
3) Voo 2468, da FAB (1987)
O Hércules C-130 da FAB (Força Aérea Brasileira) havia saído do Rio de Janeiro com destino a Fernando de Noronha, tendo o Recife como escala. Um voo de rotina, com transporte de passageiros e cargas, na segunda-feira, 14 de dezembro de 1987.
A primeira parte da viagem aconteceu sem imprevistos. Após a breve parada na capital pernambucana, a aeronave seguiu para Noronha, com os mesmos 29 ocupantes e as 12 toneladas de carga, das quais 11 eram de um compressor. A apenas 15 km da pista do aeroporto do arquipélago, o Hércules mergulhou no mar, matando os seis tripulantes e 23 passageiros.
As investigações indicaram que, devido ao mau tempo, a aeronave sofreu fortes turbulências, embora nada fora da normalidade. Apenas o suficiente para fazer com que o compressor, que não estava devidamente preso no chão, se descolasse para um dos lados, saindo do centro de gravidade do avião, e tirando o DC-130 do controle do piloto.
4) Voo 4896, Noar Linha Aéreas (2011)
Os procedimentos de decolagem do LET L-410 da Noar Linhas Aéreas tiveram início às 6h51 do dia 13 de julho de 2011. O Voo 4896 saiu da pista do Aeroporto dos Guararapes, no Recife, com o piloto, co-piloto e 14 passageiros. O destino seria o Dix-Sept Rosado, aeroporto de Mossoró-RN, escala prevista para Natal.
Segundos após a decolagem, deu uma pane no motor esquerdo. A 400 pés de altura, o comandante Rivaldo Cardoso avisou à torre de controle a emergência e retornaria ao Guararapes para um pouso de emergência. Não houve tempo. O avião caiu em Boa Viagem, sem deixar sobreviventes.
5) Voo de patrulhamento, Bandeirante, da FAB (1996)
O Bandeirante da FAB (Força Aérea Brasileira) decolou do aeroporto de Salvador às 15h do dia 17 de novembro de 1996. Seu destino era Natal, no Rio Grande do Norte. Sua missão, o patrulhamento da costa nordestina, com nove militares a bordo.
Por volta das 19h, a aeronave realizou uma manobra, nas imediações do município de São Caetano, no Agreste de Pernambuco, e se chocou com outro Bandeirante, que participava da mesma missão, e caiu na mata do Sítio Cabaceiras, causando um estrondo ouvido a um raio de 10km.
Destroços do avião foram encontrados a aproximadamente 200 metros do ponto de explosão. Nenhum dos nove ocupantes do Bandeirante sobreviveu.
PANAIR
A tragédia que marcou o Voo da Amizade
O Voo da Amizade se transformou em tragédia em 1961. No final da tarde do dia 31 de outubro, o quadrimotor Douglas DC7-C da Panair, prefixo PP-PDO, decolou de Lisboa, com previsão de chegada ao Recife na madrugada do dia 1º de novembro.
A aeronave fez uma escala na Ilha do Sal, um arquipélago localizado na costa africana, em Cabo Verde. Seis passageiros desembarcaram e, pouco depois, decolou novamente para a capital pernambucana. Por seis horas e meia, sobrevoou o oceano Atlântico.
“O aparelho penetrou na rota litorânea com tôda segurança, depois de ir perdendo, aos poucos, altura, para efetuar a aterragem. Ao sobrevoar Tejipió e aproximar-se da Fazenda Modelo, os passageiros já haviam recebido e cumprido as costumeiras ordens de apertar os cintos, sobretudo, não fumar, dadas pelo comandante Hugo Tenan. Colocou-se a aeronave na rota de atingir a pista que a ela se oferecia tôda sinalizada mais adiante”.
Descreveu a matéria do Diario de Pernambuco na edição do dia 2 de novembro de 1961. “Às duas e 13, precisamente, o trem de aterrissagem já desarmado chocou-se contra a encosta de um dos morros da Fazenda Modelo, deslizou para o cimo e capotou, partindo-se.”
O enorme estrondo foi ouvido em Tejipió e áreas próximas. As chamas foram avistadas de muito longe. “Do segundo andar do DIARIO, os redatores deste matutino viram apenas chamas iluminarem os céus, pensando que se tratava de um incêndio em qualquer grande prédio da rua da Concórdia”.
A aeronave se partiu ao meio. Moradores da redondeza contaram à reportagem do Diario que “a parte dianteira ficou envolta em chamas”. Após minutos, ocorreu a explosão, “que deixou tudo transformado num montão de ferros retorcidos e corpos carbonizado”.
“Depois de seis horas e meia de vôo seguro no oceano, na segunda etapa da viagem, o ‘Vôo da Amizade’ teve assim um desfecho trágico, a poucos segundos das pistas do aeroporto”.
Inicialmente, acreditava-se que 51 pessoas, entre passageiros e tripulantes, haviam morrido no acidente, conforme o número de ocupantes da aeronave. Depois ficou confirmado que seis passageiros teriam desembarcado na escala na Ilha do Sal, em Cabo Verde, e que o saldo de vítimas foi de 45.
As investigações indicaram que a luz vermelha de sinalização da cabeceira da pista para orientação em voos noturnos e de baixa visibilidade estava apagada, o que determinou a colisão do quadrimotor com a copa de uma grande árvore. A reportagem do Diario trouxe outras informações.
“No local onde caiu o avião não existem árvores de grande porte. É dominado, sobretudo, por uma vegetação rasteira, sempre abaixo do nível do morro, e poucas pessoas que lá estiveram dão crédito à teoria de que o aparelho batera em uma árvore antes de cair.”
O desastre do Douglas DC-7 é o décimo maior da aviação nacional.
Voo da Amizade
O “Voo da Amizade” era uma parceria recém-criada entre a TAP (Transportes Aéreos Portugueses) e a Panair do Brasil, depois assumida pela Varig, visando oferecer serviços e preços mais baixos para os voos entre Recife e Lisboa, o que aconteceu até 1967. O desastre do dia 1º de novembro de 1961 com o Douglas DC-7 foi o único registrado no período.
AIR FRANCE
Tragédia do Voo 447
O Voo 447 da Air France decolou do Aeroporto do Galeão às 19h30 do domingo rumo a Paris. O trágico destino, no entanto, não foi a cidade luz, mas a escuridão das profundezas do oceano Atlântico, próximo ao arquipélago pernambucano de Fernando de Noronha. 228 vidas foram interrompidas com a queda do Airbus 330 no dia 31 de maio de 2009. O maior desastre aéreo da história do Brasil e da companhia francesa.
O 447 seguiu a sua rota dentro da normalidade por cerca de 3h, quando entrou em Zona de Convergência Intertropical. Pouco depois, o Airbus sumiu. A recapitulação dos últimos registros indicava que algo terrível teria acontecido.
Às 22h33, o piloto manteve o último contato de voz. 15 minutos depois, o radar de Fernando de Noronha já não conseguia detectar o Airbus. Às 23h, houve registros automáticos de turbulência.
“Às 4h13 (23h13 de domingo de Brasília), contudo, o sistema automático do avião passou a enviar, por ondas de rádio, uma dezena de mensagens nas quais acusava a pane de vários objetos elétricos da aeronave. O envio dos sinais se estendeu por 4 minutos, até que o sinal foi perdido”.
Relatou a matéria publicada na edição do Diario de Pernambuco da terça-feira, 3 de junho, quando já não havia mais a esperança de encontrar sobreviventes. Uma gigantesca operação de busca foi montada, envolvendo as forças militares do Brasil, França e Espanha, que durou 26 dias.
Os primeiros corpos começaram a ser resgatados no dia 6 de junho. No total, 154 foram identificados e levados ao IML do Recife. 74 ficaram no fundo do mar.
Radioamador
A matéria do DP do dia 3 de junho, contou que os primeiros destroços do Airbus 330 foram encontrados graças a informações obtidas por um conhecido morador de Fernando de Noronha.
“André Sampaio, radioamador premiado e considerado pessoa decisiva para a Ilha de Fernando de Noronha por sua participação em salvamentos de pessoas em mais de 20 desastres aéreos e marítimos nos últimos 20 anos, agiu como de costume.”, contava a matéria.
“A diferença, segundo ele, é que, em vez de dar entrevista para a TV Golfinho (local), falou para jornalistas de todo o país – que divulgaram a notícia para o mundo. Ainda um tanto assustado com a repercussão do vazamento de uma notícia que os militares não pretendiam divulgar naquele momento – por volta das 7h30, hora de Brasília (8h30 em Noronha) –, André Sampaio não quis mais falar com a imprensa. A Aeronáutica, que já lhe deu a Medalha Santos Dumont, em 2004, teria lhe pedido para silenciar. Ele não confirmou a reprimenda.”