TJPE condena homem por tirar camisinha sem consentimento durante relação sexual
Sentença de primeiro grau havia absolvido o réu. Prática de tirar a camisa durante o ato sexual sem consentimento é conhecida como "stealthing"
A 2ª Câmara Criminal do Recife, do Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), decidiu condenar a 2 anos de prisão, em regime aberto, um homem acusado de violência sexual mediante fraude após retirar a camisinha sem consentimento da parceira durante relação sexual. A prática é conhecida como "stealthing".
A decisão do TJPE foi proferida na última quinta-feira (4) e reformou a decisão de primeiro grau que havia absolvido o homem. No acórdão, os desembargadores também decidiram substituir a reclusão por penas restritivas de direitos e determinaram indenização de R$ 4 mil por danos morais. A decisão foi unânime.
Segundo os autos, vítima e denunciado se conheceram durante uma manifestação no Recife em 2023. Três dias depois, eles combinaram um encontro no apartamento da mulher, em que houve ato sexual de maneira consentida.
Durante a relação, o homem retirou o preservativo sem informar a vítima, conforme a denúncia do Ministério Público de Pernambuco (MPPE).
"Ao notar a ausência do preservativo, a vítima interrompeu imediatamente o ato e repreendeu o denunciado, que admitiu ter retirado o preservativo e justificou sua conduta alegando que não sentia prazer ao utilizá-lo", diz trecho da denúncia.
Danos
A mulher diz que, após o episódio, desenvolveu problemas emocionais, psiquiátricos e corporais, passando a ter problemas gastrointestinais, bruxismo, insônia, além de medo de encontrar com o acusado na rua.
Interrogado, o homem admitiu ter retirado o preservativo enquanto a mulher estava de costas, mas alegou que a ação foi consensual.
Ele lembrou que circularam prints de seu rosto com a acusação de que seria estuprador, o que manchou sua imagem em grupos de mestrado e da faculdade. "Seus problemas psicológicos é que foram maiores, ficou sem conseguir sair de casa, tinha medo de ir à esquina", diz trecho do interrogatório.
Após a absolvição em primeiro grau, o MPPE e o assistente de acusação apelaram sustentando que a palavra da vítima em crimes sexuais possui especial relevância probatória e que a justificativa da permanência da vítima com o réu após o ato "deve ser analisada sob o prisma do trauma e do medo".
Voto do desembargador
"Em que pese o juízo de origem tenha absolvido o recorrido, tenho que nos autos restaram demonstradas a materialidade e a autoria delitivas nos documentos da fase inquisitorial, bem como pelos termos de declarações da vítima, depoimento testemunhal e o interrogatório colhidos na referida fase policial e na instrução processual”, escreve o desembargador Isaías Andrade Lins Neto, relator dos recursos.
O magistrado destaca que a mulher levou alguns dias para compreender plenamente o que havia ocorrido e perceber a violência sofrida. Ela procurou a delegacia após ser incentivada por amigos.
Ele também discorda dos argumentos da defesa. "A tese defensiva de que houve falha de comunicação íntima ou que a vítima consentiu tacitamente ao manter convivência com o réu nos dias seguintes não afasta a ilicitude do ato inicial nem invalida o trauma subsequente", alerta em seu voto.
"O comportamento da vítima ao permitir que o réu permanecesse em sua residência por mais dois dias, ainda que possa causar estranheza em uma leitura superficial, não descaracteriza a fraude inicial e deve ser interpretado à luz das reações psicológicas típicas de vítimas de violência sexual, que, em muitos casos, permanecem em situação de submissão ou de paralisação emocional por medo ou confusão", ele completa.