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Alterações de Derrite no PL Antifacção preocupam governo e PF; veja mudanças

Ao equiparar facções ao terrorismo, texto de Derrite pode abrir brecha para intervenções estrangeiras

Por Milena Galvão

Deputado Guilherme Derrite (PP-SP) / Polícia Federal

O relator do projeto de lei antifacção, deputado Guilherme Derrite (PP-SP), fez mudanças significativas no texto originalmente enviado pelo governo ao Congresso, provocando críticas entre aliados do Planalto. Para integrantes da base, o substitutivo apresentado pelo parlamentar pode abrir brechas para intervenções estrangeiras sob o pretexto de combate ao terrorismo.

A proposta é considerada uma das principais apostas do governo para enfraquecer o crime organizado no país. O texto original cria a figura da “facção criminosa”, eleva penas para integrantes de organizações criminosas — de 3 a 8 anos para 5 a 10 — e prevê punições de até 15 anos em casos de domínio territorial obtido por violência ou ameaça.

Derrite, que está licenciado do cargo de secretário de Segurança Pública de São Paulo, no governo Tarcísio de Freitas, manteve parte dessas medidas, mas fez alterações de fundo. Ele incluiu condutas atribuídas a facções, milícias e grupos paramilitares dentro da Lei Antiterrorismo, equiparando esses crimes a atos terroristas.

Para o governo, essa equiparação é problemática: além de não garantir maior eficácia contra o crime organizado, poderia gerar riscos diplomáticos e econômicos, ao enquadrar o Brasil em protocolos internacionais de combate ao terrorismo.

Outro ponto de embate envolve a competência da Polícia Federal (PF). Na versão inicial de seu parecer, Derrite restringia a atuação da PF a casos de repercussão interestadual ou transnacional, ou quando houvesse determinação do Ministério da Justiça. A medida foi vista como um recuo na autonomia da corporação.

Após críticas, o relator suavizou o texto e, na nova versão, permite que a PF participe das investigações por iniciativa própria, sempre que os fatos envolverem matérias de sua competência legal. Ainda assim, o texto mantém a primazia das polícias civis estaduais nas apurações, com controle dos ministérios públicos locais.

Segundo o novo parecer, a cooperação entre PF e polícias estaduais deve ocorrer, preferencialmente, por meio das Forças Integradas de Combate ao Crime Organizado (FICCO) ou de outras estruturas do Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), respeitando os princípios de coordenação e cooperação federativa.

Outras medidas

O relator do projeto antifacção, deputado Guilherme Derrite (PP-SP), manteve a ampliação das regras de infiltração em organizações criminosas prevista pelo governo, mas com ajustes. Hoje, apenas policiais podem atuar infiltrados; com as novas propostas, colaboradores ou delatores também poderão assumir identidades falsas, mediante autorização e emissão de documentos fictícios pelos órgãos competentes.

Tanto o texto do governo quanto o substitutivo de Derrite criam um Banco Nacional de Organizações Criminosas. A diferença é que o relator fixa prazo de 180 dias para sua criação e prevê ainda a instalação de bancos estaduais integrados ao sistema nacional.

Na parte penal, Derrite endurece as punições. O homicídio ligado a facções ou atos equiparados ao terrorismo passa a ter pena de 20 a 40 anos, acima dos 12 a 30 anos propostos pelo governo. Ele também eleva as penas para crimes como lesão corporal (6 a 15 anos), furto (4 a 10 anos), sequestro (8 a 12 anos) e roubo com morte (20 a 40 anos).

A extorsão mediante sequestro poderá chegar a 40 anos em caso de morte da vítima. Já o aumento de pena para milícia privada, sugerido pelo Executivo, não foi incluído pelo relator.

No capítulo sobre crimes hediondos, Derrite inclui no rol as condutas equiparadas a terrorismo, enquanto o Executivo havia limitado a classificação à participação em facções ou milícias. Esses crimes, por definição constitucional, são considerados de extrema gravidade, não admitem fiança, anistia ou graça, e punem também quem os ordena ou se omite diante deles.

Tanto o governo quanto Derrite preveem o monitoramento por vídeo e áudio das visitas a presos — exceto de advogados, salvo em casos de suspeita fundamentada de conluio.

O relator, porém, endurece as regras de progressão de pena:

  • Crimes hediondos: só após 70% da pena (hoje é 40%);
  • Hediondos com morte ou chefia de facção/milícia: de 50% para 75%;
  • Reincidentes: de 60% para 80%;
  • Hediondos com morte para reincidentes: de 70% para 85%;
  • Feminicídio passa a ser considerado agravante no cálculo da progressão.

Derrite também propõe que chefes de facções ou milícias cumpram pena em Regime Disciplinar Diferenciado (RDD), em presídios de segurança máxima — ponto ausente na versão do Executivo.

Ambos os textos permitem que a Justiça afaste sócios e intervenha em empresas ligadas ao crime organizado, além de determinar o perdimento integral dos bens ilícitos. A diferença está na destinação: Derrite quer que os valores fiquem com o governo estadual onde ocorreu o crime, enquanto o governo defende que a gestão seja feita pelo Ministério da Justiça.

O prazo das investigações segue o mesmo nas duas versões: 30 dias para réus presos e 90 dias para soltos, prorrogáveis.

Por fim, Derrite acrescenta que integrantes listados nos bancos nacional ou estaduais de organizações criminosas se tornam inelegíveis, impedindo sua candidatura a cargos públicos. Com informações do portal g1.

Confira nota da Polícia Federal:

 

"A Polícia Federal acompanha com preocupação as alterações produzidas pelo relatório sobre o Projeto de Lei Antifacção, atualmente em debate no Congresso Nacional.

A proposta original, encaminhada pelo Governo do Brasil, tem como objetivo endurecer o combate ao crime e fortalecer as instituições responsáveis pelo enfrentamento às organizações criminosas. Entretanto, o texto em discussão no Parlamento ameaça esse propósito ao introduzir modificações estruturais que comprometem o interesse público.

Pelo relatório apresentado, o papel institucional histórico da Polícia Federal no combate ao crime — especialmente contra criminosos poderosos e organizações de grande alcance — poderá sofrer restrições significativas. A execução de operações pela Polícia Federal dependeria de solicitação do governo estadual da região investigada, o que constitui um risco real de enfraquecimento no combate ao crime organizado.

Essa alteração, somada à supressão de competências da Polícia Federal, compromete o alcance e os resultados das investigações, representando um verdadeiro retrocesso no enfrentamento aos crimes praticados por organizações criminosas, como corrupção, tráfico de drogas, desvios de recursos públicos, tráfico de pessoas, entre outros.

É importante ressaltar que, em agosto, a Polícia Federal realizou a maior operação contra o crime organizado da história do país. Pelas regras propostas no relatório em discussão, operações como essa estariam sob ameaça de não ocorrerem ou de terem seus efeitos severamente limitados.

A Polícia Federal reafirma que continuará defendendo suas atribuições constitucionais e a preservação da sua autonomia funcional, a fim de garantir o cumprimento da lei e a defesa da sociedade brasileira."

Leia nota oficial da Receita Federal: