Anjos barrocos do Recife e Olinda
Quem conhece as igrejas barrocas do Recife e Olinda sente-se maravilhado diante dos seus altares dourados
Marcus Prado *
Quem conhece as igrejas barrocas do Recife e Olinda sente-se maravilhado diante dos seus altares dourados. Terá visto esculturas de anjos como os da Igreja de Nossa Senhora da Conceição dos Militares, templo barroco-rococó localizado no centro histórico da capital. Há informações de que já foi visitada por grandes historiadores e estudiosos da arte sacra do Brasil, como o famoso escritor e poeta mineiro Afonso Ávila, especialista em arte barroca, ao descrever o sentimento que o estilo de arte evoca.
Também a visitou o cosmopolita e intelectual Robert C. Smith, norte-americano, considerado um dos mais eminentes investigadores da arquitetura e das artes decorativas portuguesas e brasileiras do período barroco. (Estou sabendo que a Fundação Calouste Gulbenkian, de Lisboa, está celebrando este mês a memória do saudoso historiador). Outro renomado historiador, Germain Bazin, definiu essa igreja como a “Capela Sistina do barroco rococó”.
A presença de anjos na decoração dos altares, repletos de símbolos, serve como lembrete da proteção divina e da cooperação desses mensageiros nos desígnios de Deus. Já foi dito que essa proteção — seja no Cristianismo, no Judaísmo ou no Islamismo — corresponde à crença de que seres angélicos foram criados por Deus para lhe servir como guias e defensores dos seres humanos contra influências negativas e contra o mal, inspirando boas ações e oferecendo segurança e apoio espiritual.
Sobre os anjos e seus elementos no universo celestial, Santo Tomás de Aquino dedicou um espaço considerável na Suma Teológica, discutindo a natureza e as atividades dos anjos. Frequentemente, ele usava a natureza dos anjos para iluminar a natureza da cognição humana. Os escritos de Voltaire, em seu célebre Dicionário Filosófico, impressionam pela riqueza de informações. Embora rejeitasse a maior parte da doutrina cristã, ele acreditava em Deus e tinha em sua casa um altar. Em suas obras, Voltaire se vale de personagens celestiais: além do anjo Jesrad, de Zadig, aparecem também Micrômegas e o saturniano de Micrômegas. Voltaire tinha verdadeira fascinação por tais seres, como se vê em seu clássico Dicionário.
Anjos barrocos do Recife e Olinda
Marcus Prado *
Não deixo sem registro a impressão que me causou o altar-mor da Igreja de Santo Inácio de Loyola, em Roma, o fundador da Companhia de Jesus (Jesuítas). Uma joia do estilo barroco, de inimaginável beleza pela sua grandiosidade arquitetônica, em cuja cúpula há o predomínio de anjos. Há uma cena que retrata Santo Inácio sendo levado aos céus, rodeado por numerosos anjos.
Representação do sagrado há na Igreja Santo Inácio de Loyola. Anjos que se parecem com os da pintura de Paul Klee (Angelus Novus), o “anjo da história”, que olha assustado para o passado, vendo apenas uma tempestade de ruínas, impulsionada para o futuro. Essa tempestade é o que Walter Benjamin chama de “progresso”, uma força irresistível que impede o anjo de parar e salvar os fragmentos do passado. A possibilidade e a realidade, a existência, a vida. A obra retrata um anjo com a cabeça grande, asas abertas e um olhar arregalado e assustado, com a boca aberta.
Existem instituições pontifícias em Roma que oferecem estudos teológicos de pós-graduação, onde a angelologia é abordada com exclusividade durante dois anos, com interessados de vários países.
Por fim, destaco os anjos tocheiros das igrejas seculares de Olinda e do Recife, que historicamente iluminavam o ambiente litúrgico quando a iluminação elétrica não existia e que hoje, além da função original, representam a luz divina — a mesma luz que, em Dante Alighieri, simboliza o objetivo final da Divina Comédia: a própria Luz de Deus, à qual o poeta ascende após sua jornada pelo Inferno e pelo Purgatório.
* Jornalista