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MORADIA

Há conciliação? Planejamento habitacional e especulação imobiliária no Centro do Recife em discussão na Frente Parlamentar

Publicado em: 27/09/2021 20:00 | Atualizado em: 27/09/2021 20:16

 (Foto: Carlos Lima/Divulgação)
Foto: Carlos Lima/Divulgação
Em meio à onda de protestos em Pernambuco  que tem como pedido central moradia digna, a Frente Parlamentar pelo Centro do Recife realizou, nesta segunda-feira (29), a segunda reunião pública para discutir os planos e estratégias de habitação para a região central da capital pernambucana. O encontro aconteceu no formato virtual por conta da pandemia da Covid-19 e reuniu professores pesquisadores no âmbito da habitação da cidade, além de representantes de movimentos sociais e da Prefeitura do Recife, que, dentro de cada segmento, levantaram reflexões e pontuaram ações que podem ser colocadas em prática no planejamento habitacional da cidade.  

Na abertura da sessão, a vereadora e presidente da Frente Parlamentar, Cida Pedrosa (PC do B) pontuou a importância do debate e de ações práticas acerca da organização habitacional do centro do Recife. "O tema Habitação no Centro nos coloca frente a essa reflexão. Tanta gente sem casa, tanta casa sem gente. Pensar a problemática da moradia ou melhor, a falta dela para milhões de brasileiros, na perspectiva do centro da cidade, é um grande desafio. O modelo adotado nos anos 80 põe os conjuntos habitacionais nas periferias das cidades em precárias condições e não se aplica mais à nossa realidade {...}. É preciso pensar em como aproveitar os caminhos estratégicos para mudar essa realidade", iniciou a parlamentar. 

Em seguida, a professora do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da UFPE, Iana Ludermir discutiu a "Habitação no Centro do Recife: coexistência entre inovação imobiliária e patrimônio histórico". Na abordagem do tema, a pesquisadora traçou um panorama das contradições que cercam o cenário de abandono de imóveis do centro da cidade em convergência com o pouco desenvolvimento de ações voltadas para a ocupação da região. Para Ludermir, o centro do Recife reúne uma conjuntura favorável para promover habitação social. 

"No entanto, o que encontramos no momento atual é que temos o estímulo à produção progressiva de novos imóveis residenciais. Temos uma dinâmica imobiliária pautada na renovação da demanda que são escassas as pessoas que teriam a possibilidade de adquirir um imóvel. Para que essas pessoas voltem ao mercado e sintam novamente o desejo de consumir, o mercado imobiliário muitas vezes tem como estratégia a promoção de inovações imobiliárias que acabam promovendo uma obsolescência precoce dos imóveis anteriores que ainda poderiam ser utilizados". 

De acordo com a pesquisadora, essa estratégia de "envelhecimento" utilizada pelo setor imobiliário sobre imóveis antigos que poderiam ser utilizados como moradia faz parte de uma dinâmica imobiliária que se apropria do enaltecimento do novo para poder vender. "A construção da narrativa de que os prédios de 50, 60 e 70 não servem mais para o uso habitacional contribui para a depreciação do modelo antigo, que é maioria do que temos na nossa área central", apontou, acordando que o atual desafio para o município é criar estratégias para a conciliação entre o direito à moradia, a necessidade de valorização do patrimônio edificado e a inovação imobiliária na promoção habitacional na área central da cidade. 

Segundo o coordenador do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), Rud Rafael, é preciso unificar as forças, entre o poder legislativo, as universidades, os movimentos sociais e a sociedade civil para a construção de políticas públicas voltadas à moradia. "É importante reafirmar a necessidade de na luta construir uma solução para o problema da moradia popular. Recife precisa não só se sintonizar com essa tendência mundial, como também reparar a dívida histórica que tem com suas populações. No bairro de Santo Antônio, a gente fez um levantamento dos imóveis vagos no bairro de Santo Antônio e existiam 42 imóveis abandonados, em condição boa ou regular, de cinco ou mais andares que tem uma capacidade construtiva instalada". Segundo Rud, a partir do estudo foi feita uma projeção de que 2.106  unidades habitacionais poderiam ser reabilitadas para a moradia. "Basta vontade política para a gente somar forças". 

Ocupação do Centro

A Professora do Departamento de História da UFRPE, Mariana Zerbone, desmistificou a ideia de que o centro do Recife é um local desabitado. Como exemplo, a pesquisadora citou o número de domicílios situados nos bairros de São José, Boa Vista, Santo Amaro, Coelhos e Ilha de Joana Bezerra. Juntos, esses locais acomodam mais de 20 mil moradias. "Será que o centro do Recife deixou de ter vitalidade ou ele continua dinâmico?", questiona. 

"A gente parte de um Recife desigual, espaço de conflitos, lutas, estratégias, mas também resistências. É o Recife de ambiguidades e paradoxos e, por outro lado, uma expansão imobiliária dentro desse contexto. A história do século XX nos mostra que muitos debates e projetos sobre moradia no centro geraram processo de higienismo e gentrificação, expulsando dos centros os mais pobres e abrindo espaço para a especulação imobiliária". Para Zerbone, no entanto, é preciso contemplar habitações para diferentes classes sociais. 

Diretrizes da PCR

Conforme a secretária-executiva de Habitação do Recife, Norah Neves, a Prefeitura do Recife vem adotando 13 linhas de atuação nas estratégias de moradia da cidade, que são: construção de novas unidades habitacionais, requalificação de prédios existentes, produção de lotes urbanizados, urbanização de assentamentos precários, aquisição ou obtenção de imóveis pela PCR, regularização fundiária, Programa Parceria e Assistência Técnica HIS, Locação Social Pública, Locação Social Privada, Locação por Organizações sem fins lucrativos, Auxílio Moradia, Plano Local de Habitação de Interesse Social e Sistema de Informações HIS. 

Segundo a secretária, a PCR também tem como plano a integração de pontos como habitação, preservação do patrimônio público, pluralidade econômica, parcerias "na promoção de investimentos públicos e privados", diversidade social, moradia e integração urbana. "Essa parceria com todos os segmentos da sociedade que entendemos que é importante e é nesse sentido que os projetos e ações estão sendo desenvolvidos".

A partir do que foi discutido na reunião, a Frente Parlamentar informou que será construído um relatório para conduzir as ideias apontadas a ações práticas. 

Fazem parte da Frente os vereadores: Cida Pedrosa (PCdoB), Marco Aurélio (PRTB), Luisy Eustáquio (PSB), Zé Neto (PROS), Dani Portela (PSOL), Rinaldo Jr (PSB), Alcides Cardoso (DEM), Liana Cirne (PT) e Michelle Collins (PP).









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