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Pandemia

Com fechamento de hotéis e barracas de praia, moradores de Tamandaré dependem de doação

Publicado em: 03/04/2020 13:15

 (Foto: Cortesia.)
Foto: Cortesia.
As famílias que moram nos municípios litorâneos e dependem do turismo para trabalhar tem enfrentado uma crise provocada pelo fechamento de hotéis, restaurantes, lojas e comércio de praia durante a pandemia. Diante da necessidade do isolamento social, recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), os moradores de resguardam em casa para evitar contágio do novo coronavírus ao mesmo tempo que enfrentam a fome, já que muitos desses trabalhadores não têm salário fixo e dependem da venda do artesanato ou de alimentos na praia para sustentar a família.

O município de Tamandaré, no Litoral Sul pernambucano, tem cerca de 23 mil habitantes. A área mais afetada é a Zona Rural, com 2,5 mil famílias. A maioria trabalha nos 27 engenhos e nas três usinas de cana-de-açúcar da região, que sofreram diminuição na produção. Quem vive no Centro, cerca de 15 mil pessoas, também está sofrendo os impactos, já que a maioria trabalha no comércio ou como ambulante na praia. Nessas duas realidades, os moradores tentam sobreviver sem ter a principal fonte de renda. 

A lavadeira Josefa Francisca da Silva, de 55 anos, percebeu a diminuição na demanda de roupas com a queda do movimento de turistas. "Além de lavar roupa também vendo artesanato. Mas tudo parou e agora a gente depende de ajuda. Duas filhas minhas trabalham como diarista em casa de veraneio. Tenho medo quando elas saem, mas precisam continuar indo trabalhar. O pouco que ganham já é alguma garantia que a gente tem de comida na mesa", conta.

Uma iniciativa que mantinha doações de cestas básicas e consultas médicas precisou diminuir as atividades para evitar a disseminação do novo coronavírus. A campanha A fome não pode esperar, liderada pelo padre Arlindo de Matos Júnior, arrecada mantimentos para essa população mais vulnerável desde o ano passado. A ação acontecia com a colaboração dos três principais times do estado, Santa Cruz, Sport e Náutico, através do ingresso solidário, de apadrinhamento de veranistas e empresários. Na última ação, em 2019, foi possível entregar 80 toneladas de alimento. Neste ano, com a suspensão dos torneios e a paralisação das atividades, o desafio é fornecendo as doações.

 "Essas pessoas precisaram de ajuda o ano inteiro. Com a chegada do vírus, o problema foi agravado. A campanha não parou. Agora é que elas estão precisando mais. Todos os dias elas batem na minha porta pedindo comida. Precisamos expandir a campanha formando uma grande rede de solidariedade, para as famílias sobreviverem. Porque quem tem fome, tem pressa", convoca o padre, que usou suas redes sociais para fazer o apelo.

Uma creche mantida pela Paróquia de São Pedro atende 500 crianças. Mesmo após o fechamento, as 50 cozinheiras entregam refeições nos dias de terça e quinta aos pais das crianças. "Na maioria das casas, essa é a única refeição que terão. A renda daqueles que deixam seus filhos na creche é de 1/3 de um salário mínimo, então são pessoas que ganham até R$ 400 por mês. Diante da crise, nem isso têm recebido", conta o sacerdote. Para evitar contato físico e aglomeração, os funcionários entregam senhas e informam o dia e a hora para buscarem a comida. Os funcionários organizam filas com distância de 1,5 metro entre as pessoas, usam máscara, luva e borrifam álcool 70% nas mãos.

A vendedora de artesanato Letícia Rosalva da Silva, de 32 anos, depende do trabalho diário na praia para garantir sua renda mensal. Sem poder sair, ela se mantém isolada dentro de casa e depende exclusivamente do auxílio prestado pela Paróquia. Com um filho atendido na creche, ela faz serviços voluntários da Instituição para retribuir o gesto. "Estamos sem renda porque meu marido também ficou desempregado. Só espero que tudo isso passe o mais rápido possível", diz.

Para manter esses auxílios, a paróquia lançou uma vaquinha virtual para arrecadar os valores necessários e garantir a entrega de cestas básicas. O método é uma alternativa durante o isolamento, já que a maioria dos voluntários que não pode ajudar de forma presencial. "Precisamos garantir ao menos as 500 cestas básicas, mas sabemos que além daqueles que são atendidos pela creche, muitas outras famílias também passam necessidade. Como padre, me dói ver pessoas passando fome. Espero que as pessoas que tenham condições, possam se unir em uma corrente de solidariedade, arregaçar as mangas e fazer algo pelo próximo", diz o padre Arlindo.

Alimento do espírito
Para levar esperança em uma época de medo, todos os dias, às 18h, o padre Arlindo percorre a cidade de Tamandaré com um carro de som transmitindo liturgias e orações. Como ele mesmo diz, é uma procissão de um homem só. Das portas e janelas, os moradores acompanham e rezam junto com ele. Uma imagem de Nossa Senhora e uma Cruz representam o altar da Igreja de São Pedro, que está de portas fechadas. Os sermões são transmitidos pelas redes sociais. Esse foi o jeito que o pároco encontrou para manter a fé viva.

"O padre não é estéril. A nossa família é a comunidade. Meu sofrimento é de um pai que vê os filhos sofrerem. Para aliviar essa dor, eu saio pelas ruas para que as pessoas ouçam o Pai Nosso e a Ave Maria, já que não podem fazer isso em comunhão. Não podemos ficar paralisados diante do medo porque esse é um sentimento que adoece também. É preciso alimentar o espirito com entusiasmo para nos fortalecer", aponta.

Em tempos de isolamento, a fé ultrapassa as portas da igreja e, mesmo distantes fisicamente, os fiés rezam juntos. "Voltamos ao tempo da igreja doméstica, em que as missas acontecem dentro das casas. E é desse povo que estou tomando conta. Porque todos nós estamos passando por atribulações. A  igreja vive de doações e coletas, então todas as paróquias estão sofrendo também", conta.

Para o religioso, o momento que desafia o mundo serve de estímulo para exercitar a fé e o amor ao próximo. "Muita gente me pergunta quando tudo isso vai passar. Não sabemos. Essa é uma pergunta que só traz ansiedade. Só vamos ficar mais angustiados pensando nisso. Precisamos voltar nossos pensamentos e ações para nos perguntarmos 'o que eu posso fazer com isso?', 'o que eu posso realizar hoje para mudar minha realidade?'. Essas são perguntas que nos movem, servem de impulso e fortalecem o espírito".

- Como ajudar

Projeto Tamandaré - Associação Padre Enzo 
Doações da vaquinha virtual:

Informações para arrecadação de alimentos
Recife: 81 9 99453131 (Renata Queiroga)
Caruaru: 81 9 9122.1418 (Marta Regina)
Tamandaré: 81 9 8808.2420 (Isabel Oliveira)

Dados bancários:

Banco do Brasil
Ag: 3924-1
C/c: 5.254-x
CNPJ: 03.620.722/0001-37
APESPT - TAMANDARÉ

Banco Bradesco
Ag: 6043-7
C/c: 8386-0
CNPJ: 03.620.722/0001-37
ASSOCIACAO PE ENZO SOLIDARIEDADE
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