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OBSERVATÓRIO ECONÔMICO

Escolhas em tempos difíceis

Publicado em: 06/04/2020 13:17

Estamos enfrentando umas das maiores crises de nossa geração e sem saber ao certo quando ela se encerrará. A expectativa é que os meses de abril e maio sejam os mais críticos, com crescimento dos casos de contágio, internações e óbitos, para posteriormente, começarem a declinar. Enquanto isso, o que fazer? São tempos difíceis, que exigem decisões difíceis. O custo da inação é alto, mas decisões extremadas podem ter um custo elevado também. Há uma falsa dicotomia entre salvar vidas ou salvar a economia. A economia importa para a vida das pessoas e sem as pessoas, a economia não faz sentido.

Tenho visto uma falsa percepção de que temos apenas alternativas extremas, por um lado, o isolamento horizontal completo (distanciamento social), algo que estamos implantando agora, por outro, o de nenhuma restrição. Há caminhos alternativos com custos menores, mas que exigem liderança, coordenação e bom senso.

O isolamento horizontal, em um primeiro momento, é necessário para preparar o sistema de saúde, adiando e, possivelmente, reduzindo o pico das infecções. É o que os especialistas definem como “achatar a curva”, dado que a capacidade do sistema de saúde é limitada. No entanto, essa medida tem um custo e não é baixo. Além disso, ela não pode durar para sempre.

Quebrar a economia com a premissa de que isso salvaria vidas pode ser até verdade no curtíssimo prazo, mas como a realidade tem nos mostrado muitos têm perdido sua fonte de renda. Tenho ouvido frequentemente “ou se morre do vírus ou de fome”, particularmente verdade entre os mais pobres. Mas também verdade entre as empresas, muitas das quais têm enfrentado dificuldades para sobreviver e muitas não conseguirão.  Precisamos de uma estratégia de transição, do isolamento completo para o isolamento parcial e volta das atividades econômicas, sob o risco de pagarmos um preço elevado. 

Uma dessas medidas é prover assistência temporária durante a crise, quando o isolamento completo está em curso, mas as medidas não podem parar por aí. As ações do governo federal em prover auxílio financeiro para as famílias e empresas são bem-vindas, são uma forma de compensar os efeitos da crise, mas terão um efeito paliativo. Além disso, a questão é se serão suficientes e se alcançarão quem de fato precisa.

Alguns economistas, dentre eles Paul Romer, nobel em Economia em 2018, têm defendido que os governos deveriam investir pesadamente em testes em massa da população, seguido de isolamento dos que testarem positivo apenas, produção de equipamentos de proteção e liberação da atividade econômica. Isso seria uma estratégia de transição entre o isolamento completo e a volta à normalidade. 

Para funcionar, a testagem precisa ser contínua e largamente disponível. Exigirá coordenação, cooperação e liderança num verdadeiro “esforço de guerra” para produzir testes, testar a população e produzir equipamentos. Mas é necessária, até porque o isolamento horizontal completo não poderá durar muito tempo. Por quanto tempo ainda a economia suportará? Mais ainda, como isolar famílias em comunidades pobres, muitas das quais moram em locais inadequados, apertados, e sem saneamento básico? Por quanto
tempo sobreviverão as empresas e os informais? 

O isolamento completo e as medidas de ajuda anunciadas pelo governo são importantes, mas são paliativas e terão efeito temporário. Meu receio é que se não partirmos para uma estratégia de transição, investindo pesadamente em testagem e produção de equipamentos de proteção, mudando os protocolos nas atividades econômicas e nas relações sociais para evitar o contágio, e assim liberar a economia, o remédio pode acabar matando o paciente. 

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