Diario de Pernambuco
Busca

OBSERVATÓRIO ECONÔMICO

Onde está o dinheiro?

Publicado em: 12/08/2019 14:22 | Atualizado em: 12/08/2019 14:34

A primeira etapa para a aprovação da reforma da previdência, a sua aceitação pela Câmara dos Deputados, sinalizou que o discurso do governo quanto a necessidade de ajuste fiscal e da importância em administrar o déficit público foi vitorioso, destarte a evidente inabilidade do Executivo na articulação política. Isto contudo não calou as vozes que clamam pelo caráter inócuo da reforma em termos de gestão de um déficit que seria inexistente e, ademais, demandam um retorno urgente de estímulos da União para a recuperação da atividade econômica.

Nesta linha de argumentação temos dois pontos de vista que se destacam, sendo o primeiro o de que o déficit público, mesmo que exista, não deveria ser o centro da agenda de política econômica, e o segundo é o de que o déficit só existe por má gestão do Executivo e pode ser revertido por meio de simples medidas. Em relação ao primeiro argumento temos um retorno da visão que a expansão do gasto público tem um efeito multiplicador na economia que induz uma expansão grande o suficiente para reduzir a relação dívida/PIB, ou seja, quanto mais a União gastar menor será sua dívida em relação ao PIB e, consequentemente, mais fácil será financiar os gastos passados e viabilizar novos gastos futuros. Esta visão não é nova, já foi implementada antes, mas tem como problema central o fato que as premissas para que ela seja verdadeira não se observam por estas terras, e historicamente todas as vezes que tentamos conseguimos crescimento no curto prazo e recessão no médio prazo. Vide governo Dilma para a última ação nesta linha.

A segunda linha é mais pragmática, basicamente diz que o problema fiscal brasileiro se deve ao pagamento de juros e as desonerações e renúncias fiscais. No caso dos juros, que outrora eram para o capital internacional e hoje é para o doméstico mesmo, é um ponto bem simples. O Brasil roda déficits fiscais sistemáticos faz décadas, e para financiar isto toma dinheiro no mercado pagando, logicamente, juros. Além disso, por termos ainda uma inflação relativamente elevada, utilizamos o instrumento monetário clássico para lidar com ela, juro alto. Logo, arguir contra o pagamento dos juros equivale a inviabilizar o financiamento do Estado e implodir a política que combate à inflação.

E as renúncias e desonerações? É fato que elas somam centenas de bilhões por ano, porém aqui temos uma miríade de elementos que formam esta conta. Pode-se dizer a eliminação de alguns deles tem de fato potencial de melhorar a arrecadação, mas imaginar que todo o volume pode ser revertido em receita é uma ideia estapafúrdica. A questão é existem diversos tipos de renúncias e desonerações, e muitas sequer são relacionados a atividade econômica (desporto, assistência social, cultura etc.). Considere a principal renúncia fiscal, o SIMPLES, se ele for eliminado o mais provável é que nada do valor de renúncia seja arrecadado e ainda haja perda do hoje o é em função de boa parte das empresas simplesmente passarem para a informalidade. E o PROUNI? Sem ele os beneficiários simplesmente sairiam dos cursos e a arrecadação fiscal cairia ao invés de aumentar. E zerar os benefícios da Zona Franca de Manaus irá de fato aumentar arrecadação, ou veremos as empresas irem embora? Por outro lado, retirar as deduções de gasto com saúde e educação pode de fato elevar a arrecadação, e há rumores que o Executivo anda pensando nisto.

Infelizmente a gestão do orçamento da União está longe de ser algo simples, e resolver um déficit crônico está longe de ser feito com uma dúzia de medidas provisórias iluminadas. Muito embora haja espaço para termos ganhos fiscais com uma melhor gestão de renúncias e desonerações que podem ter perdido já seus objetivos, não há como achar que isto vai resolver todos os nossos problemas. Então onde está o dinheiro, o mais de um trilhão de reais só em arrecadação federal a cada ano? Gastamos cada centavo dele e ainda faltam várias dezenas de bilhões, a cada ano, que vamos buscar emprestado nos bancos. Então talvez seja hora de fazer o básico só para variar, por as contas e ordem e colocar a economia para andar.

TAGS: obseconomico |
Os comentários abaixo não representam a opinião do jornal Diario de Pernambuco; a responsabilidade é do autor da mensagem.