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Observatório Econômico Regra de ouro Mais do que nunca precisamos resgatar a ética nos nossos relacionamentos interpessoais e na maneira como nos comportamos em sociedade

Por: Marcelo Eduardo Alves da Silva

Publicado em: 18/02/2019 08:41 Atualizado em:

Dias desses fui apresentado a um vídeo sobre a cultura do “mindfulness of others” (atenção aos outros numa tradução livre). O vídeo usava como exemplo a cultura japonesa, na qual é difundida a ideia de que devemos nos preocupar com os outros no dia a dia e como isso tornava a vida em sociedade mais fácil e mais agradável. O vídeo mostrava o cuidado com o lixo (o que tornava as ruas limpas), o respeito às filas no metrô, a prática em utilizar apenas um lado da escada rolante (deixando o outro livre para pessoas com pressa), o cuidado com os equipamentos públicos, o respeito à propriedade dos outros, etc. Isto não quer dizer que não existam desvios, claro que existem, mas culturalmente são reprováveis. No entanto, o que me veio à mente era o claro contraste com a “lei de Gérson”, muitas vezes evidente na nossa cultura. Ao final, a moral do vídeo era mostrar o que todos deveríamos saber: teríamos a ganhar como sociedade se nos preocupássemos mais com os outros, sejam esses outros atuais ou futuros membros de nossa sociedade.

Infelizmente em muitas sociedades, incluindo a nossa, o “mindfulness of others” não é a regra, e sim exceção. Por essas bandas, a lei de Gérson, que consiste na ideia de ter vantagem em tudo sem se importar com questões éticas ou morais, ou ainda com o efeito sobre os outros, parece ser mais predominante e reflete nosso subdesenvolvimento. Note que ser adepto da lei de Gérson nada tem a ver com a riqueza ou classe social, tampouco com educação formal. Não nos faltam exemplos de atitudes baseadas na famigerada lei em todas as classes sociais e níveis de educação. Por outro lado, o que muitos estudos mostram é que a direção da causalidade se dá no sentido oposto, refletindo a importância da ética, da atenção aos outros, do respeito às regras e/ou normas sociais, aquilo que chamamos de “instituições”, para o desenvolvimento econômico. 

A ciência econômica tem mostrado como sociedades que implantaram normas sociais de cooperação e respeito aos outros acabaram apresentando desenvolvimento econômico superior em relação àquelas que implementaram normas sociais de não-cooperação, de conflito, como no caso da lei de Gérson.  Todos nós quase que diariamente nos deparamos e, talvez sejamos os próprios agentes, de atos deselegantes, egoístas, desrespeitosos com os outros. São pessoas que não respeitam as autoridades (incluindo crianças e pais que não respeitam os professores), não respeitam as regras de trânsito, furam fila (afinal o tempo deles é mais precioso que os dos outros), não recolhem o lixo que produzem, não se importam se o barulho que fazem em casa, no ambiente de trabalho ou nas ruas incomodam os outros, etc. A lista é grande, mas todos refletem nosso subdesenvolvimento e nos fazem ficar para trás quando se trata de ética e convivência em sociedade.

Precisamos resgatar princípios éticos e a aprender a conviver em sociedade, tornando o “mindfulness of others” uma regra, não exceção. Basta lembrar da tradição cristã, arraigada em nossa sociedade, e recuperar a regra de ouro: “Todas as coisas, portanto, que quereis que os homens vos façam, vós também tendes de fazer do mesmo modo a eles” (Mateus 7:12). O ponto importante é que “mindfulness of others” pode e deve ser aprendido. Educação é a chave, mas não basta ser apenas formal. Reconstruir nosso mapa mental, a maneira como nos vemos e vemos os outros em sociedade, exigirá decisões e aprendizados que começam e acontecem na família, na escola, no trabalho, no trânsito.

**Professor de Economia da UFPE. 



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