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Observatório Econômico Como fica o Nordeste?

Por: Fernando Dias - Diario de Pernambuco

Publicado em: 29/10/2018 11:44 Atualizado em:

Findas as eleições a realidade retorna e os problemas do dia a dia estão de volta a nossa rotina, por mais que bata aquela vontade de debater no WhatsApp até acabar a bateria ou ser vencido pelo sono. Aqui no Nordeste não tem mistério, pobreza e baixa produtividade associadas a alto desemprego e terrível distribuição de renda tornam nossa Região a mais singular do país. Vale sempre lembrar que o Brasil nasceu aqui e que já tivemos o maior negócio agroindustrial do mundo (o açúcar), porém hoje estamos em grande parte mais para pobreza africana que para desenvolvimento europeu.

O que aconteceu? O célebre economista Celso Furtado ofereceu, há décadas, um excelente apanhado dos que nos fez perder qualquer protagonismo econômico e chegou inclusive a levantar uma série de ações para recuperá-lo, o que neste particular não foi bem-sucedido apesar de décadas de tentativas apaixonadas de seguidores de seu pensamento. Em verdade, meio século após o GTDN e a SUDENE, o Nordeste não deu um passo em relação a convergência de renda com o Sudeste ou em elevar sua participação no PIB nacional.

Nada mudou das descrições de Furtado para cá? Na verdade, mudou, não sei se para melhor. Furtado descreve um Nordeste dividido entre uma área de agricultura comercial e outra de agropecuária de subsistência, onde esta última consegue a façanha de manter sua manutenção através de sua expansão territorial enquanto mantém inalteradas as condições que a impedem de crescer economicamente. Esta parte hoje ainda existe, mas foi em grande parte substituída pela dependência do Estado como mantenedor destas economias.

Os dados do Produto Interno dos Municípios (IBGE, 2015) sugerem isto de forma muito clara. A primeira informação que temos é que o PIB per capita do Nordeste não só é o menor do país, como é 18% menor que o da Região Norte. Ainda mais impressionante, em 84% dos municípios nordestinos a principal atividade é “administração, defesa, educação e saúde públicas e seguridade social”! Nestes municípios apenas esta atividade responde por 42% do PIB total, e o PIB per capita é em média 50% menor que a média da Região.

Então o quadro é esse, em 84% dos municípios do Nordeste o setor público é a principal atividade econômica, que responde por 42% do PIB em lugares onde o PIB per capita é metade que o da Região mais pobre do país. Para piorar, e sempre pode piorar, este quadro é estável mesmo quando se considera períodos de expansão da economia brasileira. O que fazer para lidar com esta situação, com os 26 milhões de brasileiros que moram nestes pequenos municípios?

As soluções até aqui apresentadas pouco mudaram o quadro que não para tornar estas populações ainda mais dependentes do setor público. Há os que defendem esta abordagem, ampliar a injeção de recursos na economia via programas sociais e rezar para que um mercado interno se desenvolva endogenamente. Há outras propostas na mesa, como tentar dinamizar vantagens competitivas que possam ser encontradas nestas localidades, operando aqui do lado da oferta, ou mesmo incentivar o movimento das empresas para estas localidades através de ação de incentivos fiscais vindos da União, dos estados e dos próprios municípios. Tudo isto está em curso em maior ou menor grau, e há de se reconhecer que não está dando nada certo e isto está evidenciado décadas a fio.

Alguma luz? Não se depender do que foi proposto nesta campanha, ou mais precisamente, pelo fato que nada foi proposto. Não há, em verdade, qualquer planejamento ou perspectiva para a economia do Nordeste, notadamente da perspectiva espacial, que não ações pontuais advindas da dinâmica de seu mercado interno e da boa vontade eventual de seus governantes. Talvez seja hora de pensar em algo como um GTDN 2.0 em uma versão mais mercado e menos Estado.

*Professor do Departamento de Economia da UFPE