Diario de Pernambuco
Busca
Observatório Econômico De volta ao passado Com o governo prometendo subsídios ao diesel, tabelando preços e convocando a população para fiscalizar, parece que voltamos aos anos 80!

Por: Marcelo Eduardo Alves da Silva

Publicado em: 11/06/2018 08:00 Atualizado em: 14/06/2018 11:11

Na minha última coluna, destaquei que o governo tinha avançado em diversas pautas econômicas, numa clara reversão da prática observada no governo anterior. O fato é que, nas últimas semanas, após a crise provocada pela greve dos caminhoneiros, o governo sucumbiu a práticas heterodoxas, num retorno a um período tenebroso de nossa história recente.
 
Primeiramente, o governo parece não ter clareza quanto à política de reajustes de preços dos combustíveis. A recente prática da Petrobrás de definir preços de acordo com a cotação internacional dos preços do petróleo (e do dólar) é a maneira correta e deveria ser mantida, apesar das oposições que tem recebido. Isto porque uma empresa, ao definir preços, deve olhar não apenas os custos de produção, mas também os custos de oportunidade.  

Imagine um produtor de uva do Vale do São Francisco, que decida definir preços baseado apenas no custo de produção. Se o preço da uva sobe, talvez pela maior demanda pelo produto, ele não subiria o preço (já que os custos de produção não mudaram), claramente deixando de ganhar receita adicional (custo de oportunidade). Não faz sentido para o produtor de uva, tampouco para a Petrobrás.

Além disso, parte dos custos da empresa são definidos em dólar e, portanto, se a receita não acompanhar a cotação da moeda, a empresa terá dificuldades de manter sua capacidade de produção e de realizar novos investimentos. Isto prejudicará a empresa e o resto da economia, que deixará de se beneficiar com o aumento da produção, do emprego e dos impostos gerados pela companhia.

O que poderíamos questionar é a razão dos preços domésticos serem mais altos. Parte da explicação é a estrutura de mercado. A Petrobrás concentra praticamente sozinha o refino no país, além disso algumas poucas distribuidoras concentram a distribuição dos derivados de petróleo. Ademais, a Agência Nacional do Petróleo não permite que postos comprem combustíveis de distribuidoras que não sejam aquelas a que o posto está afiliado. Isto reduz a competição e eleva os preços. Reavaliar a estrutura de mercado e a regulação é fundamental. 

Outro motivo é o peso dos impostos. Ninguém tem dúvidas que o governo brasileiro tem a mão pesada quando se trata de impostos, mas a despeito do objetivo de arrecadação, a teoria econômica sugere que impor impostos sobre fontes não-renováveis (e poluentes) de energia é algo positivo.

Na verdade, em trabalho desenvolvido com Yuri Lima e Silva, doutorando do PIMES/UFPE, mostramos que a combinação ótima, do ponto de vista fiscal e ambiental, é a imposição de impostos sobre combustíveis fósseis em conjunto com subsídios sobre fontes renováveis (e limpas) de energia. Tal combinação diminuiria o uso de fontes poluentes e elevaria o uso de fontes menos poluentes, tendo claros impactos positivos sobre o meio-ambiente e o bem-estar da população.

Conceder subsídios para combustíveis fósseis vai na contramão do que sugere a teoria econômica, a prática internacional e acabará inviabilizando a produção de energia de fontes renováveis.  Se há algo que precisamos aprender com essa “crise” é olhar para o passado, quando desenvolvemos tecnologia que hoje nos permite utilizar o etanol como substituto da gasolina e, em breve, nos permitirá usar o biodiesel em larga escala. Ademais, depender menos das rodovias para o transporte de mercadorias ajudaria. Há outras trapalhadas como a reedição de preços mínimos para o frete. Isto prejudicará os demais setores e consumidores.

Por fim, cabe destacar que, em se mantendo a política de reajustes, a redução dos impostos terá impacto temporário, basta o preço do petróleo subir e/ou o real perder valor frente ao dólar. Por outro lado, se a política não for mantida, a pergunta é: quem pagará a conta? Certamente, eu e você, caro leitor, a quem o governo, talvez inspirado no dia dos namorados, chama carinhosamente de “tesouro nacional”.