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Um ícone de temperamento difícil: confira a crítica da nova biografia de Fagner

Publicado em: 15/07/2019 15:41

Foto: Divulgação
O temperamento de Fagner, um dos maiores artistas da música popular brasileira, costuma ser descrito por muitos como autoconfiante e, nas críticas mais ácidas, narcisista. Na biografia Raimundo Fagner: Quem me levará sou eu (Editora Agir), escrita por Regina Echeverria, as polêmicas do homem público não se sobrepõe ao sucesso do músico, cantor e compositor. A quantidade de vezes na qual foi eleito como o melhor cantor do ano por instituições diversas, os shows com recorde de público, as inúmeras parcerias c om mú s ic o s nacionais e internacionais, as viagens, o sucesso no exterior, as canções nas trilhas sonoras de novelas e tudo o que mais possa salientar o tamanho da sua obra: está tudo lá. Em texto, depoimentos e muitas, muitas fotos. Um relicário para os fãs.

Echeverria é responsável por algumas das mais ricas descrições da vida de astros como Elis Regina (Furacão Elis, 1985) e Cazuza (Só as mães são felizes, 1997, a partir de depoimentos de Lucinha Araújo, mãe do cantor). Já na nota editorial não assinada que inicia o livro de Fagner, parece ser fornecida ao leitor uma espécie de advertência, embora sutil. “Perfeccionista, quis (Fagner) rever cada parágrafo, acrescentar detalhes, explicar melhor uma ou outra passagem, dar créditos a todos que fizeram ou fazem parte de sua vida e carreira”. É possível presumir o crivo editorial do artista até na ordem da narrativa, quando ela começa por algo que destoa da ordem linear do restante da obra: a descoberta da paternidade, em agosto de 2016, aos 57 anos, do filho Bruno, 32.

A partir daí, o livro segue com as descrições dos primeiros anos em Fortaleza, mas, principalmente, no local onde passou a infância e costuma dizer que nasceu: Orós, a 345 km da capital cearense. Lá, é descrita sua vida em família com os pais, o imigrante libanês Youssef Fares Haddad Lubous e Francisca Cândido, além dos irmãos. A ascendência, inclusive, é descrita como parte integrante da mistura que faz do artista um “produto” regional e universal. Sua saída do estado natal e as incursões pelo restante do Brasil e exterior até atingir a fama também são detalhadas, inclusive com transcrição de cartas trocadas entre ele e a família. Das viagens, destaque para a boa receptividade na Espanha, que rendeu, inclusive, uma forte amizade com a cantora Mercedes Sosa.

A obra traz ainda sua íntima relação com o futebol e amizade com ídolos como Zico, Casagrande, Afonsinho, Rivelino, entre outros, e não se furta em falar das acusações de plágio que pesaram sobre ele. A autora narra, ainda, as principais contendas de Fagner com executivos de gravadoras e com artistas como Caetano Veloso e - a mais famosa delas - com o conterrâneo Belchior. Aqui, um adendo: o famoso episódio da briga entre eles é relatada de forma diferente da que Jotabê Medeiros apresenta em seu livro Apenas um rapaz latino-americano (2017), biografia póstuma do cantor da música que dá nome à publicação. Nesta, consta que ambos quase chegaram a se agredir munidos, ambos, de uma faca. Na versão de Echeverria, descrita a partir de relatos de terceiros, o biografado aparece como alguém que, basicamente, agiu em defesa própria e mesmo do oponente.

O livro traz alguns detalhes sobre algo que ainda marca a notoriedade de Fagner: seu envolvimento com a política. Desde o apoio a nomes como Tasso Jereissati e Ciro Gomes até a participação na Diretas Já e uma crítica, em 2004, ao então presidente Lula. Mesmo recém-lançada, a obra não traz informações sobre o apoio do cantor ao presidente Jair Bolsonaro e suas críticas recentes ao mesmo.

A obra é rica de descrições e análises sobre Fagner por parte dos seus variados amigos. De Chico Buarque (embora comente-se, atualmente, que a amizade ficou no passado) a Zeca Baleiro (também parceiro musical), passando por Amelinha, Ronaldo Bôscoli, Nara Leão e a falecida Marília Pera. Todos ressaltando a personalidade forte, por vezes grosseira, mas ressaltando o caráter e a generosidade do artista como contraponto a isso. É da autora, entretanto, na página de número 156, uma frase que parece caber como um resumo destas descrições: “Que Fagner não é homem de temperamento fácil, já se percebeu. Sabe ser agradável no trato social, amigo querido de muita gente, artista idolatrado por plateias que morrem de amores por ele e por seu trabalho, mas ai de quem pisar no seu calo! Coitado de quem for verificar se é curto, como dizem, seu pavio.” A autora conclui a obra fazendo um relato da vida pacata atualmente adotada pelo seu biografado, seus hábitos e costumes. Dedica, ainda, um capítulo inteiro à Fundação Social Raimundo Fagner, organização não governamental criada pelo autor em abril de 2000, em Orós, com o objetivo de investir na educação complementar para o desenvolvimento de 200 crianças e adolescentes.
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