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Festival de Inverno

FIG 2019: Homenagens a Beth Carvalho e representatividade feminina marcam noite da sexta

Publicado em: 27/07/2019 14:04 | Atualizado em: 27/07/2019 18:52

Fotos: Fundarpe
O samba brilhou na penúltima noite do Festival de Inverno de Garanhuns, nesta sexta-feira (26). O Palco Dominguinhos, com shows realizados a partir 20h, contou com os pernambucanos Belo Xis, Karyna Spinelli (com show dedicado a mulheres da cultura popular), Carla Rio (com espetáculo especial em homenagem a Beth Carvalho) e Gerlane Lops. Alcione, a atração mais aguardada da noite, revelou que irá ganhar título de cidadã pernambucana pela Assembléia Legislativa de Pernambuco em outubro. Por volta das 01h, quando a maranhense começou a cantar, o principal polo estava tão lotado que foi preciso fechar as grades de entrada.

Foto: Fundarpe

O veterano Belo Xis abriu a programação com um show “diferente”, como explicou durante coletiva. Começou com canções de Jackson do Pandeiro, homenageou João Gilberto (falecido em julho) e Beth Carvalho (falecida em abril), mas não deixou de cantar Zeca Pagodinho e Martinho da Vila.

Em sua quinta vez no FIG, Karynna Spinelli realizou o primeiro show em Pernambuco após um período de três meses longe dos palcos. Neste ano, a sambista foi diagnosticada com endometriose profunda “Passei por esse momento difícil, sem saber quando iria voltar a trabalhar, então é uma felicidade estar aqui. Ainda mais representando as mulheres, em uma noite composta por 80% de atrações femininas”, disse, durante coletiva antes da apresentação. A cantora convidou a olindense Helena Cristina para participações e back vocal. “Estou dividindo o meu privilégio de mulher branca. Dentro desse contexto dos espetáculos públicos, ainda são poucas as pessoas negras nos palcos principais. Precisamos colocar os verdadeiros criadores dessa cultura em foco. Eu trago isso sempre e hoje é com Helena, negra e talentosa”. 

Foto: Fundarpe


Karyna apresentou o show Odile, permeado de canções autorais de samba e de terreiro, com referências de manifestações afrobrasileiras como a jurema. Entre os sucessos, Eu Estou Aqui e Sonho meu, ambas de Dona Ivone Lara, Minha Ciranda, de Lia de Itamaracá, e Triste, Louca e Má, da banda Francisco El Hombre.

A tônica da sororidade feminina esteve presente em toda a apresentação. Em determinado momento, mandou “um abraço muito forte” para a família de Mayara dos Santos, jovem que foi atacada com ácido corrosivo pelo ex-namorado e morreu nesta sexta-feira (26), após semanas internada. “Parem de nos matar, de nos estuprar. Viva Mayara, viva Marielle”, disse a intérprete, comovendo o público. Outro momento de protesto teve como alvo o presidente da república Jair Bolsonaro. “Você nos chamou de Paraíba, pior é se tivesse nos chamado de você. Não tenho medo de você. Queria que você falasse comigo aqui, como homem, e não como macho”, disse. “Lutaremos com a cabeça erguida, o peito aberto, com auxilio da história, da cultura e da educação”. 

Pela primeira vez no festival por ter carreira recente no samba, a pernambucana Carla Rio fez um show inteiramente dedicado à carioca Beth Carvalho, falecida em abril de 2019. O espetáculo foi dirigido e roteirizado por Alceu Maia, que tocou muitos anos com Beth nos palcos. O repertório fez uma viagem cronológica na carreira de Carvalho, começando por Andança, música que despontou a carioca no Festival Internacional da Canção em 1968. Também passeou por Camarão Que Não Nada a Onda Leva, gravada em parceria com Zeca Pagodinho, Vou Festejar e Coisinha do Pai.

Todo vermelho, o figurino de Carla lembrava o tom flamejante das madeixas de Beth. Imagens da homenageada apareciam no telão, intercalas por fotos de Rio e Maia. O show foi originalmente idealizado com 1h20 de duração, mas encurtado em 40 minutos para se adaptar ao tempo do festival. “Ao escolher Beth Carvalho, tive em mente duas coisas: a excelente sambista que ela foi e o símbolo de resistência que ainda é. Essa é a mensagem que deixo para as mulheres. Nunca desistam” disse Carla, em coletiva de imprensa realizada após seu primeiro show no FIG. “O FIG é democrático, abre espaço para novos talentos. Acaba sendo uma das melhores vitrines, pois traz pessoas do país todos”.

Foto: Fundarpe


Veterana do samba pernambucano, Gerlane Lops fez uma apresentação energética, recheada de hits. A Praça Dominguinhos estava lotada, bem mais que no primeiro final de semana do festival. Além de canções autorais como Da Rosa e Seu Jeito de Amar, fez releituras de Verdade, de Zeca Pagodinho, Reconvexo, de Maria Bethânia, e Fulminante, de Mumunzinho.

Gerlane foi a única artista a trocar de figurino na noite, vestindo uma grande saia vermelha. Nesse momento, fez uma homenagem ao Mestre Dominguinhos, natural de Garanhuns. Em noite dominada por samba, cantou Eu Só Quero um Xódo acompanhada pelo jovem sanfoneiro Felipe Costa. Também arriscou uma versão forrozeiro da autoral O Samba Chegou. O final foi apoteótico, com grupo frenético de tamborins. A homenagem a Beth Carvalho ficou com Vou Festejar, enquanto o clássico O que é, O que é? De Gonzaguinha, encerrou o repertório.

Foto: Fundarpe


Quando Alcione começou a cantar, as grades de entrada da Praça Dominguinhos foram fechadas. O polo estava lotado. “O que esses pernambucanos querem comigo? Me larga, gente”, brincou a cantora, que faz frequentemente faz shows em uma casa de eventos na Zona Sul do Recife. No repertório, um sucesso seguido por outro, exatamente o que o público queria: Além da Cama, Estranha Loucura, Sufoco, Faz uma Loucura Por Mim.

Já com 72 anos, a cantora dosou momentos em pé e outros sentada. Para descer as escadas e se aproximar do público, tinha auxílio dos seguranças. Apesar de mais frágil pela idade, sua voz marcante continua a mesma. Durante os discursos, não fez nenhuma menção direta presidente da república - o público esperava alguma manifestação após o vídeo que ela divulgou nas redes sociais criticando Bolsonaro pela fala em relação aos nordestinos -, mas não deixou de soltar um “viva o Nordeste”.

Uma surpresa foi a entrada da vice-governadora Luciana Santos no palco. A política anunciou que, em outubro, a Assembleia Legislativa de Pernambuco irá conceder o título de cidadã pernambucana para Alcione. A cantora relatou que, ainda na sexta-feira, foi convidada por Luciana para participar de um debate sobre violência contra a mulher. A maranhense, no entanto, não conseguiu participar porque o elevador do edifício teve problemas técnicos, mas agradeceu e proferiu um discurso sobre o tema. “Esse país tem que dar um jeito nisso, porque mulher está morrendo que nem mosca nesse país. E ainda tem gente que fale que é uma fatalidade, mas não é”.

Assim como as outras atrações, a “Marrom” também homenageou Beth Carvalho cantando As Rosas Não Falam. Aproveitou o ensejo para executar Loba, um de seus maiores hits. Finalizou com Do Jeito que A Vida Quer, de Benito di Paula, e o hino Não Deixe o Samba Morrer. E, a depender do público e dos talentosos artistas que passaram no palco do FIG na noite da sexta, o ritmo terá vida longa.
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