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'É um álbum de guerrilha', diz Baco Exu do Blues sobre Bluesman. Confira a entrevista

Segundo disco da carreira do rapper baiano soa mais bem produzido, ousado e experimentalista, mas continua a apostar no potencial das lovesongs

Diogo Moncorvo, de 22 anos, surfa no prestígio alcançado após primeiro disco.

O blues é mais do que um gênero musical para Diogo Moncorvo. Não é por coincidência que ele adotou o ritmo em seu nome artístico de rapper: Baco Exu do Blues. Para o baiano, essa foi a primeira manifestação cultural a “formar negros ricos e livres”, como ele versa na abertura de seu novo álbum, Bluesman, lançado no dia 16 de novembro para fazer ode ao ritmo originário das lavouras do extremo sul estadunidense. “Quis fazer algo que tocasse as pessoas como o blues toca, mesmo sem saber manusear os instrumentos. É algo mais nesse sentido de como os gêneros tocam os ouvintes”, diz o rapper de 22 anos, em entrevista ao Viver.

Após uma entrada triunfal com um solo de guitarra do Muddy Water, Baco dispara as estrofes que servem como um “manifesto” para o projeto: “Tudo que quando era preto era do demônio, e depois virou branco foi aceito, eu vou chamar de blues”. Nessa perspectiva, “o samba é blues, o rock é blues, o jazz é blues, o funk é blues”, e até mesmo o próprio Baco também é. Foi no ano passado que ele lançou o aclamado disco de estreia, Esú, e foi alçado ao topo do efervescente rap nacional ao mesclar o ritmo com matrizes sonoras da MPB. Baco Exu ganhou ouvintes fora do nicho hip hop, teve seu nome nas principais listas de melhores álbuns de 2017 e agora goza de prestígio no cenário musical.

Capa de Bluesman.

A novidade é composta por nove faixas de curta duração e que não contam com refrões tão pegajosos ou hits mais apelativos do álbum anterior, como Te amo disgraça - vencedora da categoria Canção do Ano no Prêmio Multishow 2018. Mesmo assim, soa mais bem produzido, ousado e experimentalista, apesar de continuar a apostar no potencial abrangente das lovesongs (termo usado para se referir a faixas românticas no rap). Ignorando as críticas que recebe por apelar para matrizes sonoras mais orgânicas, Baco parece estar interessado em fazer o que bem entender.

"A ideia era fazer algo diferente de tudo o que já tivesse saído", explica o rapper, que assina a produção executiva do trabalho. "Os timbres são diferentes, as letras têm outros sentimentos, tudo soa de uma forma não convencional. Para isso, houve todo um laboratório musical com os produtores DKVPZ, JLZ e Portugal. Procuramos novos ritmos e passamos a brincar com eles”, diz. "As faixas são menores porque eu não me prolongo quando sinto que não preciso. É um disco urgente".

Essa característica de "irregularidade" proposital já fica nítida na segunda faixa do disco, que sai do flow ameaçador para a sofrência de Queima minha pele, uma parceria com a voz e o piano de Tim Bernardes, integrante da banda O Terno. "Procurei por uma voz que tivesse dor. E, ouvindo o último disco de Tim, entendi que ele era a pessoa perfeita para passar o sentimento que é estar em um relacionamento", conta Baco.


O egocentrismo, marca de Kanye que reverbera no baiano, também está presente na impactante Minotauro de Borges. "Museus estão à procura de mármore negro pra fazer uma estátua minha", diz um dos versos. Me desculpa Jay-Z, que também exalta outro artista gringo, aparece como um dos possíveis hits do álbum. Conta com a participação da cantora 1LUM3 (com vocais femininos que remete os ouvintes a Te amo disgraça), trazendo uma confusão de sentimentos do eu-lírico, característica que sempre acompanha o intérprete desde Esú.

A autoestima do povo negro e críticas ao racismo também não poderiam ficar de fora, estando em evidência em todas as faixas, algumas mais e outras menos. É algo que sempre esteve presente em Baco, apesar da ascensão de movimentos que negam existir desigualdades raciais no Brasil. “Se eu falasse que estou abordando o racismo por conta do momento político, estaria sendo oportunista”, admite Diogo. “Eu sou negro e isso sempre existiu para mim. Só que agora as pessoas vão começar a sentir com mais força, então espero que meu discurso nutra essas pessoas que são iguais a mim. Bluesman é um movimento. Foi tudo feito para a luta. É um álbum de guerrilha.”

Audiovisual
O disco também ganhou um curta-metragem que o artista chama de “interpretação audiovisual do álbum”. Disponível no YouTube, já com mais de 500 mil visualizações, o filme foi dirigido por Douglas Bernart e realizado em parceria entre o Coala Festival, a agência AKQA. Com direção de arte, interpretações e fotografia refinadas, a produção faz jus ao discurso e a sonoridade autêntica do Bluesman.

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