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Carnaval 2018: Baiana Xenia França será atração do Rec-Beat

Cantora lançou no final do ano passado o disco Xenia, que transita entre jazz, samba e rock

Publicado em: 22/01/2018 11:15 | Atualizado em: 22/01/2018 11:21

Artista, da banda Aláfia, se lançou em carreira solo. Foto: Tomás Arthuzzi/Divulgação


Xenia França é negra e canta, mas espera que em algum momento deixe de ser tratada como cantora negra e seja citada apenas como cantora. "Sim, eu sou negra e não vejo problema nisso, respiro minha ancestralidade e reverencio a minha cultura", afirma, após definir como separatista a classificação de cantora negra. "É a necessidade que a estrutura tem de separar, fazer você não se sentir parte", ressalta a artista, uma das atrações do Festival Rec-Beat, realizado de 10 a 13 de março, no Cais da Alfândega, Bairro do Recife.

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O recém-lançado Xenia (Canal 3, 13 faixas, R$ 24,90) é um disco sobre raízes, tanto na temática quanto na sonoridade. A representatividade, o feminino e outros tópicos estão presentes nas letras que exercitam a afirmação e exaltam força. Já a musicalidade transita pelo jazz, samba, rock e outros ritmos derivados do "tronco da diáspora africana", como a cantora define.

"O meu disco tem uma linguagem muito pop, atinge todas as pessoas", garante Xenia, integrante também da banda Aláfia, reforçando a importância de não restringir a militância a guetos. "O amor entre as pessoas precisa aumentar", diz, destacando que a falta de empatia é um dos grandes problemas em relação ao racismo. "Quem é privilegiado vive a situação do conforto. É muito difícil querer sair e dar espaço para o outro".
 
Entrevista Xenia França // cantora
 
Como foi que você decidiu se lançar a um trabalho solo?
Eu sempre quis ter um trabalho solo. Desde que me dispus a ser uma artista, cantava em bares com bandas, amigas, sempre tive vontade. Mas também sempre tive consciência da responsabilidade de que isso tinha, precisava ter repertório de vida, engrossar a casca, e me sentir a vontade para me expor. Acabou se tornando uma questão de tempo, de maturidade, e, na hora de fazer, saber exatamente o que queria.
 
É comum ver artistas negros com a profissão associada à cor, de maneira que raramente acontece com brancos. Ser eventualmente tratada como 'cantora negra', em lugar de simplesmente 'cantora', causa incômodo?
Na verdade, tem duas respostas para essa indagação. Existe esse separatismo, é a necessidade que a estrutura tem de separar, fazer você não se sentir parte. Não me incomoda, mas deveria me incomodar, por saber que isso é uma faceta do racismo. Mesmo que as pessoas não me rotulem como uma cantora negra, eu sou uma pessoa negra. Pensando em uma questão de posicionamento, serei por muito tempo uma cantora negra, espero que isso acabe. Sim, eu sou negra e não vejo problema nisso, respiro minha ancestralidade, eu reverencio a minha cultura e não tenho do que me envergonhar.

Seu álbum diz muito sobre ser negro e, especificamente, sobre ser mulher e negra. Era um tema inevitável?
Sim. A gente esta vivendo um momento de muitos questionamentos e problematizações. A presença do negro no Brasil já é a problematização da estrutura toda. A pessoa, o individuo africano, foi trazido à força, veio escravizado. Os desdobramentos dessa história estão longe de ser uma questão resolvida. Não há políticas publicas para reparação desse estrago, a cultura, a arte negra é uma ferramenta poderosa de combate ao racismo. Tudo que uma pessoa preta decide fazer acaba se tornando política. Quando a gente decide adentrar, a nossa arte acaba sendo política. Mesmo que tivesse falado de outro assunto, ainda seria vista como uma cantora negra. Acaba ganhando uma força e um holofote sobre isso.

Você acredita que o racismo vem perdendo força, que o negro tem mais espaço?
Eu acredito que não. Se for falar da nossa bolha artística, intelectual, já existia algum espaço. Mas na sociedade, como todo, até como estrutura, em educação, saúde, as pessoas pretas ainda não são tratadas com igualdade. Acabei de voltar da Bahia e aí eu vi muitas matérias sobre feminicídio. Por um lado, fiquei contente por a mídia locar falar sobre isso. Mas me assustou muito também. O índice de mortalidade da mulher negra aumentou 54% no ano passado. Falando sobre o racismo, a única coisa diferente que vejo hoje em dia é o negro se impondo mais. Chegou o momento de dizer: ‘Chega de esperar alguma medida, nos vamos, sim, nos posicionar’. Há um número cada vez maior de pessoas negras se autoafirmando.  

Ouça Xenia:


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