Nem todo campo de batalha é um espaço físico: alguns residem nas mentes e as lutas interiores fazem parte da miríade de conflitos que Sidney Rocha narra em Guerra de ninguém (Iluminuras, 118 páginas, R$ 40), mais recente trabalho do escritor cearense radicado no Recife. O lançamento é um dos destaques da programação da Semana do Livro de Pernambuco, realizada desta quarta-feira até domingo no Museu do Estado de Pernambuco (Avenida Rui Barbosa, 960, Graças).
Além de lançamentos literários, a programação do evento conta com oficinas, cursos e atividades para o público infantil. Estarão presentes escritores como Eugenia Zerbini, José Castello, Bernardo Kucinski e Elvira Vigna, que participam de palestras e debates. As atividades são gratuitas e ocorrem das 14h às 20h.
Sidney Rocha, que fará sessão de autógrafos no sábado, às 19h, dá alguns detalhes sobre o novo livro, que reúne 22 contos. Para ele, os embates internos vistos nos personagens da obra têm origem no mundo exterior. São frutos diretos ou indiretos de algo tangível, a violência, que, segundo o autor, é algo mais unânime do que o próprio amor. “Não só é mais universal, é também a outra cara do amor. O nascer do mundo foi uma explosão. O parto é violento e doloroso. Só o não-viver, ou seja, o não ter nascido, é apaziguado, sem choques, neutro”, opina.
E o resultado da brutalidade que permeia as histórias do livro é justamente o fim da vida dos personagens. Nas palavras de Sidney Rocha, “a morte é o único assunto da literatura”. E é disso que se trata Guerra de ninguém. As mortes vistas no livro são diversas, vão do assassinato ao suicídio, mas trazem um aspecto em comum: são retratadas sem o pesar habitual, algo corriqueiro, quase banal. “É intencional, deliberado, como o absurdo também é em Sartre, Camus e Beckett”, afirma o escritor.
O volume é a último de uma trilogia de livros de contos iniciada em 2009 com Matriuska (Iluminuras, 96 páginas, R$ 40) e continuada em O destino das metáforas (Iluminuras, 116 páginas, R$ 40), de 2011. “Há um elo comum entre os três livros. Não um elo perdido, um elo de perdição. Dos personagens enredados no amor, na vida e na morte que, assim, juntos, ou separados, sejam sempre um só”, afirma Rocha. O autor aponta, ainda, que o primeiro é mais centrado em figuras femininas, enquanto o segundo é “misto, familiar” e, o terceiro, masculino.
DUAS PERGUNTAS PARA // SIDNEY ROCHA
Algum acontecimento externo influenciou na escolha da temática do livro?
De modo consciente, não. Mas é impossível que acontecimentos externos — se a expressão se refere ao aqui e agora — não influenciem na composição de uma história, por mais interna ou internalizada que ela queira ser.
Por que a guerra ainda fascina, para o bem ou para o mal?
A guerra é a razão ou desrazão de ser do gênero humano. O único em que conseguimos imitar com perfeição a natureza. A guerra é bela como um incêndio, e feia como um pântano. Uma síntese do humano em suas baixezas e glórias - estas últimas sempre ilusórias, é claro.
A guerra vista nos textos reflete mais batalhas de outra época, do confronto direto, diferente de táticas atuais, como o uso de drones, bombardeios etc. A violência está perdendo rosto?
O corpo a corpo só é possível numa sociedade ainda movida pela ideia de coragem e de honra. Estamos diante da covardia química, biológica, da covardia midiática. Mas não, a violência não está perdendo o rosto, pelo contrário: a cada dia ganha novos rostos, máscaras e disfarces.
DESTAQUES DA PROGRAMAÇÃO
Quarta-feira (30)
15h - O crítico e escritor José Castello abre o evento com o painel
Narrativas possíveis do presente, com debate sobre O processo, de
Franz Kafka, e os paralelos com acontecimentos atuais e a
judicialização da política
Quinta-feira (1º)
16h - Sobre como pensar o jornalismo em 2016 é o tema de conversa
entre a jornalista Eliane Brum, colunista do El País, com o curador da
Semana do Livro, Schneider Carpeggiani
19h - Lançamento do livro A história incompleta de Brenda e de outras
mulheres, de Chico Ludermir. Na obra, o fotógrafo e jornalista conta,
a partir de fotos e textos, a vida 11 mulheres trans e travestis
recifenses
Sexta-feira (2)
17h30 - O escritor Raimundo Carrero recita trechos de Pérolas porcas e
comenta o processo de produção do novo romance, que tem lançamento
programado para 2017
Sábado (3)
16h - O quadrinista André Dahmer (O Globo/Folha de S.Paulo)
participa de debate com a jornalista Carol Almeida sobre o uso dos
quadrinhos como ferramenta de crítica social.
19h - O poeta Miró lança e autografa 20 para pensar um pouco,
coletânea de textos e reflexões curtas reunidas durante internação em
um centro de reabilitação para tratamento da dependência alcoólica
Domingo (4)
9h - Wellington Melo, do selo editorial Mariposa Cartonera, ministra
oficina com técnicas de produção de livros artesanais feitos com capas
de papelão
18h - A blogueira e escritora Mirela Paes conversa sobre literatura e
cultura digital, tema do próximo livro, com lançamento previsto para
2017