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Daniela Mercury critica reserva de mercado pernambucana como forma de preservar tradição: "Tem que achar outra forma"

Cantora prepar disco de inéditas e lança turne mundial "Baile da Rainha Má" com show no Recife

"A rainha má chega para brincar com as maldições. No dia do horror, vou falar como todos nós somos maravilhosos", brinca Daniela Mercury, que estreia turnê no Recife. Foto: Divulgação/Comunnik

Toda cheia de si e com muita energia, Daniela Mercury encarna uma nova personagem: a "rainha má". Com canções que defendem as mulheres, falam de religião e da universalidade da música, a baiana aproveita o momento para lançar o repertório autoral com faixas do disco Vinil virtual, e estreia a turnê mundial Baile da Rainha má, neste sábado (31), a partir das 22h, no Clube Internacional do Recife (Madalena).

Confira os shows no roteiro do Divirta-se

[SAIBAMAIS]A festa temática celebra o Dia das Bruxas na capital pernambucana. O momento ideal para Daniela soltar maldições, brincar com o que é certo e errado, desafiar o bem e o mal. “Sou a rainha antropofágica do axé. Cuidado comigo! Apreendo tudo dos outros, engulo o mundo e vou levando para o povo. Como um caixeiro viajante. Sou mercadora de sons e sonhos, em movimento”, versa a baiana de 50 anos em entrevista ao Viver. 

A partir da personagem, Daniela demonstra a mulher transgressora e subversiva, que não respeita padrões sexuais e culturais. “Essa é a Rita Lee que eu queria ser. Ela é quase Maria Bonita. São todas as rainhas más do planeta numa só. E as mulheres quando resolvem ser más, elas são muito piores. Mulher não brinca”, comenta.

Recentemente, Daniela finalizou o disco Vinil virtual, o 12º da carreira, que deve chegar às lojas em novembro. A turnê é inspirada na canção Rainha do Axé (Rainha má), lançada no carnaval deste ano. “A rainha má chega para brincar com as maldições. No dia do horror, vou falar como todos nós somos maravilhosos”, se diverte. O show é permeado por elementos lúdicos, onde a artista explora as culturas afro e indígena em figurinos, coreografias e sonoridade. No setlist, Dani inclui a Praieira, de Chico Science, em versão samba reggae, e Sou de qualquer lugar, de Lenine, além de clássicos consagrados na sua voz. Composto por 15 faixas autorais, Vinil virtual ainda traz homenagens a companheira Malu nas músicas Alegria e lamento e Maria Casaria.

Serviço

Baile da Rainha Má

Com Daniela Mercury e DJs Alex Bloon, Camila Cortez e Danic

Quando: Sábado (31), às 22h

Onde: Clube Internacional do Recife (Rua Benfica, 505, Madalena).

Ingressos: R$ 90 (open bar de cerveja)

Informações: 3224-9583

Entrevista // Daniela Mercury

Como são as canções do novo disco Vinil virtual?

É um disco artístico e divino, impregnado de ritmo. Costumo enganar as pessoas que pensam que minhas músicas são alegres. Meu axé é muito existencialista, denso, profundo, sério e muitas vezes lamentoso. O disco traz metaforas e poesias, minha tradução musical para inquietações pessoais e como cidadã. Rainha do Axé é inspirada em Gil e Caetano. Em Riso de Deus faço homenagem ao Rio de Janeiro. Para São Paulo fiz São Paulistanos, que fala sobre a diversidade. E muitas outras.

Nos últimos anos na sua carreira, houve uma aproximação com o público gay. Como isso aconteceu?

Foi uma percepção que se deu a partir do meu casamento com Malu. Mas isso sempre existiu. Nunca perguntei ao público com quem eles transam. Não fiz uma pesquisa de mercado para saber a opção sexual de cada um. Acho isso uma loucura e muito perigoso. Qualquer pessoa, de qualquer cor, raça, nacionalidade e credo é bem-vinda no meu show. Não entendo isso de ficar falando de público gay e não-gay.

A partir da repercussão de comentários ofensivos a uma participante do MasterChef Jr, o tema assédio sexual contra crianças passou a ser mais debatido nas redes sociais. Qual sua opinião sobre o assunto?

Mais do que tudo, é uma coisa da cultura machista, que não entende o mundo que vive. Ignorância gera muita violência. A mulher brasileira é muito violentada. Metade delas teve sua primeira relação de maneira violenta. As pessoas se expressam nas redes sociais como fazem na vida. A gente só faz enxergar ali de maneira ampliada. Num pais de tanto machismo, tão atrasado em relação ao resto do mundo, nós estamos apenas tendando sobreviver. Não me assusta essas pessoas paquerando crianças.

Você já sofreu algum assédio quando criança?

Todas as mulheres se sentem assediadas nos ônibus. Andei muito de ônibus quando adolescente e ficava enlouquecida. Tive que brigar e me sentia com muito medo. A mulher é vitima do medo. E viver com medo é uma sensação horrorosa. Estamos mais sujeitas à violência. Acompanhei, como embaixadora da Unicef, campanhas contra exploração sexual de crianças e adolescentes. Nesses casos, a denúncia ainda é falha. Muitas sofrem com violência sexual dentro de casa, praticada por membro da família. Há 20 anos como embaixadora sou bastante ciente de que vivemos em um pais extremamente violento. É de indignar, mas ainda temos sérios problemas ao respeito à mulher e à criança.

Muitos artistas pernambucanos defendem a exclusividade de artistas locais na escalação para festividades como o Carnaval e São João. O que acha disso?

Somos impregnados uns dos outros. As fronteiras que Recife está fazendo, gera fechamentos culturais para Pernambuco que não são saudáveis. A manuntenção da tradição não impede o diálogo com outras culturas. Os visitantes também absorvem. Sou impregnada de frevo, forró, maracatu... O que faço com isso? Se não fosse a do Recife, talvez o axé nem existisse. O galope e frevo são as bases do Axé. Essas segregações são periogosas. Elas são equivalentes a separações de raça e cor. A gente vive no mundo para se respeitar e celebrar. Para exaltar nossas origens e tradições e valorizar o que temos de melhor. Mas também para dialogar, acolher e receber. Se todo mundo se fechar para receber música de outros lugares, seria um caos. Acho que é preciso encontrar outra forma de manter a tradição, sem perder o diálogo cultural. O Brasil é o país das inclusões, não das exclusões. O Recife está precisando fazer um carnaval mais diverso. Deixar algum orixá de outro terreiro entrar. Incluam a gente, digo isso com muito carinho e fofura.

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