A concisão está para o conto assim como o conflito em prosa está para o romance. Em poucas páginas, conta-se uma história com clímax único e número reduzido de personagens. A leitura desse gênero, geralmente mais fluida, serve como porta de entrada à obra de romancistas com trabalhos mais extensos.
[SAIBAMAIS] Escuridão total sem estrelas, lançado no mês passado, é cartão de visita para a literatura de horror de Stephen King, consagrado por romances como It - A coisa e O iluminado. Já o estrangeiro Trigger Warning (ainda sem tradução para o português, mas com lançamento previsto no Brasil para o segundo semestre), reúne pequenos enredos de Neil Gaiman, autor de Sandman e Deuses americanos. O paulista Ricardo Lísias, premiado com o romance O céu dos suicidas, apresenta seus contos este ano em Concentração e outros contos. E o poeta pernambucano Everardo Norões aderiu à tendência em 2014, com Entre moscas, agraciado com o prêmio Portugal Telecom em dezembro passado.
Lourenço Mutarelli, Luiz Ruffato e José Rezende Júnior são exemplos de escritores brasileiros que Lourival Holanda cita como adeptos da literatura em contos. O último dos três lançou, inclusive, título inspirado nos microcontos que publicava no Twitter, Estórias mínimas. “Não há menos enredo em menos caracteres”, diz o pesquisador da UFPE. E quanto à substituição definitiva dos romances pelos contos, é categórico: “Essa tendência não anula obras como as de Joyce, Tolstoi ou Dostoiévski. Mas ter escritores de romances extensos se aventurando nos contos é reflexo do ritmo de vida moderno, mais imediatista, frenético.”
Na mesma esteira, autores célebres como Rubem Fonseca (com Histórias curtas) e José Eduardo Agualusa (com O Livro dos Camaleões) lançam este ano coletâneas de contos inéditos, enquanto Robert W. Chambers tem O Rei de amarelo, originalmente publicado em 1895, relançado no mercado pela Editora Intrínseca.
>> OPINIÕES
O Viver convidou Thiago Corrêa, crítico literário pernambucano, e Lourival Holanda, pesquisador e professor do departamento de Letras da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) para comentar o assunto.
“Essa resistência era mais comum há duas gerações. Hoje, os contos são bem aceitos. Alguns selos preferem romances porque os consideram mais rentáveis comercialmente. Mas o leitor tem reforçado a tendência dos contos, mais concisos. O público contemporâneo se interessa pela temática, pela forma como o texto é escrito, seja curto ou extenso.”
Lourival Holanda, professor e pesquisador
“Em linhas gerais, os contos costumavam ser os patinhos feios das editoras, ‘perdendo’ apenas para os poemas. Enfrenta-se, ainda, alguma resistência. Mas contos, além de objetivos, são úteis ao público, que tem a chance de conhecer mais da bagagem, do repertório de cada escritor. Isso porque cada conto pode desenvolver uma temática diferente, tornando um livro de contos mais abrangente e versátil.”
Thiago Corrêa, crítico literário
>> PARA LER
Escuridão total sem estrelas, de Stephen King
392 páginas, R$ 44,90
Histórias curtas, de Rubem Fonseca
160 páginas, R$ 34,90
O Livro dos camaleões, de José Eduardo Agualusa
120 páginas, R$ 48,95
O Rei de amarelo, de Robert W. Chambers
256 páginas, R$ 24,90
Concentração e outros contos, de Ricardo Lísias
272 páginas, R$ 39,90
Entre moscas, de Everardo Norões
180 páginas, R$ 37,00
A verdade é uma caverna nas montanhas negras, de Neil Gaiman
80 páginas, R$ 34,90
Coisas frágeis, de Neil Gaiman
205 páginas, R$ 49