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Diogo Nogueira lança disco com críticas a práticas religiosas e em defesa das mulheres

Músico divulgou novo trabalho durante roda de samba no Rio de Janeiro

Diogo cantou clássicos do samba e algumas novidades do disco. Foto: Anderson Borde/Divulgação

Rio de Janeiro - O sambista carioca Diogo Nogueira lançou o oitavo disco da carreira, Porta-voz da alegria (Universal, R$ 21), nesta segunda-feira (08), em festa para convidados no Lapa 40º, no boêmio bairro carioca. Em clima de descontração e improviso, ele cantou novidades, sucessos da carreira de oito anos e clássicos do samba, ao lado de amigos como Rodrigo Leite, Paulo César Feital e Serginho Meriti, autores de faixas do álbum, Bruno Cardoso, do Sorriso Maroto, o produtor, e Lu Carvalho.

[SAIBAMAIS] Porta-voz da alegria é um álbum sobre a leveza, com letras de agradecimento, várias românticas – algumas sobre desamores, mas sem melancolia – e uma pitada de crítica social e discussão sobre tolerância e respeito ao próximo e às mulheres. "As mulheres venceram barreiras, hoje nós temos líderes mundiais no poder, que são mulheres, que fazem a diferença, lutam, brigam, como o homem. Elas merecem respeito", afirma.

"Clareia a nossa visão/ Que a intolerância maquia/ Criança virando o carvão/ Nas minas cá do meu sertão", versa Grão de areia, de Jorge Vercillo e Paulo César Feital, para logo depois disparar "Se é fogo de corrupção/ Que o planeta incendeia/ Tem rico assaltando o ladrão/ Pastor iludindo as ovelhas/ Tem nego explodindo no chão/ Dizendo que é pelo Alcorão".

O filho Davi, de apenas 9 anos, estampa a contracapa, com sorriso de moleque e um tamborim, instrumento no qual se arrisca desde mais novo. "O papel do artista é transmitir mensagens positivas, que façam com que a pessoa se sinta bem. Mesmo ela estando deprimida, ela consiga achar dentro da canção uma esperança, uma luz. Nossa parte aqui é transmitir coisas boas para as pessoas. Essas coisas podem mudar um país, uma história, como o samba já fez muitas vezes", acredita Diogo, que encarou uma jornada de oito horas entre entrevista e festa de lançamento sem trocar de roupa, mas também sem deixar apagar o sorriso, apesar do nítido cansaço.

Das 15 composições escolhidas, apenas duas têm assinatura dele: a malandra Na boutique, com Leandro Fab e Fred Camacho - "Eu fico de olho na sua boutique/ Pra lá e pra cá, toda chique/ Curioso, querendo provar" - e Paixão além do querer, com Raphael Chaid e Inácio Rios, com tradicionais declarações de amor.

Compositores de faixas do disco, Paulo César Feital, Serginho Meriti e Rodrigo Leite participaram da festa. Foto: Anderson Borde/Divulgação

Outra novidade em gestação é um programa de rádio, aos sábados e domingos, sobre o samba. Antes, passará 45 dias na Europa em turnê com o Bossa negra por 10 países. "Hamilton é um grande irmão, juntamente com Thiago da Serrinha (percussionista) e André Vasconcelos (contrabaixista). A gente está tendo a oportunidade de levar um pouco do nosso Brasil pro mundo”, comemora, sobre o projeto conduzido pelo samba, jazz e choro. O quarteto abrirá os shows de Gilberto Gil e Caetano Veloso na França e Inglaterra.

Porta-voz da alegria ainda não tem data prevista para aportar em Pernambuco, assim como o musical SamBRA, primeira experiência dele com o teatro. "A única coisa ruim são os ensaios, que são tensos, você fica de oito a dez horas, muito cansativo. Mas foi tudo muito bom, para minha vida, minha carreira. É uma coisa que vou levar pro resto da minha vida, acho que até o último dia", comenta. O espetáculo, sobre a história do samba, estreou em março e segue em turnê pelo Brasil.

A repórter viajou a convite da Universal Music

Entrevista // Diogo Nogueira

O que é ser um porta-voz da alegria?

Não só sou eu. Só uma peça dessa engrenagem. Todo artista, composição, de alguma forma, é porta-voz. É o momento do gol, do show, espetáculo. Acho que são todos os momentos que fazem com que você se sinta bem e feliz. Estou muito feliz em poder transmitir coisas boas com esse disco e todo processo por que estou passando. Bossa negra é um porta-voz da alegria, SamBRA, Samba na Gamboa. Fazer parte dessa engrenagem é muito bom.

"Porta-voz da alegia" tem duas músicas com assinatura de Diogo. Foto: Instagram/Reprodução

Com certeza. O samba passou por vários momentos. E sempre, junto com ele, a alegria estava presente, até nos momentos em que tinha de sair fora, correndo do camburão. O samba faz isso. Tem vários momentos em que, politicamente, o samba, a música fez a diferença para esse país.

O musical SamBRA conta a história do samba. O que o ritmo promete para os próximos 100 anos?

Só Deus pode saber. Claro que a gente procura construir, para lá na frente as coisas terem resultados positivos e coisas boas, uma continuidade. A gente faz isso de coração, com muito amor à música, ao samba, para que ele continue vivo daqui a 100 anos, do jeito que está, sendo cantado nas rodas de samba, falado nas rádios.

O disco menciona Deus em quatro músicas. Como é sua relação com ele? Qual sua religião?

Sou católico, kardecista, macumbeiro, evangélico. Não frequento, mas acredito muito em Deus. Tenho uma fé muito forte. Já fui em cultos de candomblé, à igreja católica. Acho que você tem que ter fé no coração e acreditar no Deus maior. As coisas que levam até ele, a gente respeita muito.

O que acha do momento religioso em que vivemos, de choque de crenças e debate sobre tolerância religiosa?

As coisas têm que ser respeitadas. Cada um tem que respeitar o seu espaço e religião. Vou à igreja, ao terreiro, centro espírita. Quando existe respeito por cada religião, acho que é bacana. Quando uma religião passa a desrespeitar a outra, fazendo acusações, perde o sentido da fé, do coração.

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Já em Musas, você faz homenagem às mulheres e também fala sobre respeito.

É uma composição fantástica do Arlindo com o Rogê, em que homenageia os nossos poetas. As mulheres das músicas, dos livros e as reais. Acho que as mulheres devem ser respeitadas. Elas venceram barreiras, hoje nós temos líderes mundiais no poder, que são mulheres, que fazem a diferença, lutam, brigam, como o homem. Elas merecem respeito. Você merece respeito.

O Brasil respeita as mulheres?

Sim, boa parte sim. Muita gente ainda tem um ranço, muitos homens têm aquela coisa de mulher não pode trabalhar. Mas isso está acabando. A mulher já tem seu espaço.

Ainda sobre tolerância, o que acha da Parada Gay?

Acho fantástica. Todos têm direito de ser livres e fazer o que quiser. O livre-arbítrio está aí. Respeito muito os gays, tenho vários amigos gays. E eles só estão pedindo um pouco de espaço, de direito.

Grão de areia fala também sobre corrupção. Como ex-jogador de futebol, o que acha das denúncias sobre corrupção na Fifa?

Não tem novidade nenhuma. Isso existe já há muitos anos, não só no futebol, mas na política, a gente vive isso há sei lá quanto anos. Só que as coisas estão aparecendo e sendo faladas, discutidas, as pessoas estão sendo presas, como já deveria ter acontecido antes. Graças a Deus, as pessoas estão tomando providências.

Depois de SamBRA, você tem outros projetos de atuação?

Não, por enquanto o SamBRA, que está sendo maravilhoso, uma experiência fantástica. O Gustavo me recebeu com muito carinho, o elenco também. Eu tive a oportunidade de realmente me entregar ao processo todo para fazer o SamBRA. Falar um pouco da história do samba, porque na verdade não são só 100 anos, mas negar um pouco dessa história e transmitir com alegria, muita emoção, é muito bom.

Você mantém uma média de um disco por ano, o que não é mais tão comum no mercado fonográfico. Que aceitação é essa?

Um DVD deve vir desse disco. Isso não é uma escolha nossa. É um processo que as gravadoras fazem com alguns artistas. De um em um ano, eles querem lançar um produto. Com todos, graças a Deus, ganhei disco de ouro, ou de platina.

E você enxerga crise no mercado?

Ela está aí presente. Mas tem gente que sobrevive, tem fene que fica ali. Depende de cada artista. Eu comecei pela imagem, com o DVD, pelo público. Meu primeiro DVD, dois dias antes do lançamento, já vendia no pirata. Dizem que, quando sai no pirata, é porque é sucesso. Para o artista, a internet veio para somar. Para a gravadora, algumas coisas somam e outras não. A gente é que nem camaleão, se adapta ao ambiente.

Você usa muito a internet? É daqueles que não largam o celular?

Não sou um cara que fica muito no celular. Fico mais no Instagram, de vez em quando mando umas mensagens pro Facebook. Não sou eu que fico administrando, é o escritório. Uso muito para trabalho, divulgação. Sempre que posso, dou uma olhada, mas não sou aquele cara viciado, que fica o tempo inteiro. Meu contato com o público é muito pessoal, nos shows, no camarim, atendo as pessoas, o fã-clube. Falo diretamente com o fã. A internet fica muito holograma, distante.

E seu filho, Davi, de 9 anos?

Ele é completamente internético. Sabe tudo. Qualquer coisa, pesquisa, me mostra, me ensina muito nesse processo. As crianças de hoje em dia já nascem com o chip na cabeça.

Você tem alma boêmia, como diz uma das músicas do disco?

Todo carioca tem um pouquinho. Essa canção o Toninho Geraes fez para mim. Eu estava no campo do Chico (Buarque, o Polytheama), ele cantou para mim, mas não absorvi o lance. Anos depois, a música estava rodando nas rodas de samba do Rio, São Paulo, vários lugares e tive oportunidade de gravar. Acho que botei um pouco do meu tempero.

Com que frequência você joga?

Sempre compareço no Chico. É divertido, muito bacana. Eu tenho o meu, Trem da Alegria, minha pelada, em campo de 11, onde faço a minha resenha. Tem no Instagram, Trem da Alegria 11. Aí posto as fotos das comidas que a gente faz, as resenhas.

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