A pedagoga e doutora em psicologia cognitiva, Alena Nobre, explica que crianças da educação infantil já tem contato com o uso de tecnologia digital em casa, pela própria tela da TV e que há, de fato, recomendações para que elas não sejam expostas à tela, mas "com fins de entretenimento". "Ela precisa se movimentar, reconhecer o corpo. Se a gente coloca a criança diante de uma tela, ela limita as suas experiências. Precisamos entender quando usamos a tela, que não pode ser usada para distração, mas sim com fins educacionais, numa perspectiva educativa mediada por um adulto. Não é simplesmente deixar a criança exposta à tela, mas entender como pode ser um recurso para que ela veja algo. É possível o uso de tecnologia em sala de aula mesmo com educação infantil porque a nossa vida já está envolta do processo de tecnologia, e o que precisamos é ensinar as crianças como utilizar a tecnologia em nosso favor".
A pesquisa do TIC Kids Online Brasil de 2019 mostra que 80% dos pais dizem conversar sobre o que os filhos fazem na internet, 77% ensinam o jeito de usar rede social com segurança e 57% sentam junto para utilizar a internet, falando ou participando do que o filho está fazendo. E é essa perspectiva orientada por Alena, de que para que o uso da tecnologia seja benéfico, ele deve ser mediado. "Quem está fazendo a mediação tem que entender e balizar horários. Regular quantidade de tempo de interação, qual aplicativo de qualidade que está promovendo a interação com a criança. Se tiver um adulto sem essa habilidade, o conhecimento dos processos cognitivos, desenvolvimento socioemocional dessa necessidade motora pode fazer um uso tão exacerbado que vai prejudicar a criança, porque está desmedido. O problema não é a ferramenta, é o uso que a gente faz dela".
Diretor pedagógico da Escola Conecta - que insere a tecnologia na sala de aula desde os 4 anos de idade, na educação infantil, até o ensino médio -, Rogério Costa, defende o letramento digital como ferramenta para construção do conhecimento, para o aluno tirar proveito positivo da tecnologia na construção de conhecimento, projeto de vida e fluência digital. "O aluno chega aqui na escola com uma visão de que a tecnologia é só para jogar e ver a vida dos outros. A tarefa da escola é ampliar as possibilidades da tecnologia. Quando a gente amplia, o aluno começa a ter um novo desenvolvimento e percepção das possibilidades de aprendizagem. É importante a gente educar o aluno para usar a tecnologia em favor da sua formação, a escola não pode fechar isso. É negligência e irresponsabilidade da escola que não gera letramento digital e fluência no espaço".
Além das matérias da grade curricular, a Escola Conecta dá aula de programação desde o início da formação do estudante, para melhor desenvolvimento de raciocínio lógico e resolução de desafios que, "trabalha, inclusive, questões socioemocionais do aluno, como a persistir, não abrir mão de um objetivo para chegar à resolução que ele deseja". "Chamamos as disciplinas de português, matemática, história como componentes curriculares de formação básica. Além delas, o nosso currículo tem disciplinas eletivas que vão integrar desde o 1º da educação fundamental. A partir dos 7 anos de idade -educação fundamental-, o aluno escolhe quais disciplinas vão completar o currículo escolar e, dentre as eletivas, respeitando as faixas etárias, vamos ter designer de game, de imagem, robótica, à disposição do aluno. Do 1º ao 9º ano o aluno tem aula de programação, que a gente chama de pensamento computacional. Ele tem acesso ao letramento digital desde sempre. A gente coloca as disciplinas no mesmo nível de importância das demais, a diferença é que o aluno faz a escolha sobre que área da tecnologia quer explorar. Fora isso, independente de qual seja a disciplina, a tecnologia está presente nas experiências de aprendizagem".
Ao corroborar com a ideia da pedagoga, Rogério conta que vários pais chegam com receio de que o filho "só vai assistir aula pelo celular e pode fazer o uso indiscriminado". "É preciso orientar a família, mostrar qual é o espaço da tecnologia dentro do projeto pedagógico. Quando a escola diz que não pode usar o celular, é não usar para quê? Concordo que não é para entrar no Instagram durante a aula, mas ele pode usar o celular para ampliar a informação e trazer novos conhecimentos para discussão em sala de aula”.
"Tudo depende de como a escola está fazendo o uso desse recurso. O problema não é a tela e nem a tecnologia. Na educação infantil ou em qualquer outro segmento a tecnologia pode favorecer, desde que esteja a favor da aprendizagem, e não a favor da dispersão ou mera distração da criança", completa Alena.
Costa fez, ainda, uma comparação com o método de aprendizagem utilizado há 10 anos. "O aluno hoje está preparado para trabalhar com múltiplas telas, a percepção do mundo que ele tem é totalmente diferente da que se tinha há 10 anos, no tempo que a gente colocava a tecnologia num papel demoníaco que ia tirar o emprego do professor, desvirtuar a atenção do aluno para outras questões, e aprendeu que o professor tem que se ver dentro desse processo como mediador. A gente não pode deixar de adequar a escola a esse novo momento. Passamos por uma revolução digital, e nesse momento de pandemia você imagina como iria sobreviver a escola que tantas vezes colocou o mundo digital como um antro de perdição? O processo de educação não iria ter continuidade se não fosse a tecnologia".
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