Vida Urbana

Polígono de tombamento rigoroso de Olinda pode ser ampliado

Recentes descobertas arqueológicas que contam história da ocupação da cidade motivam pedido de expansão do perímetro rigoroso de proteção do Iphan.

Foto: Aluísio Moreira/Compesa.

“Existe uma área tombada muito restrita. E as áreas de interferência direta e indireta (o entorno) são aquelas que estamos pleiteando que sejam ampliadas porque têm importância muito grande”, explica a arqueóloga Gleyce Lopes, da empresa Multicast Arqueologia. O bairro de Guadalupe, por exemplo, está dentro do setor de interferência direta, mas não restrita. Nesse bairro, que abriga uma igreja de 1610, foi encontrada grande quantidade de material relevante. Já o bairro do Monte abriga uma igreja de 1535, a mais antiga de Olinda.

Foto: Divulgação Multicast Assessoria

“O polígono de tombamento deveria ser bem maior se formos considerar tudo o que foi encontrado no Monte e em Guadalupe. No entanto, esse material está restrito ao solo e, para muitos, pode não ter tanta relevância. Mas tem, porque os artefatos carregam a história de como as pessoas viviam em vários momentos.” 

Além do relatório, a Multicast Arqueologia fará publicações científicas a partir dos achados. “Nossa proposta não é apenas ampliar o polígono. Queremos que haja entendimento do porquê de Olinda precisar aumentar essa área. Se apareceu tanto material fora do polígono, está na hora de rever esse desenho. Imagina você estar numa área que não é restritiva, que não tem interferência, e alguém pode abrir e perder todas as informações contidas ali. Agora vai depender do município e do Iphan continuar esse processo.” 

A Prefeitura de Olinda afirma que o assunto é delicado, porque a área restrita já tem 1,2 km2, englobando basicamente o conjunto monumental. “Áreas como Monte, Bonsucesso, Guadalupe fazem parte do Sítio Histórico, mas não têm as mesmas restrições de uma rua como a São Bento. Como nessas regiões não há indícios de ocupação mais relevante, o que estamos fazendo é registrar, dentro do polígono tombado, os sítios arqueológicos e áreas de interesse para incluir dentro da zona restrita. Ou seja, vai significar uma área de maior proteção ao sítio. Uma das regiões em processo de inclusão é o istmo Olinda-Recife”, disse a secretária executiva de Patrimônio, Ana Cláudia Fonseca. 

O Iphan informou que tem recebido relatórios da Multicast Assessoria por solicitação da Compesa e que ainda não foi consultado sobre a demanda de ampliar o tombamento rigoroso. "Caso isso ocorra, o assunto será analisado pela área técnica responsável", disse a nota.

O Iphan informou que os achados são a representação material de hábitos, costumes e relações da sociedade e sua incorporação à União está prevista em norma vigente. "Contribuem ao entendimento dos indivíduos enquanto membros de uma sociedade e para o processo de construção da identidade e memória nacional. A ampliação das atividades fiscalizatórias do Iphan está implícita nesse processo".

 
Já são mais de 10 mil achados arqueológicos

Foto: Aluísio Moreira/Compesa.

Os artefatos arqueológicos vêm sendo encontrados no Sítio Histórico e entorno há um ano e seis meses, desde que começaram a ser realizadas as obras do projeto Olinda %2b Água pela Companhia Pernambucana de Saneamento e Água (Compesa), que prevê a substituição e implantação da rede de abastecimento de água de 15 bairros de Olinda. Até o mês de agosto, 10 mil achados já haviam sido catalogados. O material, que pertence à União, passa por limpeza, organização por tipologia, acondicionamento, pesquisas de laboratório e análises, antes de serem entregues a universidade. Em seguida, são enviados ao Laboratório de Arqueologia da Universidade de Católica de Pernambuco (Unicap). 

“Os artefatos ajudarão a compor lacunas no campo teórico da história e da arqueologia e vão ajudar os pesquisadores a se georreferenciarem dentro do Sítio Histórico. Por exemplo, a história diz que Olinda foi incendiada pelos holandeses. Nós chegamos a 1,20m de profundidade e em nenhum local nós encontramos evidências, vestígio material de que houve esse incêndio”, detalha a arqueóloga Gleyce Lopes, da Multicast Arqueologia, empresa contratada pela Compesa para acompanhar o trabalho do Olinda Água. 

Foto: Multicast Assessoria

Já na 13 de Maio, por exemplo, foram encontrados muitos cachimbos, holandeses, portugueses, com influências indígenas e africanas. Também foi descoberto uma peça de alcatruz (vasilhame em cerâmica usado para tirar água de poços), nunca encontrada em Pernambuco antes. “Ainda encontramos muito material malacológico, o que mostra que os holandeses se alimentavam basicamente de moluscos, pois não se tinha carne nem agricultura naquela época aqui nessa área. Tendemos a enxergar Olinda no contexto do casario. Mas existe muito patrimônio a se explorar. E todo fragmento encontrado nessa obra vai ajudar a remontar essas informações”, disse a pesquisadora. 

Foto: Multicast Assessoria.

Para conseguir realizar esse trabalho minucioso de recuperação das peças, a cada metro de vala aberta foi necessário o acompanhamento de um profissional de arqueologia durante todo o processo de escavação. “Essa foi uma das mais importantes intervenções da Compesa, não só pela obtenção dos artefatos arqueológicos, mas por outras metodologias, como a instalação de uma tubulação especial fabricada em aço carbono para que a rede passasse por cima de uma galeria que remete a construções de Saturnino de Brito”, disse a diretora regional metropolitana da Compesa, Nyadja Menezes.  

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