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Nordeste se articula sobre efeitos de mudanças climáticas

Publicado em: 14/08/2019 08:57 | Atualizado em: 14/08/2019 09:08

Foto: Peu Ricardo/DP. (Foto: Peu Ricardo/DP.)
Foto: Peu Ricardo/DP. (Foto: Peu Ricardo/DP.)

Na contramão da política de meio ambiente do governo federal - que contesta indicadores como o crescimento no desmate na Amazônia, apontado pelo próprio Instituto de Pesquisas Espaciais (Inpe) -, os governadores no Nordeste pretendem se unir para articular investimentos em proteção ambiental. Durante o Fórum de Mudanças Climáticas de Pernambuco, realizado na manhã de ontem na Universidade Católica de Pernambuco (Unicap), especialistas debateram o papel do estados na redução dos gases de efeito estufa. Um dos temas do evento foi a criação de uma agenda pernambucana para alcançar as metas do Acordo de Paris.

O debate antecede a Conferência Brasileira de Mudança do Clima, que acontece entre os dias 6 e 8 de novembro, no Recife. A reunião do Fórum adiantou alguns dados que farão parte do inventário dos gases de efeito estufa no estado de Pernambuco e propostas para a implementação da Contribuição Nacionalmente Determinada (INDC) brasileira, que é um documento onde ficam registrados os compromissos do Brasil para cumprir com o acordo climático. Os resultados obtidos serão apresentados na Conferência do Clima, a COP 25, que acontece em novembro, no Chile.

O inventário começou a ser produzido no mês de abril e deve ficar pronto em outubro. De acordo com a Secretaria Estadual de Meio Ambiente, esses dados dirão quais são as emissões de gases de efeito estufa em Pernambuco e apontar as políticas que podem contribuir com a diminuição dos efeitos das mudanças climáticas. "Quando se trabalha na construção de aterros sanitários e melhora a matriz energética, como o estado tem feito com investimentos de energia solar, teremos condições de monitorar o tipo de cadeia produtiva, quais as fontes de energia e como atrair empreendimentos sustentáveis. Então esses dados vão contribuir para o enfreamento das mudanças climáticas e para a melhoria da matriz produtiva", acredita o secretário estadual de Meio Ambiente, José Bertotti.

Diante do corte de R$ 156 milhões por parte do governo da Alemanha, que vai deixar de investir em projetos de preservação ambiental no Brasil, o coordenador-executivo do Centro Brasil no Clima (CBC) e ambientalista, Alfredo Sirkis, defende que as negociações sejam lideradas pelos próprios governadores. "Pernambuco já vem contribuindo imensamente em termos de energias limpas, legislação sobre mudanças climáticas e mobilização política. Nesse momento complicado no âmbito do Governo Federal, a importância dos estados brasileiros é central. Nós vamos dar força para os estados do Nordeste para fazer a conexão direta com as fontes financiadores. Nós queremos que o Brasil possa se beneficiar de ajudas internacionais e isso tem que ser feito diretamente com os estados", defendeu Sirkis.

Foto: Peu Ricardo/DP. (Foto: Peu Ricardo/DP.)
Foto: Peu Ricardo/DP. (Foto: Peu Ricardo/DP.)
A articulação entre os governadores do Nordeste, sobretudo com a criação do consórcio, já demonstra interesse em liderar as relações e criar políticas públicas com relação às mudanças climáticas. "Um dos eixos articuladores do consórcio é pensar um modelo de desenvolvimento sustentável, com atenção ao bioma da caatinga, que é único no mundo. Nesse momento em que os governadores do Nordeste são continuamente atacados pelo presidente da República, esse consórcio se torna um contraponto político. O Nordeste hoje é um dos maiores produtores de energia renovável do Brasil e o consórcio propõe projetos de geração de emprego e renda com amplo debate", comentou Bertotti.

Poluição em números
De acordo com dados do Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de Efeito Estufa (Seeg), o estado de Pernambuco está na 17° posição no ranking nacional de emissão de CO2, com mais de 30 milhões de toneladas de emissões brutas. O principal responsável por causar maior poluição é o transporte, que emite mais de 50% desse total na queima de combustíveis. Somente o transporte rodoviário emite mais de 5 milhões de toneladas, sendo os combustíveis mais consumidos dísel, gasolina automotiva e querosene.

Logo depois, vem a geração de eletricidade (26%) e a indústria (7,20%). No uso da terra, a alteração de uso do solo representa 84,3% do total de emissões de gases de efeito estufa e a agropecuária 61,9%. Outro vilão pela emissão de Gás Carbônico é a disposição final de resíduos sólidos urbanos. Esse é um problema antigo, já que mais da metade dos municípios pernambucanos cometem crime ambiental mantendo lixões a céu aberto e desrespeitando a Política Nacional de Resíduos Sólidos, segundo levantamento do Tribunal de Contas de Pernambuco (TEC-PE).

Para melhorar esses indicadores, além de articulação, os especialistas também defendem a criação de agenda de trabalho com metas para cada um dos estados da federação respeitando as peculiaridades das diferentes regiões. Por exemplo, em Pernambuco, é necessário pensar em políticas ambientais levando em consideração a seca, as inundações na Mata Sul e aumento do nível do mar, como lembra o ambientalista e ex-secretário estadual de Meio Ambiente, Sérgio Xavier. "Pernambuco é muito prejudicado com as mudanças climáticas. O estado enfrenta desertificação no semi-árido, avanço do mar na Região Metropolitana e muita chuva na Zona da Mata. Então é preciso não só fazer a nossa parte, mas também cobrar que o Brasil seja ativo nessas questões para reduzir as emissões", defendeu.

Laboratório
Uma das iniciativas de inovação socioambiental que pretende estudar essas questões regionais é o laboratório de mudanças climáticas, inaugurado na Universidade Católica de Pernambuco através de uma parceira com a União Europeia. O Lab Climates será um espaço de pesquisas e capacitação. A proposta da Unicap aprovada pela UE foi elaborada pela professora Cinthya Suassuna, do curso de Direito e com doutorado na área ambiental, e pelo professor Fábio José Pedrosa, do curso de Engenharia Ambiental. 

Uma das ideias é instalar um laboratório de estudos de mudanças climáticas no novo Campus Integral Unicap em Beberibe, projeto da Universidade Católica de Pernambuco de inovação socioambiental que será implantado no bairro de mesmo nome na Zona Norte do Recife, no limite com a comunidade de Passarinho, em Olinda. O campus segue o conceito de ecologia integral do Papa Francisco, considerando as questões sociais e ecológicas como um único problema. O local com doze hectares conta com uma área verde preservada e um edifício de três pavimentos, com 78 quartos, refeitório, cozinha e dispensa, salão externo, capela, jardim de inverno, quadra de vôlei e campo de futebol.

O plano de trabalho do Lab Climates Unicap prevê ainda a identificação das capacidades institucionais para projetos de inovação socioambiental, além de implementar projetos pilotos de acordo com as peculiaridades de cada território com colaboração interdisciplinar, com a capacitação de lideranças para atuar nas ramificações do projeto.

"As políticas públicas precisam estar embasadas na ciência. Hoje está acontecendo um movimento muito perigoso no Brasil de não considerar a ciência, quando o governo federal desconsidera os dados consagrados do Inpe. Então a participação da universidade nesse processo é fundamental para essas políticas e ter um laboratório como esse na Unicap se torna um diferencial para o estado", comentou Sérgio Xavier.
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