“Onde tem algo próximo de uma relação de trabalho pode existir abuso”, ressaltou o procurador Ulisses Carvalho, vice-coordenador da Coordenadoria Nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete).Segundo ele, há clínicas para dependentes químicos, por exemplo, que não têm sequer funcionários. Todo serviço é feito pelas pessoas em tratamento, sob alegação de que estão em laborterapia. “Não há problema em laborterapia, a questão é o abuso. É preciso checar se no prontuário do paciente está essa indicação no tratamento, como se dará, quem acompanha, de que forma influi na cura do paciente.” O procurador denunciou que muitas vezes não há prontuários e, na prática, essas comunidades têm pacientes trabalhando na cozinha, na limpeza, na jardinagem sem receber salário em troca. Algumas clínicas são particulares, outras custeadas pelo SUS e outras, mistas.
Dados divulgados na semana passada apontam que aumentou o número de pessoas em situação de trabalho escravo resgatadas no Brasil entre 2017 e 2018, passando de 1.300 para 1.723 de um ano para o outro. Em março do ano passado, um caso de trabalho escravo ligado a uma seita religiosa, na Bahia, chamou a atenção de todo o país. Aconteceu na Igreja Evangélica Comunidade Cristã Traduzindo o Verbo, onde 564 pessoas foram observadas nessa situação. Ganhavam moradia, comida, mas não eram pagas pelos serviços realizados para a igreja. Eram considerados “irmãos”, mas não escravos.
Ulisses Carvalho chama a atenção para alguns sinais de trabalho escravo. Segundo ele, é preciso observar se há respeito às normas de trabalho, água limpa, banheiro, alojamento adequado para habitação, comida de boa qualidade, registro, equipamento de proteção. “Se não há nada disso, já é considerada uma situação irregular”, enfatizou.