Vida Urbana

Mulheres vencem o preconceito em profissões "de homem"

Elas trabalham em ambientes de maioria masculina e, com profissionalismo e eficiência, lutam para afastar a imagem estereotipada do sexo frágil

Ana Karina já foi agredida depois que expulsou um jogador, mas teve apoio para retomar a carreira. Fotos: Teresa Maia/DP/D.A Press

“Lugar de mulher é na cozinha”, “era melhor que estivesse na praia.” Frases como essas ainda permeiam o cotidiano das profissionais. A árbitra Ana Karina conhece bem cada uma delas dentro de um cenário em que os ânimos estão sempre alterados. Ela já foi agredida depois que expulsou um jogador de campo. O apoio da família foi fundamental para que continuasse na atividade. “Pensei em desistir várias vezes. Mas surgia uma nova chance que não dava para rejeitar, e assim fui conquistando meu espaço”. Ela é uma das seis mulheres entre os 56 profissionais a integrar o quadro da Federação Pernambucana de Futebol. Também apita jogos da Fifa.

A imagem sensualizada da mulher é outro problema que as profissionais que atuam no futebol precisam lidar. Professora e autora do maior blog feminista do país, Escreva Lola Escreva, Dolores Aronovich acredita que a forma como a mídia trata mulheres que atuam em áreas tipicamente masculinas reforça os preconceitos. “Há sempre uma abordagem para a sensualidade da mulher, destacando características físicas. Isso não ajuda. Ela tem que ser olhada pela sua capacidade e eficiência”, ressalta.

Filha de mestre de obra, Edna Maria entrou na construção civil em 2000. No início, assumiu função administrativa, mas o empenho fez surgir novas oportunidades. Diariamente, ela lida com cerca de 30 homens nas obras que supervisiona. “Tive dificuldade em impor respeito e senti a resistência deles em receber ordem de uma mulher”, disse. “Mas eu boto moral. Se baixar a cabeça, já era”, afirma.

Edna entrou na construção civil em 2000 e hoje lida com até 30 homens nas obras

Edna comemora quase 15 anos na profissão. “Foi um desafio que eu encarei e venci”. A rotina de trabalho inclui orientações diárias a pedreiros, pintores, eletricistas. Uma troca de conhecimento constante. Karina, que também é bióloga, vez ou outra pensa em parar de arbitrar, mas conta com a força de outra mulher-menina, a filha Larissa, 15, que a estimula nos treinos. Graças a exemplos como a mãe, sua geração, espera-se, desfrutará de um cenário onde os postos de trabalho não mais servirão para perpetuar desigualdades de gênero.

Para o antropólogo da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) Parry Scott, a divisão de trabalho por gênero está relacionada à cultura patriarcal. “É um problema histórico, mas que apresenta avanços em diversos segmentos”, pontua. Scott acredita que ações como a criação da Secretaria de Políticas Públicas para Mulheres, em 2003, contribuiram para a ascensão feminina no mercado de trabalho.

Avanços sem constrangimento

Helenilde supervisiona o trabalho de militares

De meia calça fio médio, unhas cor de rosa e gloss, a 1ª tenente Helenilde Gomes usa uma voz imperativa para falar com seus subordinados. Ela é encarregada da Divisão de Inspeção Naval e Vistoria e é responsável por orientar e supervisionar o trabalho dos militares que atuam na fiscalização das embarcações. Na sua rotina de trabalho, onde lida apenas com homens, a formalidade típica do ambiente militar não dá muita brecha para situações de assédio. “Nunca me senti constrangida ou desrespeitada”, assegura ela.

Embora haja avanços, apenas no ano passado a escola e o colégio naval passaram a aceitar mulheres. Mesmo assim, elas ainda não podem assumir funções no quadro da Armada voltadas ao comando de embarcações. Depois de formadas, o caminho é o quadro da Intendência, onde assumem postos administrativos.

Segundo o antropólogo da UFPE Parry Scott, instituições tradicionais costumam citar fatores biológicos para justificar construções sociais. “A mulher pode assumir a função que quiser, desde que consiga se adequar às exigências do cargo com eficiência. Ela não tem de ser comparada ao homem porque não quer ser igual a ele. Só precisa ter acesso às mesmas oportunidades.”

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