Além de leucemia e anemia, o mês de junho também se dedica à prevenção do ceratocone, uma doença que afeta a córnea dos olhos - camada fina e transparente que cobre todo o globo ocular. Essa enfermidade causa uma curvatura irregular onde a espessura da córnea diminui e gradativamente vai ficando pontiaguda, semelhante ao formato de um cone. O ceratocone é uma doença bilateral que pode afetar os dois olhos, causando baixa visão e instabilidade no grau ocular. Segundo o Ministério da Saúde, por ano, cerca de 150 mil brasileiros são afetados por esse problema.
Um dos principais fatores que podem colaborar para o desenvolvimento do ceratocone é coçar os olhos ao ponto de causar um trauma na córnea. Algumas pessoas têm uma pré-disposição genética para desenvolver a doença, que se apresenta na maioria dos casos entre pessoas com 15 a 25 anos. Os acometidos pela doença possuem uma deficiência de colágeno no tecido que reveste a córnea, que aliada ao trauma mecânico pode gerar o ceratocone. Pessoas que possuem rinite, dermatite, sinusite e outras alergias, são mais frágeis à doença por ter o hábito de coçar o rosto principalmente na região dos olhos.
A doença se divide em graus. Nos dois primeiros os casos são considerados mais leves e os pacientes não apresentam muitas alterações nos exames clínicos, a baixa visão pode ser corrigida com óculos ou lentes de contato. Já em casos mais avançados, como nos graus três e quatro, o tratamento pede o uso de lentes especiais ou procedimentos cirúrgicos. Os principais sintomas do ceratocone são dificuldade de enxergar, até mesmo de óculos, sensibilidade à luz e aberrações ópticas de difícil correção. Em casos mais graves, pode ocorrer a baixa acuidade visual severa e necessidade de transplante de córnea.
"O diagnóstico é feito através de imagem. O principal exame é a tomografia computadorizada da córnea. Dependendo do estágio é indicado ao paciente tratamentos como o crosslinking, para evitar a progressão, e o anel de ferrara, para diminuir o ceratocone e melhorar a visão. Se for um caso muito avançado já é indicado o transplante de córnea", disse o médico oftalmologista e especialista em córnea, Ermano Melo. O principal fator para evitar a progressão da doença é controlar o hábito de coçar os olhos e se consultar regularmente com um oftalmologista.
O olho esquerdo de Natália teve que receber uma nova córnea.
Depois de sete dias da cirurgia - quando foi retirado o tampão - Natália se emocionou ao ver expressões no rosto do filho, sinais no próprio rosto que antes a doença não permitia que ela visualizasse e também cores. Após a intervenção o corpo reagiu e a doença foi estabilizada. Ainda hoje de três em três meses Natália passa por exames médicos para acompanhar clinicamente como anda a visão.
No olho direito ela foi encaminhada para fazer o procedimento de crosslinking que estaciona a doença. No mesmo olho ela também implantou um anel de ferrara, que melhorar a curvatura da córnea. "Todo o tratamento é caro. Tem gente que não consegue passar em prova de concurso. O ceratocone é uma doença progressiva", afirmou Natália. Para ajudar a quem tem o diagnóstico a empresária resolveu reunir e dividir informações sobre o ceratocone em uma conta no Instagram (@olhos-ceratocone).
Doença comprometeu desempenho escolar
Com o diagnóstico do ceratocone em mãos ainda na adolescência o designer Rodrigo Dias, de 44 anos, repetiu o primeiro ano do ensino médio três vezes para poder desconfiar da doença. "Na época que eu descobri não era uma doença muito conhecida. Foi a partir de um acidente de carro que eu descobri o ceratocone", disse Rodrigo. Um dos olhos dele conta com um transplante de córnea há 20 anos, a doença também se manifestou no globo ocular do outro olho, mas a médica que o acompanha não indica mais um transplante. Ele já chegou a perder 80% da visão do olho esquerdo.
"A única lembrança que eu tenho é de muita dificuldade na escola, eu achava que era uma depressão, uma falta de estimulo. Uma coisa que estava relacionada era a rinite, eu coçava muito o olho. Fui para uma escola péssima, meus professores não incentivavam, a minha família não imaginava ser um problema de visão, pensavam que eu não queria estudar", relembrou Rodrigo.
Rodrigo Dias, 44 anos, designer que ainda convive com a dificuldade para ler.
Ainda hoje, o designer convive com dificuldades para trabalhar na frente da tela do computador. Seu maior obstáculo é na leitura de livros. Depois dos 40 anos, Rodrigo teve que lidar ainda com a dificuldade para enxergar de perto. "Eu me esforço muito para ler, estou sempre comprando livros, mas eu não consigo ver e fico forçando a vista que acaba cansando. Desde a adolescência eu sempre tive dificuldade com a leitura", afirmou.
"Para melhorar a visão a melhor alternativa costuma ser o uso de lentes de contato rígidas. Existem vários modelos e formatos para que a lente se adapte melhor ao formato da córnea do paciente. Em alguns casos, quando não se consegue adaptar bem a lente ou o paciente tenha algum outro motivo para que não possa usar as lentes, se parte para a estratégia cirúrgica. Com o diagnóstico precoce, um bom acompanhamento, e uma boa estratégia de tratamento a maioria dos pacientes não irão chegar às fases mais avançadas", disse a médica oftalmologista da Fundação Altino Ventura (FAV), Carolina Guimarães.
A FAV é uma das unidades de saúde oftalmológica que presta serviço à Secretaria Estadual de Saúde e atende pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Na unidade de saúde, em setembro de 2020 foram iniciados os atendimentos em um ambulatorial específico para pacientes com ceratocone. No ano de 2020 foram registrados 162 pacientes com ceratocone, já no ano de 2021 (até o dia 16/6) o número subiu para 269.