Qual sua expectativa para o discurso do presidente na ONU? Qual o principal recado que deve transmitir?
O recado número 1: a Amazônia é nossa. Isso aí, não podemos admitir em hipótese alguma, essa questão de soberania limitada ou uma ingerência além daquilo que os tratados internacionais, ao qual o Brasil subscreve, preveem. O segundo recado: ela é nossa e compete a nós protegê-la e preservá-la.
O senhor diz que houve uma reação com o fígado. Isso não tem acontecido com frequência maior do que deveria nesses oito meses?
Olha, eu já respondi até alguns colegas de vocês a esse respeito. Sou vice-presidente do presidente Bolsonaro. Então, não compete a mim, publicamente, tecer críticas a ele. Estaria sendo desleal e canalha se fizesse isso. Então, todas as vezes que discordo de alguma coisa dele, eu falo em particular.
O senhor tem falado muito em particular com ele ultimamente?
Não, ultimamente, não, porque ele está lá no hospital.
Mas sempre fala?
Sempre que temos alguma oportunidade conversamos e procuro expor meu ponto de vista sobre determinado tema.
Mas o senhor tem sido uma voz em defesa da democracia. Em vários momentos, o senhor se manifestou, inclusive agora, nesta semana, em relação à declaração do Carlos Bolsonaro...
Mas uma coisa é a Eletrobras, que carrega junto todas as bacias hidrográficas, porque tem as grandes hidrelétricas, e a privatização pega o controle sobre a água do Brasil. Os chineses têm muito interesse, e querem entrar com tudo nessa área de energia. Há preocupação com o modelo de privatização?
O controle pelo Estado nunca significou que você detém a riqueza na mão. Nunca significou isso. Então isso é uma visão, vamos colocar assim, meio ultrapassada. Temos que ter uma legislação que nos assegure efetivamente o controle e não a gente deter as rédeas da empresa. E a gente sabe que as empresas estatais nascem sob uma excelente ideia, mas, depois, viram um cabide de emprego e são desvirtuadas.
Agora, o senhor acha que tem que privatizar tudo?
Ele já pediu desculpas. É aquela história. A gente que faz palestra — eu faço muita palestra — a gente procura de vez em quando dar uma quebrada naquele ambiente de extrema seriedade. É que nem aula. O professor, que é um bom professor, alterna uma conversa descontraída com um assunto sério. Então, alguém falou algo na plateia e ele falou “ah, é feia mesmo”. Ele já pediu desculpas, já identificou que cometeu uma grosseria e o Paulo é uma pessoa, pô, um cara fantástico.
Eu concordo com o Paulo na questão da desoneração da folha e ele tinha a visão de substituir o imposto que hoje é pago pelo empresário em cima da folha de salário por esse Imposto sobre Transações Financeiras (ITF). É a troca de um por outro, tanto até que, na apresentação que foi feita era uma gangorra. Criava-se o imposto sobre valor agregado (IVA), vamos lembrar, é um estudo de um discípulo do Keynes, dos anos 50, um húngaro chamado Kaldor, né, era chamado inclusive de imposto Kaldor. Criava esse imposto ao reunir todos os impostos federais e não metia a mão em estados e municípios, que é uma coisa complicada, já é diferente da proposta da Câmara, por exemplo, e com a gangorra com esse imposto de transações financeiras. Está sendo discutido no Congresso. Agora, uma vez que não vai haver o imposto sobre transações financeiras, o Paulo está tendo que buscar alguma solução, por exemplo, reduz aquilo que os empresários pagam para sustentar o sistema S, tem a questão dos fundos exclusivos que vários governos já tentaram tributar e não conseguem tributar mais, e têm outras medidas, mas não sei se esse conjunto de medidas geraria a quantidade de recursos que um imposto de transação financeira, que, de acordo com o Paulo, geraria R$ 150 bilhões de retorno. Então é algo que tem que ser discutido. E a reforma tributária, a melhor coisa, hoje, é que todo mundo já entendeu que tem que ser feita.
O problema é que cada um tem a sua.
É, mas aí não vai fugir de ser discutido dentro do Congresso. Vai ser discutido exaustivamente lá dentro, vai demorar, mas eu espero que, até o fim do primeiro semestre do ano que vem, esse pacote seja fechado.
Como é a relação do senhor com o Congresso? Acompanha tudo?
O presidente nunca me escalou para essa tarefa. Eu recebo senadores, deputados aqui. Procuro fazer aquela nossa conquista de corações e mentes, conversar com eles, passar nossas ideias, aquela coisa, recebo demandas, aí encaminho para ministro A, ministro B, o que a gente acha necessário. Falo muito com o (Luiz) Ramos (ministro-chefe da Secretaria de Governo). Ele está encarregado dessa atividade. Mas não sou linha de frente neste trabalho.
Mas parecia no começo que tinha esse peso.
Mas não tem. Nunca houve esse núcleo. Até já respondi a alguns colegas de vocês que passava-se a imagem que, ao fim do dia, eu ligava pro (Augusto) Heleno (ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional), pro Santos Cruz, “olha só pessoal, vamos sentar aqui e vamos nos reunir e ver o que a gente vai fazer amanhã”. Nada, pô. Existe uma coisa que a gente preza muito que se chama disciplina intelectual. A disciplina intelectual coloca que você atue na tua área, e não te meta na área dos outros. Isso é fundamental dentro do quartel. Ali você tem o batalhão, tem a primeira companhia, segunda companhia, terceira, cada um tem seu capitão e comandante. O capitão da primeira companhia não mete a mão na segunda, senão vai dar briga. Cada um no seu quadrado. Isso é extremamente preservado no ambiente militar.
O senhor acredita que reforma da Previdência vai passar com tranquilidade no Senado?
Vai, vai passar tranquilo. Conversei com o Davi Alcolumbre (presidente do Senado) aqui essa semana e ele me deixou claro isso. Acho que, até fim da primeira quinzena de outubro, ela estará votada no Senado.
Em relação a Eduardo Bolsonaro embaixador, como está isso no Senado? Alcolumbre deu algum #ficaadica para o senhor?
Não, não deu nenhuma dica. Agora está sendo trabalhado esse assunto. O próprio Eduardo está conversando com os senadores. Acho que o irmão dele, o Flávio, também deve estar ajudando nisso aí, o próprio presidente. Então, vamos aguardar. Acho que o presidente parece que só vai submeter o nome do Eduardo quando voltar de Nova York (da ONU).
Pois é, essa semana fizeram, inclusive, a sabatina do futuro chefe da missão do Brasil na ONU, o Costa Filho. E o senhor acha que dá tempo? Vai fazer apelo já para votar isso esta semana?
Porque no Senado estão falando “ah, a gente tem que ver se vota porque o governo quer que vote logo para ele poder ir, acompanhar o presidente”.
Na comissão, mas tem que passar pelo plenário...
Mas não interessa, porque ele não vai conseguir chegar lá a tempo.
Vai ser o Mauro Vieira mesmo?
É, não sei nem se o Mauro Vieira. Acho que o 02 do Mauro Vieira, que é um outro embaixador. O Mauro está aqui no Brasil, porque tem que ser sabatinado. Ele vai ser embaixador na Croácia.
Em relação ao ministro Sergio Moro, o senhor acredita que ele está superando o episódio da Vaza-Jato com altivez e se mantém firme no cargo?
O Moro é uma pessoa acostumada a sofrer pressão. Um homem que, ao longo dos últimos seis anos, sete anos, vem trabalhando em um ritmo, vamos dizer assim, forte, com pressões, com riscos de vida, com pressão sobre a família dele. Ele não se abala com essas cosias. Ele é muito tranquilo. Mas muito tranquilo mesmo.
Ele fica até o fim do governo?
Espero que sim.
Ele vai pro Supremo? O presidente já disse que quer um ministro que seja terrivelmente evangélico. Não é o caso do ministro Moro...
Vamos aguardar a decisão. A primeira vaga é, no fim do ano que vem, do ministro Celso de Mello. Vamos aguardar o que vai acontecer.
E as eleições municipais, como o senhor está acompanhando isso?
O meu partido, PRTB, está em situação complicada, pois não atingiu a cláusula de barreira.
O senhor vai pro PSL?
Dizem que, no Rio Grande do Sul, só dá o senhor em pesquisas informais, em assembleias legislativas, em prefeituras. Falam até que poderiam ser lançados militares nas eleições municipais e em 2022 também. O senhor pensa nisso?
É, têm aparecido alguns companheiros postulando para ser candidato, mas a gente está analisando. O que acontece é que tem um limite ético nisso aí, na minha posição de vice-presidente, né? Então tem que esperar, começar a campanha, essas coisas, para não atravessar o samba. Mas, por enquanto, a gente está só observando.
O orçamento está superapertado, não tem dinheiro para nada. Vem o teto de gastos que vai enxugar ainda mais a máquina pública. Como o governo vai sair desse imbróglio em relação ao orçamento?
Estamos sendo pressionados pelo piso que vem subindo, as despesas obrigatórias aumentando, aí tem a discussão que você vê, né? Tem a turma que quer a flexibilização do teto de gastos, então, tirar determinadas despesas, sairiam do teto, uma coisa “tirar a saúde e educação do teto”. Aquela multa do FGTS também já foi aventada, de tirar do teto. É uma flexibilização. Outra é mudar e o teto seria inflação mais 1,5%. Mas, por enquanto, nós estamos precisando passar a mensagem de que vamos respeitar isso, porque é uma questão do equilíbrio fiscal, a gente tem que passar isso para os investidores e o resto do mundo, e tentar furar o piso, com uma desvinculação de receitas. Essa é a ideia que o Paulo Guedes tem. Temos que buscar uma solução para isso, senão vamos morrer achatados.
O presidente Jair Bolsonaro escolheu um nome fora da lista tríplice para a Procuradoria-Geral da República e anunciou que espera uma parceria desenvolvimentista ali na PGR. E o Augusto Aras já declarou que o governo não vai mandar na PGR. Na sua visão, como é que deve ser o papel de um procurador-geral da República?
O procurador-geral da República tem que atuar, de acordo com a lei. É simples. Vivemos dentro de um Estado de direito. O Estado de direito significa que a lei vale para todos e tem que ser respeitada. Então, o procurador tem que fazer o quê? Agir de acordo com a lei. Agora, algo que eu vejo muitas vezes no Ministério Público e até no próprio Tribunal de Contas, e até já conversei uma vez com alguns ministros do TCU, é que, no caso específico de obras, depois que a obra partiu, que o troço já está na metade, aí alguém resolve embargar o negócio. Porra, é um prejuízo… então, se vai embargar aquilo, vamos embargar antes de começar. Vamos analisar bem antes de começar e não depois. É o único problema que vejo nessas atuações.
Estes oito meses de governo foram muito turbulentos, em alguns momentos difíceis até demais. Nos próximos três anos, a situação vai se acomodar ou viveremos tempos sempre agitados e tensos? Nos primeiros meses de governo, houve muito atropelo, não?
É, o que eu vejo. A forma como nós montamos os ministérios... A forma como nos relacionamos com o Congresso... O Congresso, sob nosso governo, tem ampla liberdade para atuar. O Congresso não está comprado por um mensalão, né? E também não está cooptado moralmente em um toma lá da cá. “Eu dou ministério, dou cargo”. Então, o Congresso tem ampla liberdade para fazer o que quer. Muitas vezes, se critica o nosso governo, principalmente a figura do presidente. “Ah, mandou lá pro Congresso e esqueceu”. É uma forma de você dizer, “olha, nossa proposta é essa e agora os senhores discutam aí e cheguem a alguma conclusão”. Então, é uma forma bem, digamos assim, honesta de você ter uma ligação de um poder com o outro. Agora, o que nós vemos de uma forma geral? Os dois primeiros anos são difíceis, são anos de ajustes na economia, de modo que os dois últimos anos a gente entre já em um voo sustentável, não em um voo de galinha.
Voo sustentável para a reeleição?
Não precisa ser a reeleição. O próprio presidente já deixou isso claro. O nosso grande objetivo é deixar o país reorganizado, de modo que a gente tenha uma marcha progressiva e um rumo de aumentar efetivamente a geração de emprego, de renda e de bem-estar para a população como um todo.
O presidente comenta que espera entregar um país melhor em 2023 ou em 2027. Partindo desse pressuposto, de que ele não descarta a possibilidade de reeleição, o senhor sairia como candidato a vice ou se candidataria a um cargo eletivo? Já se aventou até Marco Feliciano como o vice de Bolsonaro.
Bom, eu só entrei na política porque o presidente Bolsonaro me pediu. Eu não tinha nenhuma aspiração política. Quando passei para a reserva, no final de fevereiro do ano passado, a minha visão era “vou para minha casa no Rio de Janeiro”. Passei 46 anos dentro do Exército, está na hora de ter um pouquinho de paz de espírito na minha vida. Eu queria ser presidente do Clube Militar, para ter uma atividade que não fosse altamente estressante e que eu pudesse ter contato e auxiliar a família militar e, ao mesmo tempo, ter uma voz perante a sociedade brasileira. Fui eleito presidente do Clube, só que, um mês e meio depois, tive que sair. Não tenho nenhuma aspiração política. Se o presidente for candidato à reeleição e quiser que eu vá com ele como vice-presidente, muito bem. Se ele não quiser, se precisar de outra pessoa para compor uma chapa mais forte, seja lá o que for, ok, parabéns, e eu volto para a minha casa, tranquilamente, sem estresse.