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O velho e o novo Pina

Aldo Paes Barreto
Jornalista

Publicado em: 03/05/2022 03:00 Atualizado em: 02/05/2022 23:46

As mais recentes pesquisas sobre o mercado imobiliário revelam que o bairro do Pina é o mais valorizado da cidade. Nem sempre foi assim.

O antigo subúrbio sempre conviveu com mistérios e  preconceitos que estimularam lendas urbanas. A História ajudava.

Primeiro foi a chegada dos jesuítas. Eles construíram um hospital que recebia escravos moribundos após as agruras e os sofrimentos da travessia do Atlântico. Poucos sobreviviam. Ficaram as almas penadas assombrando os poucos passantes.

Em seguida, o local foi ocupado pelos irmãos Pina, que deram nome ao lugar e originaram a crença de que, durante a fuga da área – não se sabe por que -, deixaram um tesouro.  Na correria teriam enterrado baús cheios de dinheiro, ali onde hoje é o Primeiro Jardim.

Séculos depois, a realidade traria novas histórias e velhos tabus. A prostituição que proliferou no rastro da ocupação de tropas americanas durante a II Guerra, e a construção do Cano Pina ponto terminal do primeiro sistema de esgotamento sanitário da cidade.

A soldadesca norte-americana atraiu a alegria das noites, com o Cassino Americano, bares, prostíbulos, jovens de variadas serventias e novos comportamentos. O Cano do Pina entrou no folclore, originando novos preconceitos, versados e musicados: “O Pina é um colosso/ tem armazém/ que vende merda/ Em grosso...” “O Pina/ lugar de banho/ tem um tolete/ que é do teu tamanho”.

Os moradores resistiam. Pecadores, boêmios de todas as nações, desordeiros treinados nas estivas do Porto, no vai e vem de barcos entre o velho Recife e o Pina. Quem tardasse, tomando umas e outras nos bares e pensões de raparigas da Rua da Guia, perdia o rumo e surgiam os brabos, os desordeiros de carteira assinada.

A partir dessa época, o velho bairro foi lentamente sendo transformado. As primeiras e minúsculas casas das ruas mais antigas, moradias de gente simples, pescadores e corpulentos estivadores do porto foram sendo abatidas, transformadas em pequenos negócios de oficinas e de comes e bebes.

Em meados do século passado, pontes de concreto, a avenida à beira mar, aproximaram lentamente o bairro da explosão imobiliária. Aos poucos, os empreendedores de visão mais aguçada reservaram as melhores fatias territoriais.

Na década de 1970, a rede de mercados Bompreço estava em rápida ascensão. Crescia em toda a região e buscava novas áreas para se expandir. Terrenos em esquinas movimentadas, eram raridades, como o que fica o Cassino Americano, no Pina. O industrial João Santos, falecido em 2009, era dono do terreno, mas não vendia. “Terra é coisa que não se faz mais”, dizia.

O líder do Bompreço, empreendedor João Carlos Paes Mendonça, pensava diferente. Comprar e vender sempre foram seus negócios. E começou a sondar o terreno do Casino e possível negócios. Então, uma associação de funcionários havia sido criada para os momentos de lazer dos empregados dos supermercados. O clube tinha no empresário seu presidente e responsável, dono das decisões finais, haveres e deveres.

Enfim a área do Cassino Americano foi alugada para a associação, mas não aconteceu o esperado interesse dos funcionários. Ficou sem serventia. Mesmo assim o aluguel foi renovado. No último contrato, havia cláusulas que sugeriam o direito de compra ou coisa do gênero. “Seu” Santos leu e releu o contrato, chamou o advogado, apontou a cláusula e o nome do presidente do grupo Bompreço, não assinou e com seu jeito sertanejo explicou:

- Ele é tão bestinha....

O prédio e o terreno do velho Casino estão degradados sob guarda da Justiça. Ao lado, depois da avenida Antônio de Góes, o JCPM construiu a suntuosa sede da empresa. Os moradores continuam tocando suas vidas simples e cheias de percalços sob a apropriada denominação: Brasília Teimosa.

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