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Adiar a sabatina para a vaga do STF

Maurício Rands
Advogado formado pela FDR da UFPE, PhD pela Universidade Oxford

Publicado em: 16/08/2021 03:00 Atualizado em: 16/08/2021 05:30

O conflito entre o presidente Bolsonaro e o Supremo Tribunal Federal acirrou-se na semana que passou. Depois de atacar com palavrões o ministro Barroso e desancar o ministro Alexandre de Moraes, Bolsonaro agora ameaça requerer ao Senado o impeachment dos dois sob invocação do art. 52, II, da Constituição. Fato sem precedentes. As tensões de hoje afastam-nos do equilíbrio institucional determinado pela CF de 1988, que avançou na concepção dos freios e contrapesos. O TSE pediu ao STF a abertura de inquérito contra o presidente Bolsonaro. Talvez como movimento preventivo contra a alegação de fraude antecipada por um Bolsonaro que parece prever a derrota em 2022.

Esse ambiente de tensão entre os poderes não parece ser o mais adequado para que se examine a indicação de André Mendonça para uma vaga no STF. Ele que foi advogado geral da União e ministro da Justiça de um presidente que está atacando tão violentamente o tribunal que pretende compor. Além desse ambiente radicalizado, a trajetória do indicado não parece reunir os necessários requisitos de temperança e experiência institucional. Quando era ministro da Justiça, abriu inquérito, com base na Lei de Segurança Nacional, para perseguir servidores que faziam oposição ao chefe. E portou-se como cúmplice da escalada de atentados de Bolsonaro às instituições. Agora está prometendo que agirá de modo diferente caso se torne magistrado. Há quem retenha dúvidas.

O presidente está fazendo nomeações a um tribunal contra o qual invectiva dia sim outro também. Já emplacou um dos seus, o ministro Castro Nunes que, em seus primeiros votos, já mostrou que ali está para defender-lhe os interesses e preconceitos. Agora quer emplacar mais um. Que possivelmente terá feito promessa semelhante àquela do atual presidente Luiz Fux ao governo do dia: “Mataria as investigações do mensalão no peito”. Seu desempenho no cargo, com sua linguagem empolada e vaidosa, tem sido aquém do esperado de um presidente de corte suprema. Ele que até outro dia parecia deslumbrado por se reunir com um presidente que atacava a instituição que lhe cabia defender. Como se fosse um ator político qualquer.

Num jantar na última 4ª feira, o presidente da CCJ do Senado, Davi Alcolumbre, teria concordado em pautar a sabatina de André Mendonça para o final de agosto ou início de setembro. Inflexão de um dos que mais resistiam ao indicado. Isso não quer dizer que a resistência de outros senadores tenha sido contornada. Cabe também à sociedade e à opinião pública reclamar uma melhor análise. Quem sabe chegou a hora de examinar com mais rigor os requisitos do art.101 da CF (notório saber e reputação ilibada). Esses dois requisitos deveriam ser interpretados para incluir o saber e a experiência institucional. Para ser ministro do STF, não basta decorar trechos de código. É preciso mais. Requerem-se atributos institucionais de quem vai integrar um poder que tem a última palavra sobre a constitucionalidade dos atos praticados pelos demais poderes e cidadãos.

O descaso com o rigor na interpretação da qualificação necessária para integrar o STF tem contribuído para o derretimento de sua imagem. Afinal a qualidade do atual STF já é tida como uma das mais fracas de sua história. A última nomeação não retirou o STF dessa deterioração qualitativa de seus membros. O novo indicado não parece reunir as qualidades para tanto. Quem sabe dessa vez o Senado vai cumprir com o seu papel de servir de freio a indicações que não satisfazem os requisitos? Pelo menos até que o Senado e a Câmara examinem as propostas de emendas que introduzem os mandatos temporários para os cargos do STF e aperfeiçoam os critérios para tornar mais concretas as exigências de qualificação, experiência e representatividade dos futuros membros do STF. Como a PEC 35/2015, do senador Lasier Martins (Podemos-RS), relatada pelo senador Antonio Anastasia (PSDB-MG). Ou as PEC 59/2015 e 16/2019, todas do Senado. Ou a PEC 225/2019, de autoria do deputado Paulo Ganime, que introduz novas exigências aos indicados ao STF: a de ser juiz de segunda instância ou advogado com pelo menos 10 anos de prática e mestrado na área jurídica. Que introduz o mandato de 12 anos. E determina que as escolhas também sejam iniciadas por outros poderes além do Executivo (inclusive a Câmara, o Senado e o próprio STF).

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