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Os 90 anos de Abdias Moura

Antônio Campos
Advogado, escritor, membro da Academia Pernambucana de Letras e presidente da Fundação Joaquim Nabuco

Publicado em: 05/05/2021 03:00 Atualizado em: 05/05/2021 06:12

Há autores que  inspiram por meio de suas obras, palavras, pensamentos, atitudes. Um deles, entre os pernambucanos da minha estima, é Abdias Moura. Pelo legado da sua obra como ensaísta e por sua visão do mundo, saúdo o historiador, sociólogo e poeta na passagem dos seus 90 anos.  

Abdias é daqueles que elegemos como exemplo de homem cordial, pela sua humanidade interior, na perspectiva de Sergio Buarque de Holanda, em Raízes do Brasil, tendo como virtudes a hospitalidade, a generosidade e a expansividade emocional. Dou meu testemunho na convivência, para mim, enriquecedora, que temos na Academia Pernambucana de Letras, embora a pandemia tenha nos privado ultimamente de convivência acadêmica mais próxima.

Inserido em sua ambiência pernambucana, na sua faina incansável de escrever, Abdias vem construindo, passo a passo, tijolo a tijolo, sua vasta biografia intelectual. Nela transparece a construção de um conjunto de obras de caráter inaugural no sentido exato do termo, no seu modo de abordar, analisar, interpretar. Daí justificar-se o elogio de Gilberto Freyre, Barbosa Lima Sobrinho, Gláucio Veiga, Vamireh Chacon, Nilo Pereira, entre outros.

Bacharel em sociologia pela Universidade Católica de Pernambuco e em Direito e Ciências Sociais pela Faculdade de Direito do Recife, além de livre-docente em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Pernambuco, Abdias foi professor de sociologia da UFPE. Lá, ensinou durante 30 anos em cursos de bacharelado e mestrado.

Jornalista desde os 19 anos, seguiu a carreira dos seus irmãos Adonias e Isnar Moura. Ele, famoso cronista de esportes. Ela, a primeira mulher em Pernambuco a trabalhar numa redação. Abdias foi, durante anos, editorialista do Jornal do Commercio do Recife.  

Entre os seus livros mais representativos podemos citar o Sumidouro do São Francisco, As Sociedades no Planeta Terra, A Descoberta da Harpa, Os Desamores de Benedicto, O Recife dos Romancistas e As Quatro Estações do Amor.

A intenção de estudar a sociedade brasileira a partir de um trecho geográfico expressivo no Brasil fez do livro O Sumidouro do São Francisco uma obra extensa, de potente contemporaneidade. Já está na quarta edição. Para este livro, Abdias Moura pesquisou como momento de um processo histórico, no final da década de 1970, as formas de ocupação, cultura e tradição dos moradores do local.

Estudou o homem situado em suas circunstâncias. Numa linguagem clara, despertou de imediato, o interesse do baiano  Eduardo Portella, quando ministro da Educação. Imortal da Academia Brasileira de Letras e um dos mais seletos editores do Brasil, Eduardo Portella disse na orelha do livro de Abdias. “O rio que aflora das suas páginas, impaciente e obstinado, é um personagem de carne e osso. Muito próximo daquele Mediterrâneo legendário de Ferdinand Braudel — o mar que elabora o seu próprio programa”.

A marca desse calendário de Abdias Moura, 90 anos de uma prodigiosa capacidade intelectual de trabalho, nesta hora de distâncias do próximo, em que tanto se fala de luta pela vida, merece, sim, ser comemorada e homenageada.

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