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Íbis, quanto pior, melhor

Og Marques Fernandes
Ministro do STJ e ex-repórter do Diario de Pernambuco

Publicado em: 13/04/2021 03:00 Atualizado em: 13/04/2021 06:45

Gosto de quem faz da queda um voo de pássaro e se reinventa. Daqueles que ressurgem da quase humilhação sem coitadismo. Tenho, por isso, simpatia pelo Íbis, que iniciou a sua jornada pelos campos de futebol em 1938 e transformou o drama de novela mexicana em crônica risonha de Sérgio Porto, o Stanislaw Ponte Preta.  

Nascido numa fábrica de tecelagem no bairro de Santo Amaro, no Recife, no dia da Proclamação da República, o Íbis tinha o destino dos rejeitados: com a morte do fundador, seus herdeiros não quiseram ficar com o time. O encargo foi assumido pelo gerente da fábrica, Onildo Ramos, que adotou o belo pássaro preto como símbolo.

Daí em diante, foi uma história de gloriosas derrotas nos campeonatos pernambucanos. O Íbis alternava com o Ferroviário e o Asas, nos idos de 1960, a sina de ser o último colocado. O auge desse currículo ocorreu na década seguinte, quando sofreu nove derrotas consecutivas numa série de 23 jogos sem vitórias.

Como se isso fosse pouco, o time acumulou cinco derrotas entre as maiores da competição: Náutico 11 x 0 Íbis, em 1958; Santa Cruz 11 x 0 Íbis, em 1976; Santa Cruz 13 x 0 Íbis, em 1978; Sport 11 x 0 Íbis, em 1980; e Santa Cruz 13 x 0 Íbis, em 1981. Aí começou a fama de pior time do mundo. E o mundo, curioso, gostou da brincadeira.

Perder de cinco a zero era banal. Ganhar a partida com um gol contra do adversário era honra imensa, verdadeira epopeia, notícia em todos os jornais do país. Os registros são históricos: 1 a 0 sobre o Náutico, em 1961; 1 a 0 sobre o Santa Cruz, em 1965; e 1 a 0 no Sport, em 1967, jogo, aliás, a que tive o desprazer de assistir como torcedor fanático (precisava dizer?) do outro rubro-negro.

De um time que começou como recreação para operários de fábrica, o Íbis foi capaz de revelar um bicampeão do mundo, o centroavante Vavá, da seleção brasileira de 1958 e 1962. Em 1959, quando Pernambuco representou o país no Campeonato Sul-Americano de Futebol, três jogadores do Íbis foram pré-convocados pelo técnico Gentil Cardoso: o legendário goleiro Jagunço e os atacantes Vantu e Inaldo.

A agremiação mudou-se para a cidade de Paulista e o uniforme belíssimo – com a mitológica ave grega que lhe deu o nome no escudo - é muito vendido. Faz vinte anos que não participa da primeira divisão do campeonato pernambucano, mas a internet ajudou-lhe na construção da imagem. Consta que é o quarto clube mais visitado numa plataforma. Se o clube está predestinado ao quanto pior, melhor, longa vida ao Íbis.

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