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Vacinação e alegria

Luzilá Gonçalves Ferreira
Membro da Academia Pernambucana de Letras

Publicado em: 19/02/2021 03:00 Atualizado em: 19/02/2021 05:33

As pessoas foram chegando pontualmente, logo cedo, hora marcada, na Escola Nilo Pereira, bairro do Monteiro.  Em cadeiras de rodas,  apoiados em bengalas ou no braço de um filho, filha, amigo. Após meses de confinamento, - para alguns deles era a primeira ocasião de sair, por muito tempo, de ver gente que não os familiares ou vizinhos, - cercados que estavam de notícias ruins, transmitidas pela televisão, jornais, ou conhecidos mesmos. E de repente uma boa nova: vacinar-se contra o inesperado e estranho mal, que caira sobre os humanos, uma praga, como acontecia na Idade Média, ia se tornar uma realidade.

Desde a chegada à escola, sob o olhar protetor do patrono, Nilo Pereira, nosso colega na Academia Pernambucana  de Letras, a grande fotografia estampada na parede central, a perfeita organização que, diga-se de passagem, era coisa surpreendente, em acontecimentos desse porte. E apesar de uma falha de “queda no sistema”, o bom humor dos funcionários, a delicadeza no trato, a simpatia, o encorajamento (“vai voltar logo, gente”) criava um ar digamos de felicidade, nos que aguardavam, pacientes.

E a perfeita organização, tudo funcionando em ordem, tanto no acolhimento inicial, quanto dentro do grande salão onde nos aguardavam outros funcionários, responsáveis pelo cadastro e pela aplicação da vacinas. Mas um traço marcante, nos rostos de todos, funcionários e pacientes ansiosos: a alegria. Alegria sim, juro. Deviam receber a primeira dose da vacina tão falada e aguardada, apta a afastar o mal, a tristeza, a morte talvez.

Minha filha tinha marcado a data, a hora e a vez. Dados confirmados pontualmente pela internet, com informações sobre os documentos necessários para a segunda dose. Ocasião de rever amigos, conversa descontraída e cheia de esperança: Leda Sellaro, autora de belos livros pra criança, falando de seus projetos. Mabel Ventura, linda, de cabelos brancos, o grande sorriso habitual. E até desconhecidos contando histórias, fazendo piadas. E eu lembrei o bom humor de meu pai, que quando ia receber sua pequena aposentadoria em fila de banco, dizia bem alto: Oh quanto velho feio. Ao que alguém replicava: E chegando mais.

Na Escola Nilo Pereira não havia velho feio. Arrumadinhos, penteados, certamente com as melhores roupas, a felicidade, a esperança da vida, tornava belos seus rostos, suas vozes; ao chegar em casa, esta que vos escreve deu uma olhada nas notícias da televisão, e adormeceu. Profundamente. Mas não como os parentes do poeta Manuel Bandeira. Pois despertou cinco horas depois. E não era resultado da vacina. Mas de alívio e da alegria de ter compartilhado de tão bons momentos, quando as coisas funcionaram bem, graças ao comportamento de pessoas que levam a sério o desempenho de sua profissão, os funcionários públicos tão maltratados, tantas vezes. Parabéns a eles todos e à Prefeitura do Recife.

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