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Agenda econômica: sonho e realidade

Alexandre Rands Barros
Economista

Publicado em: 12/09/2020 03:00 Atualizado em: 12/09/2020 06:36

A agenda econômica atual para os diversos indivíduos e segmentos sociais difere. As prioridades flutuam entre sonhos inatingíveis e a realidade. Como principais sonhos atuais, comumente encontram-se: (i) a retomada rápida da economia, com uma boa queda da taxa de desemprego; (ii) expansão da política social (programa Renda Brasil forte e generoso); (iii) expansão dos investimentos públicos, com retomada de obras paradas; (iv) manutenção da inflação e taxa de juros em níveis baixos; e (v) recuperação das empresas, com desafogo nos seus balanços através de redução do endividamento atual. Se posta como desafio, essa agenda dos sonhos pode ser atingida em algum grau, mas talvez não no nível dos sonhos da maioria. Contudo, ela apresenta contradições que são difíceis de compatibilizar. A agenda para inflação e juros, balanço empresarial e retomada rápida de emprego exigem consistência fiscal e por tal austeridade do setor público. Sacrifícios dela podem até ter algum resultado positivo de curto prazo, mas logo reverterá esse efeito por prazos mais longos (vide governo Dilma). Renda Brasil e investimentos públicos, por sua vez, atentam contra essa austeridade. Diante disso, as possíveis soluções óbvias para compatibilizar essa agenda dos sonhos são: (ii) aumentar a arrecadação; (ii) reestruturar gastos, reduzindo os que não fazem parte da agenda e direcionando recursos para as prioridades; (iii) reduzir ativos do setor público (privatização).

Os gastos públicos no Brasil concentram-se principalmente em (i) cobertura do déficit previdenciário; (ii) remuneração a funcionários públicos; (iii) pagamentos de juros sobre a dívida pública; (iv) gastos sociais (transferências, saúde e educação). Por isso precisávamos de: (i) reforma da Previdência (realizada, mas insuficiente); (ii) reforma administrativa (proposta e insuficiente); (iii) redução da dívida, a partir de superávits primários e privatizações. A dívida ainda está aumentando, apesar de se ter conseguido reduzir a taxa de juros. Gastos sociais estão entre as prioridades. Daí, não fazer sentido querer reduzi-los com vistas a conseguir aumentá-los. Entre essas possibilidades, privatizações talvez sejam a única política que não encontra fortes resistências, mas tem alcance limitado. As duas outras já foram tentadas e resultaram insuficientes por causa das pressões corporativas.

Daí a necessidade de um pequeno aumento de impostos. Mas, preferencialmente, sem inventar moda, como propõe o ministro da Economia. Basta criar uma faixa a mais no Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF), reintroduzir a correção monetária na mensuração da rentabilidade dos ativos financeiros e incluir sua tributação nas regras do IRPF, e elevar as contribuições previdenciárias para quem recebe salários superiores a dez salários mínimos e está no Regime Próprio de Previdência Social, pois esse possui déficit estrutural de longo prazo elevado. Enquanto isso, a reforma tributária, que não resolve nada na agenda atual, deve ser feita de uma vez só, mas com regras amenas de transição, pois é necessária dentro de uma agenda de longo prazo para a elevação da produtividade. Se feita para vigorar em 2021 ou mesmo 2022, será conduzida com olhos na agenda fiscal de curto prazo e poderá gerar um caos. A consequência será mais recessão e crescimento lento. Tudo o que não precisamos no momento.

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