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Eu, Tonico e o Diario

Eu, Tonico e o Diario
Escritor e historiador

Publicado em: 06/08/2020 03:00 Atualizado em: 06/08/2020 06:00

Nesses dias que nos separam do Dia dos Pais, me vem à lembrança a figura de Antônio Machado Gomes da Silva, presença de homem simples, mas vocação de pai que me guiou nos meus passos.

Se eu disser a alguém que aprendi a ler nas letras do Diario de Pernambuco, por certo irão duvidar da minha afirmativa.

Pois é; na verdade fui alfabetizado aos quatro anos de idade tendo por auxílio as letras recortadas das manchetes deste Diario de Pernambuco!

A aventura de ser alfabetizado antes do tempo previsto pelos pedagogos de então, devo ao meu pai Tonico Silva.

Na sua maneira simples de enfrentar desafios, Tonico confeccionou, na sua oficina do fundo do quintal, algumas dezenas de cubos de madeira, com cerca de três centímetros de lado cada um e, neles, colou letras recortadas das manchetes deste jornal.

Com a paciência que lhe era peculiar iniciou a sua tarefa de alfabetizador pelas cinco vogais passando, logo depois, para as demais letras do alfabeto.

Juntando os cubos foram sendo formadas palavras simples, em uso no meu dia a dia.

Primeiro as monossílabas: pá, pé, sol, lua, cão...; seguiram-se as dissílabas – ovo, uva, pato, bola, faca, facão, dedo, dedal, bote, gato, rato, dado ...; as trissílabas – galinha, cavalo, cachorro, jabuti, macaco, peteca... –; até as mais “complicadas” formando assim, as pequenas e mais simplórias frases

Graças ao singular processo, ia eu visualizando e decorando os vocábulos que logo se transformavam em frases que, reunidas, davam origem a pequenos textos.

A minha mãe, Ilidia Barbosa Dantas da Silva, que era professora primária, vendo a experiência, logo adquiria a cartilha Brincar de ler – Livro de figuras (Edições Melhoramentos, 1949) que, juntando-se aos cubos de madeira, veio proporcionar uma maior dinâmica no aprendizado.

Pouco tempo depois, para alegria de Tonico e Ilidia, estava eu lendo tudo que me surgia diante dos olhos; “falando como um papagaio”, exibindo-me diante dos amigos e familiares.

Alfabetizado sim! Mas bem antes do tempo previsto pelos educadores dos anos cinquenta do século passado (!) Estava eu matriculado no Jardim da Infância da Escola Experimental Governador Barbosa Lima, onde às demais crianças da minha classe, longe estavam da alfabetização. Tornei-me assim o patinho feio de minha turma e, se não fosse a paciência e o devotamento de Dona Ivone Correia, minha primeira professora, o sentimento de rejeição teria sido bem maior.

Hoje, neste ano em que completo setenta e cinco anos, posso sentir bem próxima essa ligação umbilical com o Diario de Pernambuco, desde os quatro anos de idade, quando comecei a brincar de ler.

Hoje, depois de tanta estrada, aqui me encontro escrevendo o primeiro capítulo das minhas memórias neste mesmo Diario de Pernambuco, o jornal diário mais antigo em língua portuguesa, onde ingressei no seu corpo de redatores em julho de 1974 e com o qual continuo a colaborar nos tempos presentes.

A primeira cartilha, Brincar de Ler..., é hoje o volume nº 00001, da minha biblioteca no mesmo local onde nasci e fui criado, Rua Marquês de Maricá nº 73, Torre; os livros por mim escritos e publicados já somam 55 títulos, mas a minha gratidão aos meus primeiros Mestres, Tonico e Ilidia, se faz presente nas orações por mim proferidas no despertar de cada dia.

Neste Dia dos Pais, desse atropelado ano de 2020, as minhas saudades desses Anjos Tutelares que, pela Graça de Deus, vieram marcar a minha existência.

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