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Esquerda e direita - Novos fundamentos

Alexandre Rands Barros
Economista

Publicado em: 01/08/2020 03:00 Atualizado em: 01/08/2020 05:57

Em artigo recente (NBER WP # 27511, 2020), os professores Benjamin Enke (Harvard), Ricardo Rodríguez-Padilla (Harvard) e Florian Zimmermann (Bonn) aprofundam a análise das diferenças entre esquerda e direita e explicam porque adeptos da primeira tendem a defender mais ajuda externa, ações afirmativas, proteção ao meio ambiente, políticas públicas de saúde e de bem-estar social (welfare payments), enquanto pessoas mais à direita tendem a defender relativamente mais controle de fronteiras, investimentos/gastos militares e com a polícia. Obviamente, o estudo objetiva entender essas diferenças em países ocidentais desenvolvidos (E.U.A., Alemanha, França, Suécia e Austrália). No entanto, estendem a análise ao Brasil e Coreia do Sul, como países fora desse grupo. Uma primeira conclusão é que há muita homogeneidade de preferências nos espectros políticos dos diversos países desenvolvidos analisados. O estudo é feito a partir de questionários com cerca de 15 mil indivíduos distribuídos pelos diversos países.

Os autores, a partir de modelo teórico de escolha racional, mostram que pessoas com mais altruísmo e maior nível de confiança nos outros, ambos de forma universal, tendem a ser mais de esquerda e a preferir as políticas listadas acima que são maior alvo de simpatia da esquerda. A forma universal diz respeito a altruísmo e confiança dedicados a todos, não apenas aos indivíduos de maior proximidade social, como família, amigos, relacionamentos profissionais, etc. Esse conceito classifica todos os indivíduos em um contínuo, em que cada um pode estar em qualquer ponto entre as extremas esquerda e direita. Essa associação teórica se confirma nos estudos empíricos conduzidos nos países desenvolvidos listados acima. No Brasil e na Coreia, há algumas mudanças de postura em alguns desses itens, apesar de quando eles separam a amostra somente para os indivíduos mais educados, o comportamento passa a ser semelhante ao dos países desenvolvidos.

Em livro a ser publicado ainda este ano (A Esquerda Hoje, Alta Books), identifico o maior altruísmo como o sentimento relevante para comprometer indivíduos com posição mais à esquerda, também utilizando a ideia de um contínuo no espectro político. Os autores adicionam a importância do nível de confiança, mas reconhecem, inclusive a partir de estimações estatísticas, que há uma correlação elevada entre os níveis universais de altruísmo e confiança generalizada. O altruísmo define quanto um indivíduo se dispõe a cooperar com seus semelhantes, enquanto a confiança reflete o quanto ele espera que os demais venham a cooperar com ele. Em um linguajar mais popular, pode-se dizer que as pessoas mais de esquerda são mais bondosas, generosas, mas talvez mais ingênuas, pois acreditam muito na bondade alheia. Os mais de direita são mais egoístas, talvez como defesa por não terem segurança de acreditar na bondade alheia. Obviamente as fake news sobre os indivíduos de esquerda comerem criancinhas, não acreditarem em Deus, quererem confiscar tudo que os indivíduos possuem, etc, tendem a tornar declaradamente de direita, ou de centro, pessoas que na verdade possuem forma de ver o mundo típica dos de esquerda.

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