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Homenagem ao duplo centenário de Celso Furtado e Florestan Fernandes

Tiago Macedo Bezerra Maia
Professor no IFPE. Especialista em ensino da filosofia. É um dos autores colaboradores da trilogia Celso Furtado: a esperança militante, que está sendo publicada neste ano

Publicado em: 25/07/2020 03:00 Atualizado em: 25/07/2020 05:21

2020 é o ano em que dois dentre os maiores nomes do pensamento social brasileiro do século 20, se vivos, estariam comemorando, cada qual em seu dia neste mês de seus nascimentos, um século de vida, Fernandes, em 22/07, e Furtado, em 26/07. Mas não é apenas esta coincidência relativa ao ano de 1920, em que ambos nasceram, que sugere e anima a escrita desta modesta, porém sincera homenagem a tão brilhantes intelectuais.

Celso Furtado (1920 – 2004), nascido no Sertão paraibano, e Florestan Fernandes (1920 – 1995), na capital paulista, levaram sempre consigo, em suas vidas, o mais profundo e humano respeito às lembranças das dificuldades e sofrimentos de suas infâncias. Conheceram desde cedo, assim, a dura e desigual realidade social brasileira.

E foi com o olhar nesses cenários dos seus tempos de criança, que lançaram um esperançoso foco nas possibilidades de transformação sociocultural e econômica do Brasil. Esta perspectiva transformadora viria nortear suas vidas adultas.

As reflexões destes centenários expoentes da intelectualidade tupiniquim, referenciados e legitimados como tais, nacional e internacionalmente, proporcionaram, Furtado, para a economia e Florestan, para a sociologia, ao aliarem teoria e prática, pensamento e ação, uma outra forma de se fazer ciência e de ser cientista, legando a economistas e sociólogos novidades até hoje atuais e que se interpenetram e dialogam, provendo inovadoras lentes para o enfrentamento de problemas clássicos cruciais de suas respectivas áreas de atuação.

Rigor metodológico e científico, modernização, subdesenvolvimento, mudanças sociais, relações centro-periferia, interdisciplinaridade, industrialização, estruturas do tecido social, dependência econômica, técnica e cultural, interações sociais e modo de vida da burguesia no capitalismo, questões e relações raciais, democratização da ciência e acesso à educação pública, manifestações culturais populares e a valorização da importância destas para os processos de formação da identidade sociocultural brasileira e para as possibilidades de um autêntico desenvolvimento do Brasil, por exemplo, figuram dentre vários outros temas que estiveram presentes frequentemente nas suas reflexões e sempre foram revisitados em seus escritos.

Tais tematizações aparecem em suas obras, por vezes mais enfaticamente, em outras vezes mais brandamente, a depender dos seus focos escolhidos para adentrar e desvelar o objeto de análise de ambos: a realidade social. E os dois, cada um ao seu modo, assim enfrentaram, como contemporâneos, os dilemas da ciência e da sociedade de seu tempo.

É valioso sublinhar aqui, inclusive, quase que em simultâneo, o paulistano militaria na causa do movimento negro como deputado Constituinte (1986–1988) e o paraibano, na causa da cultura popular, como ministro da Cultura (1986–1988).

E estes temas e engajamentos de ambos, de forma respectiva, vieram a se tornar as agendas principais de suas vidas públicas na política. Esperançosos na mudança social, hoje ecoam suas lutas pela integração racial e pela independência cultural, suas lições pela transformação socioeconômica muito inspiram e urge revisitá-las hoje. Nisso se mostra a pungente atualidade de ambos.

Parabéns Celso Furtado e Florestan Fernandes por seus tão iluminadores legados neste seu ano centenário de 2020!

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