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Imigração portuguesa, nos tempos da cólera

Leonardo Dantas Silva
Escritor e historiador

Publicado em: 21/05/2020 05:30 Atualizado em:

Quando da extinção do comércio de escravos, entre o Brasil e a costa da África, em 1850, a escassez de mão-de-obra destinada à lavoura provocou uma verdadeira crise econômica, agravada pela epidemia do cólera-morbo.

Tal epidemia chegou ao Brasil em maio de 1855, trazida por passageiros da barca Defensora, que naquele mês aportou em Belém do Pará procedente da cidade do Porto, espalhando-se, assim, por outras províncias.

Só no Recife, entre 29 de janeiro e 1º de maio de 1856, registraram-se 3.338 óbitos, para uma população estimada em 60.000 habitantes. Desses mortos, 78% pertenciam à população de cor. Em toda a Província de Pernambuco, segundo estatística oficial, foram computados 32.586 mortos.

A imigração portuguesa, originária muito em particular das ilhas do Atlântico (Açores, Madeira e Cabo Verde), e, em menor escala, do Norte de Portugal, tornou-se necessária a fim de suprir a falta de mão de obra no Nordeste de então.

Com a vinda em grandes levas dos portugueses, surgiu um novo tipo de atividade, a dos contratadores de imigrantes que, mediante o adiantamento de 100$ (cem réis) para cada adulto embarcado, recebiam na chegada do navio ao Brasil, da parte dos proprietários rurais contratadores, a importância de 120$ por cada trabalhador.

Tratava-se uma de uma espécie de escravidão branca, encoberta por contrato de locação de serviços feito por um prazo nunca inferior a quatro anos, com base na lei de 11 de outubro de 1837, conforme notícia do Diario de Pernambuco de 14 de novembro de 1844.

Avisos diversos – Quem precisar de feitores para sítio, engenho, caixeiros, jardineiros ou homens para qualquer serviço braçal, todos chegados proximamente da Europa e que se acham em circunstâncias de fazerem o contrato de locação de seus serviços segundo a lei de 11 de outubro de 1837, dirija-se ao [Bairro do] Recife, rua da Cruz n.º 23, que achará com quem tratar.

Tais contratos de prestação de serviços obrigavam os portugueses aqui chegados a trabalharem por um prazo determinado, nunca inferior a quatro anos, para certo patrão. Caso houvesse quebra do acertado e o contratado resolvesse abandonar tal emprego, seu nome era publicado na imprensa e procurado como escravos fugidos, segundo se depreende de anúncios colhidos nas páginas do Diario de Pernambuco.

27 de janeiro de 1845 – Avisos diversos – Na tarde do dia 4 do corrente, fugiram do engenho Suassuna, 17 engajados, filhos da ilha de São Miguel, dos quais já se acharam nove e faltam ainda os oito seguintes: Francisco Cosmo de Viveiros, Francisco do Rego Alecrim, Francisco Luís de Aguiar, João Nunes, João Jacinto, José Cabral, Manoel Carvalho Souza e Manoel José, vindos no patacho Alberto, chega a este porto em outubro do ano passado, em cujo tempo os ditos foram engajados por espaço de quatro anos, segundo escritura pública feita pelo escrivão Guilherme Patrício, em virtude do que se previne ao público para que ninguém se chame à ignorância, admitindo-os em seu serviço, pois se procederá conforme a lei contra quem lhes der asilo ou se utilizar de seus préstimos, assim como se recompensará a quem os fizer conduzir ou der notícia deles no sítio Pombal, ou na rua Larga do Rosário, loja do senhor Lody. Roga-se mais às autoridades policiais a captura de ditos engajados, prendendo-os onde quer que se acham, e não consentindo que se retirem da Província.

De tal rede de recrutamento de mão de obra clandestina, visto que grande parte dos que eram transportados para o Brasil vinham na ilegalidade sem os respectivos passaportes, participavam capitalistas, capitães de navios e altos funcionários públicos, a quem caberia fazer vista grossa ao novo sistema de tráfico de escravos brancos, como era denominado pela imprensa; segundo observa José Antônio Gonsalves de Mello (Diario de Pernambuco – Economia e Sociedade no Segundo Reinado – Ed. Universitária UFPE, 1996).

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