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A pandemia do coronavírus no Brasil

Dirac Moutinho Cordeiro
Doutor em Engenharia Civil

Publicado em: 08/04/2020 03:00 Atualizado em: 08/04/2020 10:01

O coronavírus (SARS-CoV-2) faz parte de uma grande família viral, conhecida desde meados dos anos 1960, a qual causa infecções respiratórias em seres humanos. Geralmente, infecções por coronavírus causam doenças respiratórias (leve ou moderada), semelhantes a um resfriado comum. Alguns dos coronavírus podem causar síndromes respiratórias graves, como a Síndrome Respiratória Aguda Grave, que ficou conhecida pela sigla SARS da síndrome em inglês Severe Acute Respiratory Syndrome. A SARS é causada pelo coronavírus associado à SARS (SARS-CoV), cujos primeiros relatos na China se deram em 2002. O SARS-CoV se disseminou rapidamente para mais de doze países na América do Norte, América do Sul, Europa e Ásia, infectando mais de 8 mil pessoas e causando cerca de 800 mortes (10%) – isso se deu antes da epidemia global de SARS ser controlada em 2003. É importante dizer que, desde 2004, nenhum caso de SARS tem sido relatado mundialmente.

A Covid-19 tem uma característica bastante peculiar, a saber: a forte correlação positiva com a exposição social dos indivíduos. Dependendo do grau de exposição, um indivíduo pode infectar no mínimo três a um máximo de 400 pessoas. Ainda não dispomos no Brasil, contudo, de uma base de informação tanto quantitativa como qualitativa para inferirmos estatísticas robustas capazes de prognosticar notificações positivas, negativas ou letais no decorrer dessa pandemia. Apesar disso, os gráficos e as tabelas disponíveis até o momento, referentes ao número de notificações positivas ocorridas nos diversos países da pandemia, nos mostram que o vírus realmente poderá produzir um escabroso colapso na saúde pública do Brasil. As taxas de crescimento das notificações positivas por dia da Covid-19 (NPD) nos diversos países são estarrecedoras. Na China, chegou-se a 2.144 NPD até atingir um assintótico de 81 mil notificações positivas em um espaço de apenas 55 dias – lembre-se de que a China se antecipou em quase 15 dias à infestação do vírus, e cancelou coercitivamente o seu maior evento festivo (o ano novo chinês, cujo início se deu no dia 15 de janeiro 2020).

Atualmente, na China, as taxas de notificações são significativamente decrescentes, e hoje não se registra mais nenhum caso pela população residente. Outros países asiáticos – tais como, Japão (17 NPD), Singapura (5,6 NPD) e Hong Kong (2,7 NPD) – conseguiram em um período de 30 a 40 dias controlar as notificações positivas. A qualidade no controle desses países teve uma resposta positiva na redução mais rápida na NPD, bem como no índice de letalidade, mesmo tendo um percentual de idosos expressivo na população. Já a Coreia do Sul foi atingida com uma infestação bastante aguda nos primeiros 15 dias, chegando a uma taxa de 336 NPD. No entanto, através de uma campanha rigorosa e agressiva para combater o vírus, ela conseguiu estabilizar a NPD num espaço de tempo de 35 dias. A Coreia do Sul disponibilizou todo o seu sistema de saúde para diagnosticar a presença da Covid-19 nos habitantes de áreas críticas do país. Logo após essas ações, a NPD caiu 27% e atualmente continua a decrescer.  Já a Itália, talvez por não acreditar na virulência da Covid-19, se transformou num caos incomensurável em notificações positivas e no tocante à letalidade. Observa-se, ainda, uma certa distância para atingir o ponto de inflexão da curva, a qual continua a crescer mesmo a taxas menores.

No caso do Brasil, mesmo com poucos dados até o momento, é bastante sugestivo afirmar que o vírus chegou por aqui em meados de janeiro, isto é, antes do carnaval. Existem vários modelos que podem explicar com rigorosidade o comportamento das séries temporais epidemiológicas. Em todas as curvas das NPDs analisadas, observa-se que o primeiro ramo das curvas se comporta com similaridade exponencial. A curva que deve explicar o comportamento das notificações da Covid-19 no Brasil não deve fugir dessa regra. No entanto, quando essa pandemia chegou aqui já havia especialistas preparados porque conheciam os comportamentais provocados pelo vírus. Além disso, os médicos infectologistas têm uma vasta experiência nesses agravos, pois frequentemente são demandados nas recorrentes epidemias que assolam o nosso Brasil. Ao mesmo tempo, a falta de higiene provocada pelas condições sanitárias precárias pode ser uma variável relevante para o crescimento acelerado das notificações positivas da Covid-19, mas os números são difíceis de estimar para um determinado horizonte temporal.  

Vamos voltar ao caso da Itália: a sua população é de aproximadamente 60 milhões de habitantes. Se estimarmos simploriamente com base no mesmo crescimento das NPDs em relação à população italiana, teríamos como limite superior para o Brasil algo em torno de 40 mil notificações positivadas num espaço temporal de mais ou menos de 55 dias. Vale salientar que, nos últimos vinte anos, enfrentamos epidemias com mais de 400 mil notificações no período de três anos. É o caso do exemplo da dengue, a qual persiste até hoje em crescente endemia. E, há quase cinco anos, a epidemia da zika trouxe para as famílias brasileiras uma dor interior intangível. Passamos por tudo isso e sobrevivemos. A pandemia atual é realmente muito grave, com resposta muito negativa e avassaladora para a economia; uma conectividade sem precedente. A única forma de combatê-la efetivamente se dá a partir do cuidado com a higiene e o isolamento social das pessoas. E, sem a vacina, não há outra solução.

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