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O coronavírus e a ameaça ao sonho europeu

Fábio Jardelino
Jornalista e doutorando em Ciências da Comunicação em Portugal

Publicado em: 03/03/2020 03:00 Atualizado em: 03/03/2020 08:41

Nas últimas semanas novos casos do coronavírus foram confirmados no continente europeu, aumentando as tensões dentro da União Europeia (UE) num possível risco de cisão dentro do bloco econômico. Além da crise epidêmica que a doença pode causar, existe outro possível risco: o fim do Espaço Schengen como o conhecemos. Desde 1985, quando o acordo foi assinado em Luxemburgo, os Estados Membros do Bloco Europeu deram os primeiros passos para abolir de vez as fronteiras e o controle de passaporte entre seus territórios. Até hoje essa é considerada uma das maiores realizações da UE, junto à implementação do Euro e do acordo de livre comércio. Schengen, porém, tem recebido mais e mais críticas por parte de políticos – principalmente os conservadores – dentro da UE, que agora usam o clamor popular criado pelo coronavírus para municiar seus discursos vigorosos contra a livre fronteira.

Mas essa não é a primeira vez que o Espaço Schengen corre risco. Muito antes do vírus, políticos nacionalistas, principalmente o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orban, condenam e afirmam que as fronteiras europeias são fracas e desprotegidas. Esses ataques contra Schengen ficaram mais sérios depois de 2015, quando alguns países o suspenderam temporariamente para impedir o avanço dos recém-chegados refugiados. Isso porque, dentro do acordo, existem regras que podem ser manobradas em casos excepcionais que ofereçam risco aos cidadãos. Uma justificativa para essas medidas, por exemplo, foram os casos de terrorismo que aconteceram em países como França e Alemanha. Desde os ataques, ambos implementaram uma política de controle de passaporte em suas fronteiras. Não impedindo, porém, a circulação de turistas ou cidadãos de outros países europeus, apenas operando como uma checagem de passaporte numa busca contra irregularidades.

Com a ameaça crescente do coronavírus na Itália, que já soma 20 mortes e mais de 800 casos confirmados da doença, políticos nacionalistas franceses passaram a atacar fortemente o acordo. Discursos pedindo que o controle nas fronteiras seja fortalecido antes da chegada do contágio são cada vez mais normais em Bruxelas, centro político da UE. E o timing dessa nova crise não poderia ser pior – faz pouco mais de um mês que o Brexit aconteceu, enfraquecendo ainda mais o Bloco. Os próximos capítulos dessa novela só saberemos futuramente. O que podemos analisar hoje sobre essa situação é que a livre fronteira europeia está severamente ameaçada e dessa vez o clamor popular, provocado por um contágio epidêmico de alto risco, pode ser o grande diferencial nessa batalha. O sonho europeu pode estar por um fio.

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