Diario de Pernambuco
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De mandacaru e de palmeiras

Vladimir Souza Carvalho

Publicado em: 22/02/2020 03:00 Atualizado em: 23/02/2020 09:30

O mandacaru não aflora mais na ladeira, porque prefere nascer em sítio plano. Pelo menos, foi o que constatei, indo e vindo, de ônibus, de Salvador a Jequié, até um pouco antes de Feira de Santana. Nunca vi tanto mandacaru em minha vida, em percurso de mais de cem quilômetros. Até onde a vista alcança, o mandacaru se ergue, em área pavimentada de arbustos e/ou de vegetação rasteira. São dois os tipos. Um, que muito vi em Itabaiana, cujos espinhos, relativamente grandes, tia Madrinha usava ao fazer renda, o fruto vermelho parecendo bola de sinuca. O outro, que lá não tínhamos, cujos galhos imitam um castiçal de cor verde.

Acredito que seja esse o que aflorava na ladeira, flor branca, que, nessa viagem, não apareceu. Só o verde, mais escuro, caule fino, envergado, enquanto o outro, o de minha infância, se apresenta mais gordo e reto, com espinhos maiores. Ao todo, a vista cansou de mandacaru, enfiado no chão, sozinhos ou acompanhados de outros, com a triste sina, que o segue há milênios, de não fazer sombra, nem permitir que ninguém nele se encoste. O número é tão grande que, uma cerca, embora pequena, de seus galhos, foi feita. Em Feira de Santana, em dois telhados, alguns imperam, orgulhosos de estarem no alto.

Deve ter sido o passarinho que plantou o mandacaru, mastigando o fruto e deixando-o cair aqui e ali, ajudado pelo vento. O homem é que não responde por tal façanha, nem eu, que, até hoje, nunca toquei na sua semente, nem faço ideia de seu formato, e, ademais, por ali só fiz passar.

Mas, não é só o mandacaru que a região aludida exibe. As palmeiras, - são tantas -, se fazem presentes, uma delas gerando a impressão de se cuidar de pé de ouricuri, o dicuri dos meus tempos de menino, algumas com tronco alto, outras ainda pequenas, as folhas no seu verde escuro, a se balançar quando o vento dá as caras e lhes empurra, se sustentando no chão, sem sofrer influência negativa ou positiva da vegetação que lhes cerca, em alguns pontos.

O mandacaru e a palmeira não dependem da chuva para sua sobrevivência, e assim, bendita seja a caatinga que lhes serve de berço e os mantém, em meio à modéstia de sua vegetação e da imensidão de terras %u2013 ocupadas -, quase sem serventia, pelo que tudo me despertou à atenção. * Magistrado

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