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Editorial Um plano oportunista

Publicado em: 31/01/2020 03:00 Atualizado em: 31/01/2020 10:32

O plano de paz para o Oriente Médio — leia-se Israel e Palestina — proposto pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, pode ser considerado oportunista e até fora de propósito, pois não envolveu uma das partes, justamente a mais fraca, representada pelos palestinos, que lutam há muito tempo pela criação de um Estado nacional. Elaborar uma proposta de paz em que um dos lados interessados não é chamado para as negociações é o mesmo que impor, à força, o ponto de vista defendido pelo outro lado, no caso, o Estado judeu.

Foi com pompa e circunstância que o mandatário norte-americano apresentou seu plano, ao lado do primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, mas sem a presença de quaisquer representantes palestinos, que, de imediato, refutaram o projeto. A Autoridade Palestina, que administra a Cisjordânia, e o movimento Hamas, que ocupa a Faixa de Gaza, rejeitaram a proposta e conclamaram as populações dos enclaves por eles controlados a resistir, o que certamente provocará mais violência na já conturbada região.

Não aceitam, terminantemente, a anexação de territórios por parte de Israel, o que é previsto no plano de Trump. Na realidade, o presidente dos EUA deu tudo o que os israelenses sempre almejaram, ou seja, o reconhecimento dos assentamentos judeus na Cisjordânia e a anexação do Vale do Jordão. Além do controle da milenar Jerusalém por Israel, o que também é rejeitado pelos palestinos. Para eles, o que está sendo proposto é algo parecido aos guetos nos quais o regime do apartheid sul-africano mantinha os negros enclausurados.

Tudo leva a crer que o anúncio do plano de paz na Casa Branca foi e continua sendo bastante oportuno, tanto para Trump quanto para Netanyahu, às voltas com a renovação de seus mandatos. O líder norte-americano enfrenta momento político delicado, com o processo de impeachment no Senado em ano de eleições. Ao retomar uma agenda positiva sensível ao seu eleitorado, joga uma nuvem de fumaça nas acusações de seus adversários. Além disso, afaga a comunidade judaica que o apoiou no último pleito. O primeiro-ministro de Israel, por seu lado, que tenta se eleger para o terceiro mandato, na próxima segunda-feira, está prestes a ser julgado pela prática de corrupção.

O governo brasileiro, no que está sendo considerado por analistas uma atitude açodada, divulgou nota em apoio à iniciativa de paz. Entendem que o Brasil deveria se manter distante de questões políticas de região explosiva como o Oriente Médio para se manter fiel à tradição de sua política externa. Historicamente, o Itamaraty defende negociações diretas entre palestinos e israelenses que garantam a coexistência pacífica de dois Estados — Israel e Palestina — , o que não deve acontecer, na atualidade, porque uma das partes rejeita o plano proposto por Trump. Mais: a posição do Brasil pode interferir nos negócios com os países árabes, importantes parceiros comerciais que já se manifestaram contrários à transferência da embaixada brasileira para Jerusalém, aventada pelo Palácio do Planalto. O que não seria nada bom para as combalidas contas externas do país.

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