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Nossas relações internacionais

Alexandre Rands Barros
Economista, PhD pela Universidade de Illinois

Publicado em: 04/01/2020 03:00 Atualizado em: 06/01/2020 09:22

2019 foi um ano marcado por uma grande inflexão nas nossas relações com o resto do mundo. Abandonou-se a visão multilateralista em que a Europa e os países fora do pequeno grupo de desenvolvidos estavam no centro das atenções, e voltou-se à estratégia de seguir um líder, no caso os Estados Unidos da América. Além disso, houve também grande mudança na posição do país quanto às grandes pautas civilizatórias internacionais, que têm unido os povos nos anos recentes, como a defesa do meio ambiente, multilateralismo nas decisões internacionais e respeito às minorias. Além disso, persistiu a queda da participação dos manufaturados nas nossas exportações e de fato reduziu-se o papel do fluxo de comércio internacional no PIB brasileiro. Tornamo-nos mais isolados.

A crise geral na economia latino-americana, principalmente na Argentina certamente foi fundamental para explicar a queda da participação das exportações de manufaturados, e até mesmo a queda no comércio como um todo. Alguns alegam que as disputas comerciais entre China e EUA também teriam papel importante na queda das exportações em geral, mas principalmente de bens primários, tendo prevalecido o desvio de compras da China para os EUA, como forma de tentar apaziguar a fúria americana. Mas também caíram exportações para a Europa e África. Ou seja, as perdas de comércio foram bem mais generalizadas do que aponta a hipótese de problemas focais. Talvez nossas perdas escondam outros determinantes, que não estão sendo tratados.

Vivemos em um mundo em que a tecnologia se desenvolve muito rapidamente. Por um lado, esse fato tem feito com que a participação de produtos primários nas exportações não seja mais um indicador de atraso tecnológico. Produtos como soja, milho, e mesmo carnes, atualmente possuem um componente tecnológico elevado, podendo às vezes ter mais tecnologia embutida do que produtos industriais. Por exemplo, a uva de mesa pode conter mais tecnologia no seu valor agregado do que o vinho, que é um produto industrial, originado da uva. Entretanto, tal perda de conteúdo tecnológico relativo parece ser o principal fator que tem impactado perversamente a competitividade dos produtos brasileiros, com exceção de alguns setores específicos, em que ainda possuímos liderança tecnológica. Esses geralmente estão no setor primário, apesar de automóveis e aviões ainda fazerem parte importante de nossa cesta de exportações competitivas.

Os dados disponíveis mostram que o Brasil tem perdido produtividade total dos fatores (PTF) ao longo dos últimos anos. Em 2018, nossa PTF era de apenas 89% do seu valor em 2010 (Dados do Total Economy Database, Conference Board). Qualquer aumento em 2019, se tiver havido, foi ainda muito pequeno. Na chamada nova década perdida (2010-2019), o Brasil aumentou sua defasagem tecnológica em relação ao resto do mundo. As barreiras ao comércio, além da perda de qualidade relativa do nosso ensino (estagnamos no desempenho de nossos alunos no PISA), aumento da burocracia e pressão do governo sobre as empresas, reduziram bastante nossa capacidade de desempenho econômico. Ou seja, a economia brasileira realmente está andando para trás. O Brasil precisa reduzir as barreiras, tarifárias e não tarifárias, ao comércio internacional com vistas a forçar a incorporação de tecnologia e mudar a remuneração relativa do fator de produção de conhecimento. Isso estimulará o aumento da produtividade total dos fatores e irá acelerar o crescimento econômico no país. Tal política não será solução para todos os nossos males, mas poderá atenuar um pouco a nossa letargia econômica. O custo operacional do comércio internacional brasileiro é um dos maiores do mundo. Esse problema tem que ser atacado logo. Há percepção de sua relevância no Ministério da Economia e vontade de reduzi-lo. Resta saber se 2020 será um ano bem-sucedido nessa cruzada. 

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