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Livro de Alexandre revoluciona a explicação das desigualdades regionais

Maurício Rands
Advogado formado pela FDR da UFPE, PhD pela Universidade Oxford
twitter: @RandsMauricio

Publicado em: 20/01/2020 03:00 Atualizado em: 20/01/2020 11:28

O economista Alexandre Rands acaba de publicar seu mais novo livro – Raízes das Desigualdades Regionais no Brasil. Com fartura de dados e análises estatísticas em modelos econométricos, ele dá continuidade aos seus estudos sobre o tema a partir da percepção de que a persistência dessas desigualdades é poderoso inibidor do desenvolvimento brasileiro. Mede desigualdade regional a partir de duas variáveis: PIB per capita e pobreza relativa. No primeiro indicador, o Nordeste aparece com apenas 51,2% do brasileiro, 39,7% do Sudeste, 43,5% do Sul, 40% do Centro-Oeste e 81,7% do Norte.

Comparado com o PIB per capita de São Paulo, os dos estados do NE variam entre 26% (MA), 38% (PE, RN) e 39% (SE). Na segunda variável, a pobreza relativa, novamente o Nordeste aparece mal na fita. Vivem abaixo das necessidades de demanda básica de uma pessoa e seus respectivos custos, 21,4 % de sua população. Contra 17,4% no N, 11,9% no SE, 11,4% no CO, 4,1% no Sul, e 13,9% no Brasil como um todo.

Ele faz simulações com modelos estimados a partir das principais determinantes da desigualdade regional segundo a teoria ortodoxa: disponibilidade de capital humano, diferenças de custo de vida (preços locais), e diferenças de esforço produtivo (especialização produtiva).  Conclui que esses três fatores respondem por 100% das disparidades regionais no Brasil. Utilizando uma metodologia de regressões para decomposição de cada determinante das desigualdades, ele prova que, dentre eles, o papel do capital humano é o mais relevante, sendo pequenos o das determinantes esforço produtivo e custo de vida. Demonstra, então, que ‘os demais fatores de produção, capital físico e recursos naturais, além de produtividade total dos fatores, não são relevantes para explicar as desigualdades regionais’.

Até 1768, o Nordeste teve um PIB per capita maior que a média brasileira. A partir desse ano, caiu abaixo da média nacional, com a assunção da liderança pelo Sudeste em virtude da atividade minerária. Com a atração de europeus que tinham um nível de capital humano mais elevado, isso aumentou a produtividade média daquelas economias. As estimações feitas na obra, mostram que o foi no período de 1870 a 1914 que se concentrou a maior deterioração relativa do PIB per capita do NE. Justamente quando vieram as grandes migrações europeias e japonesas, grupos com mais elevado capital humano que se concentraram no Sudeste e no Sul. Como esses imigrantes trouxeram tecnologias de ambientes que já se estavam industrializando, o resultado foi um impulso à industrialização no Sudeste. E aí essa correlação levou ao equívoco de autores como Celso Furtado que passaram a explicar o atraso do NE pela sua menor industrialização. Mesmo erro cometido pela Teoria da Dependência. Na verdade, o atraso industrial do NE foi consequência e não causa. E a causa principal da maior industrialização do Sudeste/Sul foi o recebimento de populações com mais capacidade de empreender industrialmente. A maior industrialização do SE/S gerou uma disparidade de desenvolvimento em relação ao NE. Causada por esse fator, a maior disponibilidade de capital humano per capita médio de seus habitantes. O atraso industrial do NE, portanto, foi um efeito da sua perda de capital humano relativo no período em que se consolidou a desigualdade regional brasileira. Vale dizer, se a disponibilidade de capital humano no NE fosse a mesma do SE/S, não haveria disparidade de desenvolvimento entre essas regiões.

Importa explicar, então, por que surgem diferenças nos determinantes da disponibilidade de capital humano entre as diversas regiões. Ou, dito de outro modo, por que no Nordeste (i) tem-se menor formação educacional e escolas de pior qualidade, ii) por que no NE há uma menor quantidade de horas trabalhadas por dia, e (iii) por que os custos de vida mais baixos em média no NE geram menor produtividade de seus agentes. Com evidências bem trabalhadas em seus modelos estatísticos, Alexandre demonstra que a migração europeia e japonesa para as regiões SE/S forçou a oferta de melhores escolas e gestou uma força de trabalho mais produtiva. Em consequência de seus maiores atributos de formação e padrão cultural trazidos de suas regiões de origem que se encontravam em outro nível de desenvolvimento. Ao lado disso, as elites do NE persistiram em comportamentos não-cooperativos em relação à população afrodescendente e indígena majoritariamente concentrada nessa região, que foi excluída de uma estrutura educacional de qualidade. No próximo artigo, vamos seguir comentando o livro de Alexandre para analisar as razões pelas quais o NE recebeu menos imigrantes e não propiciou estrutura escolar pública à sua população. Vamos também comentar a utilização de sua teoria da história para explicar as desigualdades e propor políticas públicas que as corrijam. 

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