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Editorial Guerra nas redes

Publicado em: 08/01/2020 03:00 Atualizado em: 08/01/2020 09:20

As redes sociais, nos últimos anos, transformaram-se em verdadeiras ágoras modernas, concentrando debates - e embates -  ideológicos, numa espécie de palanque para a discussão política. Mais que isso, foi nelas que governantes como Donald Trump (EUA) decidiram fixar seus principais canais de comunicação com as nações que comandam e com o eleitorado que os elegeu. Fórmula simples para driblar contextualizações, questionamentos e relativizações de outros autores, abrindo canais de “verdade absoluta” sob a égide de “linha direta” com o povo.

A exemplo dos usuários comuns, chefes de estado e seus principais assistentes se habituaram a usar suas contas oficiais para comunicar decisões e divulgar dados, mas também para provocar adversários e hostilizar inimigos. A crise entre EUA e Irã parece ser o ápice dessa nova e perniciosa tendência, com ameaças de ataques de lado a lado e um clima de animosidade tão assustador que fez o papa clamar por paz, também via Twitter.

A guerra, desigual na comparação de arsenais, gera, no âmbito virtual, a ilusão da paridade. Ali, ignora-se, além das consequências das ameaças, o real poder de fogo dos adversários. Duas contas que se atracam sugerem traiçoeiro empate. Curiosamente, a 6ª Pesquisa Anual de Uso de Mídias no Oriente Médio, cujos dados foram colhidos em 2018, mostra que cidadãos persas e árabes têm hábitos muito semelhantes aos norte-americanos em redes sociais, o que, mais uma vez, iguala a batalha e potencializa o estrago.

Inflamados por seus líderes, seguidores de Donald Trump e do presidente iraniano Hassan Rouhani, protagonizam combate paralelo e se engajam em provocações com potencial para levar a humanidade a mais uma grande guerra. O destino dasnações - e de milhões de famílias - parece estar sendo decidido na superficialidade de 280 caracteres.

Além de atropelar a diplomacia como instrumento de política externa, governantes que se arvoram nas redes jogam ainda mais pressão sobre seus diplomatas em provocações diretas que mais se assemelham aos debates entre cães separados por portões. A diferença está nos seguidores, enfáticos apoiadores da contenda que ajudam a enfurecer a horda inconsequente que, por sua vez, encoraja ainda mais os valentes líderes.

A temperatura no Oriente Médio é altíssima. O momento exige cautela, ponderação e jogo de cintura. Há muito mais em jogo que o futuro da região. É importantíssimo que as redes sociais repensem seu papel e criem estratégias para conter o uso de suas plataformas para disseminar a discórdia. Os estragos da guerra virtual são reais. Muito além daquelas visíveis em situações de conflito instaladas, as sequelas do ódio se instalam no âmago das sociedades, amplificando vociferações nocivas à humanidade. É hora de impor limites.

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