Diario de Pernambuco
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Tempo de festas

Divaldo Pereira de Lyra
Jornalista

Publicado em: 31/12/2019 03:00 Atualizado em: 31/12/2019 09:10

Tomado pelo espírito que se desprendia do tilintado dos sinos e dos cânticos ouvidos ao  longe.  Naquela surpreendente e inesperada homenagem que lhe prestavam os amigos, a figura ínclita daquele homem de 83 anos, dobrado pelo peso da idade, porém com o semblante firme, próprio daqueles que têm no espírito a consciência de uma vida límpida, de afetos desinteressados, fazia-nos lembrar os tempos de festas. Os tempos de criança. Quando atentamente procurávamos perceber as conversas balbuciadas, para que a meninada não participasse, nas raras visitas que faziam a nossos pais, o nosso velho avô paterno, quando nos trazia do seu sítio em Aliança sacos de fava, de milho e de feijão verde, os quais com algazarra, debulhávamos. E, do velho tio avô materno cujo ar solene e eloqüente que dava a sua fala, nos impressionava ao tratar carinhosamente a nossa saudosa avó como: “minha santa cunhada”. Imperceptíveis para os adultos, porém detalhes que jamais se apagariam de nossa memória. E se era tempos de Natal, a curiosidade se aguçava. A ingenuidade e a inocência da nossa geração que acreditava no papai Noel. Que lhe endereçava bilhetes até quase os 13 anos. Que cuidadosamente colocava o par de sapatos sob a cama, para radiante e efusivamente aproveitar a confraternização das manhãs felizes do dia de Natal. Que numa alegria indescritível desfrutava ao longo daquele dia do suculento e caprichoso almoço preparado por nossa mãe, de um “cardápio” variado com peru recheado, galinha de todos os preparos, pernil de porco assado ao forno, e mais tudo regado ao vinho de garrafão, indispensável pelo nosso pai. Às crianças eram permitidos sangria, como se dizia de vinho misturado em água com açúcar; além dos sucos e refrigerantes da época: os guaranás caçula, o Fratelli Vita, ou uma gasosa. O ritual de gelar as bebidas era feito previamente, pois, poucos possuíam geladeira, desde da compra da barra de gelo acondicionada num vasilhame com pó de serra.     

A tardinha, as festas em toda a sua expressão, que se iniciaram na missa do galo, meia  noite, se estendiam para os parques de diversões com carrosséis e rodas gigantes;  mamulengos e pastoris, na praça da Madalena, no sítio dos irmãos Valença, no morro da Conceição em Casa Amarela, ou na Festa da Mocidade, no Parque 13 de Maio, para os mais abastados. Assim, rememorando Olavo Bilac quando num dos seus mais belo poemas  recitou: “Ah ! que saudades que tenho/ da aurora da minha vida/ da minha infância querida/ dos tempos que não voltam mais” . . . E, de Ataulfo Alves quando numa das mais expressivas composições musicais, cantou: ...e, Eu era feliz, e não sabia.

O olhar, o semblante firme desse nosso homenageado de 83 anos, que não é com certeza o responsável pelas desigualdades do mundo. Pelos Natais passados por tantos que de nada puderam registrar em suas vidas o desfrutar da tamanha felicidade acima descrita. Daqueles privados do aconchego da família. E, até de outros alguns que deliberadamente cultivam e apregoam as diferenças. Enfim, essa figura que para tantos foi assimilada como a magnífica expressão do amor, nesses tempos de Natal e de festas. Paradoxalmente de guerras e de disputas fratricidas no Oriente Médio. De violência e de latrocínios entre nós, transmite-nos a serenidade e a paz, que deve ser referencial e o bom exemplo nesse último Natal do Século que se foi, para o então próximo milênio que se iniciava. Salve o ano 2020.

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