Diario de Pernambuco
Busca
Suicídio: uma consolação pela Filosofia

Eduardo Neves
Servidor público e professor

Publicado em: 21/12/2019 03:00 Atualizado em: 23/12/2019 08:37

Temos visto muitos casos de suicídio nos dias atuais: uns se envenenando por desilusão amorosa, outros se asfixiando por insucessos comerciais, uns ainda se precipitando do alto de espigões por doloroso diagnóstico de saúde ou por cobranças sociais e outros ainda golpeando os pulsos por discriminação de raça ou homofobia. Em todos, a humilhação social sofrida ou o medo de sofrê-la. Em todos, a entrega à desesperação!

Nessa paragem reflexiva, perguntamo-nos a razão desses infelizes acontecimentos e que caminho prático a Filosofia nos indica para preveni-los.

O egoísmo é o pai cego de todos os vícios da humanidade. Ele é a raiz da separatividade, que causa todo tipo de sofrimento às pessoas. Os pronomes “eu” e “meu”, tão presentes em nossos atos de fala, são sinais de como ainda estamos separados uns dos outros. Ensimesmados, desintegramo-nos, igualmente, da nossa essência e identificamo-nos com os aspectos exteriores da vida material, criando altas expectativas e nos projetando em resultados futuros, que muitas vezes são frustrados. Sendo esse o caso, caímos do alto das expectativas em cima das quais nos colocamos ou fomos conduzidos pelos vários sistemas sociais. Sofremos a desilusão. E culpamos a vida por isso! Ora, só se desilude, quem se iludiu ou se deixou iludir – por ignorância de si mesmo. Eis a causa do sofrimento: a ilusão. Toda a cena criada no teatro mental precisa ser desfeita e isso é demasiado doloroso, porque o sujeito já se identificara com a imagem que foi tomada por realidade, mas que não existia senão na imaginação. Vê-se, então, obrigado a destruir essa imagem. Eis a morte no plano mental. Com a consciência embotada, difícil se torna o despertar para o lado positivo das frustrações, que são sinalizações da vida sobre falhas naturais cometidas, verdadeiros convites para voltarmos ao Real Caminho, sendo, dessa forma, fundamentais para o nosso fortalecimento espiritual. Iludidos e enfraquecidos psicologicamente, pensamentos autodestrutivos afluem trazidos pelo turbilhão de atos violentos cultivados dentro de nossa cada vez mais utilitarista sociedade. Carentes de vigilância e cuidado, o pensamento fixo jaz encarcerado e não se afina senão ao tono limitante e opressor das vozes humilhantes de um entorno doentio por resultados. Com a consciência engolfada no opróbrio, o indivíduo tira a própria vida.

Como se vê, o suicídio consiste em um ato de fuga às provas da existência, em que o sujeito, tentando livrar-se de sua Cruz, pelo esquecimento das humilhações, condena-se, sem apelação, à destruição do corpo perecível antes da ocasião oportuna, sem contudo conseguir aniquilar as potências da vida eterna. Busca-se o olvido, mas depara-se com a lembrança do ato desesperado e infeliz; procura-se na morte o fim, acha-se, enfim, a continuidade da vida.

Dado que somos solidariamente responsáveis, aqueles que se arrojaram em tal destino careciam de mais fraternidade por parte de cada um de nós e menos separatividade intelectual, familiar, econômica, racial, sexual, religiosa, política, ou de qualquer outra ordem, a fim de se romper o sudário que os envolvia e obnubilava a visão sobre o sentido da existência humana na Terra.

O ser humano está em busca de si mesmo. Compete a cada um lembrar-se de quem é. O obstáculo é a ignorância e o caminho de iluminação é o autoconhecimento, para vivermos e deixarmos os outros viverem segundo o fluxo natural da própria subjetividade individual. Ademais, estamos identificados com a ilusão. O obstáculo é a má vontade e o caminho proposto é o autodomínio, para controlarmos a mente e não nos iludirmos, evitando o sofrimento. Por fim, é preciso renunciar e se sacrificar em benefício do Todo. O obstáculo é o egoísmo e a senda de progresso é a autoentrega, para vivermos na Reta Ação.

Assim, o que a Arte de Viver sugere para o renascimento do Novo Homem em uma Nova Acrópole é sabedoria, boa vontade e amor. Assim, é possível viver com a certeza de que mais vale o caminho ao resultado, a boa vontade ao utilitarismo, o progresso à perfeição.

Eventos fétidos e felizes são típicos de um mundo em regeneração. Eles nos equipam a mente e as emoções de modo a nos encher de conteúdos de experiência que, uma vez governados pelo que de melhor habita em nós, dão-nos acesso a ideias e intuições que nos iluminam o agir virtuoso em prol de nossa serenidade existencial. A Vida é, pois, a Mestra que, por meio de lágrimas e risos, nas comédias e tragédias da existência, dá-nos lições de conhecimento e moralidade, que são condições da ataraxia, a felicidade tipicamente humana. Portanto, agradeçamos e cultivemos a vida com abundância! Quando, de futuro, teremos semelhante oportunidade de despertar a consciência divina em nós pela harmonização da polaridade espírito-corpo? Tenhamos fé, esperança e caridade. Não estamos sozinhos, lançados ao acaso como um Dasein. O universo é cosmo, não caos. Há um Mistério guiando a história com Justiça, Beleza e Bondade, rumo a um destino comum. Sejamos capazes de ver semelhantes valores por trás da sucessão de fatos justos, belos e bons que se nos acontecem. Sem invadir o âmbito da liberdade, a natureza nos sopra venerandas inspirações, ajudando-nos a melhor encarar as dificuldades a que, mau grado nosso, vemo-nos forçados. Escutemo-la no silêncio do nosso próprio ser e aprendamos a contemplar o Bem que habita no altar do nosso coração, a fim de que Ele flua através de nós como pontífices entre o Céu e a Terra, construindo no orbe terrestre a Unidade pela Fraternidade.

MAIS NOTÍCIAS DO CANAL