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O "mimimi" da educação: a mística, a miséria e a mixórdia (parte 1)

Alfredo Bertini
Economista, professor e pesquisador. Foi recentemente presidente da Fundação Joaquim Nabuco

Publicado em: 17/12/2019 03:00 Atualizado em: 17/12/2019 09:10

À minha formação de cidadão e economista, filho de uma educadora pública que me transmitiu o encantamento pela docência, função que exerci orgulhosamente desde minha maioridade,  junta-se agora um desejo desafiador - o de fazer uma reflexão mais aprofundada sobre o polêmico tema da Educação.

Somem-se ainda a esse aspecto dois outros pontos. Primeiro, uma dose de breves experiências passadas como gestor de médio escalão numa Universidade pública. Segundo, mais recentemente, outra dose que decorre do exercício que tive como presidente de um dos órgãos descentralizados do Ministério da Educação (Fundação Joaquim Nabuco).

Nesses dois postos creio que tenha conseguido validar uma análise ainda mais consistente sobre o sistema educacional brasileiro. Pelo menos, algo capaz de engendrar exemplos concretos do que julgo ser a inefetividade das políticas públicas para o setor educacional.

De fato, toda essa percepção me proporcionou algum entendimento sobre os pífios resultados conquistados, sobretudo, os derivados das políticas públicas, considerado aqui como período de referência as últimas duas décadas. O resultado recente do PISA é um retrato cruel desse status de  demérito, justo com a única atividade que comprovadamente pode mudar a vida das pessoas. E o que se extrai disso, latu sensu, é um quadro do que considero ser a maior vergonha nacional. Daquelas que, na mínima condição de seriedade civil, a recompensa seria, de alguma forma, uma espécie de declaração de “minha culpa’ diária de cada brasileiro. Mais diretamente, os que lidaram (e ainda lidam) diretamente com o cotidiano educacional, pois o que parece se destacar é uma falta de compromisso e responsabilidade com tamanho fracasso. Afinal, são raríssimas as exceções que nadaram (e ainda nadam) contra a maré das adversidades.

Assim, diante de tantas  mediocridades associadas ao quadro educacional,  creio e aposto  no papel do capital humano, justo neste mundo de brutais transformações, derivadas do conhecimento, da inovação e da tecnologia. Aqui, posso minimizar minha parcela cidadã de culpa nessa história, pois, pelo menos, não me sinto conivente com o pacto do “faz de conta” educo/ensino, que tem gerado a triste realidade tão disseminada pelo Brasil. Desse modo, na nobre intenção de se aferir o sistema educacional e, a partir dele, respaldar-se para o desafio de uma transformação que seja mesmo avassaladora, sinto-me imbuído de um espirito de luta, de tentar recuperar o tempo perdido. E que, de fato, esse esforço, mesmo que discreto e  individual, possa ser capaz de contribuir para mexer com o atual “modus operandi”, eivado de erros e problemas.

O que mais me assusta nesse quadro de desmantelo é verificar uma incoerência deslavada de políticos, gestores, organizações e seguidores,  que nessas últimas décadas desperdiçaram uma avalanche de recursos, geraram resultados sofríveis e - o que é pior - formaram uma geração de párias. E tudo isso em nome de um discurso sedutor, de  afirmar e reafirmar que a educação “é a prioridade das prioridades”. O que falta de humildade pelo reconhecimento dos erros e omissões sobra em hipocrisia. Eis então o resumo geral dessa ópera bufa: conversas fiadas, discursos vazios, consultorias infrutíferas e muitos vieses para a formação de militantes idiotizados, em vez de aprendizes escolarizados.

Nessa aura de tanta  soberba resta  um “MIMIMI”  na forma de discurso fajuto, que não qualifica o verdadeiro sentido e extensão da educação. O que se filtra de cada “MI” daquela expressão é uma MÍstica de despreparo, que se soma a MIséria dos resultados alcançados e a MIxórdia de um sistema de processar idiotas padronizados.

Sobre cada ponto desse MIMIMI, esclareço na próxima parte do texto.


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