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Editorial Lição de Paraisópolis

Publicado em: 10/12/2019 03:00 Atualizado em: 10/12/2019 09:11

Um discípulo perguntou a Confúcio quais as três coisas fundamentais para um reino ser bem-sucedido. A resposta: comida na mesa, um bom exército e confiança nos governantes”. Curioso, o jovem continuou a questionar. “Se uma fosse retirada, qual seria a menos danosa?” O mestre, sem pestanejar, elegeu a comida. E explicou: “Sem confiança nos governantes, nada se pode fazer. Se você confia neles, pode lutar e passar fome pelo seu país. Mas, se não confia, pode ter comida na mesa e segurança nas ruas que você nunca se sentirá seguro para empreender o que quer que seja”.

A lição de 2.500 anos atrás vale para a Polícia Militar, sobretudo do Rio de Janeiro e de São Paulo. Os cada vez mais frequentes confrontos entre PMs e moradores de comunidades deixam saldo de mortos contados no atacado. O mais recente, ocorrido em Paraisópolis no domingo, ceifou a vida de nove jovens e conta dezenas de feridos.

Versões desencontradas de autoridades e moradores do bairro exigem rigorosa e isenta apuração dos fatos — sem corporativismo ou negligência comum a tragédias em que as vítimas têm pouco ou nenhum poder de pressão. Imagens de câmeras mostram cenas de guerra urbana com tiros, bombas de efeito moral e multidão encurralada que corre rumo à morte.

Bailes funks costumam reunir milhares de jovens. Não raro representam o único lazer de comunidades negligenciadas pelo poder público. A polícia tem a obrigação de oferecer segurança aos participantes independentemente da classe social ou da situação geográfica. Há protocolos com prescrições precisas do passo a passo a seguir — seja em Ipanema, seja na Rocinha, seja nos Jardins, seja em Paraisópolis.

Os policiais, vale lembrar, atuam em nome do Estado, que tem a obrigação de admiti-los mediante seleção rigorosa para o necessário enfrentamento dos altos índices de violência registrados nas urbes nacionais. Não só. Tem a obrigação, também, de assegurar aos cidadãos o equilíbrio, o discernimento e o ajuste das ações praticadas por homens fardados e armados.

O brasileiro paga tributos para merecer bons serviços do Estado. Um deles é o da segurança pública, que, em nenhuma hipótese, pode se confundir com insegurança. Sem que fique claro que a polícia protege adultos e crianças — agindo em nome da lei e segundo protocolos —, corre-se o risco de se confundirem os papéis que o criminoso Lúcio Flávio fazia questão de deixar claro: “Polícia é polícia. Bandido é bandido.” E, como frisa Confúcio, de perder a confiança nos governantes.

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